Julho IX

119 24 21
                                    

Carlos ganhara o carro uma semana atrás, era óbvio que não tinha carteira de motorista, mas essa nem deveria ser minha preocupação naquele momento — não era a dele, obviamente. Não sabia que já tinham voltado da praia, não sabia que ele já sabia dirigir, sabia menos ainda que estava dando voltinhas de carro pela cidade naquele sábado.

Meu primo dirigiu como um louco por minutos em silêncio. Sem sinto de segurança, cortava todos os carros no pequeno tráfego que encontrávamos, não parou em dois sinais vermelhos (só que eu tive a capacidade de contar) e ainda entrou em uma contramão.

Sentado no banco do passageiro, me segurei na porta para não ser cuspido para fora todas as vezes que ele fazia uma curva fechada qualquer.

— Eu não acredito nisso! — foi a primeira coisa que ele disse depois de ter me rebocado. Meu ombro doía pela força que usara contra meu braço.

De supetão, Carlos virou o volante para a direita e parou o carro no meio fio de uma rua estreita e arborizada. Eu nem sabia onde estávamos!

Ele bateu as palmas no volante, possesso. Meu coração disparava a cada respiração. Meus músculos estavam todos contraídos, prontos para reagirem a qualquer coisa. Só que eu não sabia como reagir a nada daquilo! Minha boca estava completamente seca e palavras pareciam tão distantes dela que eu só consegui piscar em resposta.

Apertando o volante com dedos brancos de tanta força, Carlos se virou pra mim no banco do passageiro. Seus olhos estavam arregalados, vermelhos, completamente vermelhos, eu reparei com imensa surpresa. As pupilas dilatadas, as veias em evidência...

— Seu viado de merda! Seu bicha filho da puta! Você não tem vergonha de ser assim?!

Suas palavras me faziam arrepiar pela voz enfurecida. Meu coração batia tão forte que achei que ia explodir de verdade.

Carlos literalmente cuspiu na minha direção, mas acredito que foi sem querer por causa da raiva que exalava. Como não consegui responder, ele se aproximou, imperando cólera pra cima de mim.

— Se não tem vergonha por você, porque não pensa um pouco na tua família, hein, seu viado desgraçado!? — eu continuava mudo, ele continuou vindo pra cima de mim. — O que acha que teu pai ou tua mãe tão fazendo, hein?! Ralando pra você ficar dando a bunda no meio da rua! Imagina se eles vissem você? Já pensou no desgosto? Já imaginou, Daniel!? Responde, caralho!

Ele gritou no meu ouvido, eu gritei uma exclamação de volta puramente no instinto. Afobado, quase sem fôlego, Carlos se ajeitou no banco do motorista e nós nos encaramos. Seu rosto inteiro estava vermelho agora. Meus olhos se encheram d'água sem querer e eu me obriguei a engoli-las com força.

Aquilo não podia estar acontecendo, não agora...!

Meu primo fechou os olhos e encostou a cabeça no banco, tentando se controlar, eu acho. Seu peito musculoso subia e descia freneticamente. A visão me deixou em pânico por vários motivos. Alguns deles passaram voando pela minha mente, outros ficaram por mais tempo: eu não sabia onde estava, ninguém sabia onde eu estava. Carlos estava fora de si. A porta do carro estava trancada. Ele tinha as chaves, ele tinha o controle.

E ele tinha raiva, muita raiva.

Tive medo de tirar o celular do bolso e que ele, sei lá, o jogasse janela afora e me deixasse ainda mais no escuro. Então me mantive imóvel.

— Vamos dar uma volta. — foi o que anunciou uns quinze minutos depois, girando a chave na ignição e arrancando barulhentamente.

As horas seguintes foram de puro terror psicológico.

Aprendendo a Gostar de Você {Aprendendo III}Onde as histórias ganham vida. Descobre agora