Dezembro II

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Achei que, com a partida da vovó, meu emocional fosse me passar uma rasteira daquelas e me derrubar feio... Mas parece que todo esse ano me preparou para aguentar cada vez mais essas ondas de dor e "provações" que a vida tem me mandando.

Digo isso porque, no fim de semana seguinte à morte da minha avó, tenho duas provas de vestibulares para os quais fiz inscrições escondido da minha família e basicamente de todo mundo. Contei sobre elas ao Renan um dia antes; ele ficou nervoso por eu ter escondido, ainda mais porque paguei as taxas de inscrição do meu próprio bolso, mas não havia muita coisa a ser feita. Eu só tinha que ir fazer a prova.

Um outro detalhe que deixou meu namorado — eu ainda não me acostumei a essa nomenclatura, que fique claro, mas estou me forçando a usá-la porque... bem, é legal —preocupado e aflito foi que uma das universidades para a qual me inscrevi... fica em outra cidade. Longe.

Eu não sei exatamente onde estava com a cabeça quando me inscrevi... Mentira, sei sim: eu queria ficar o mais distante possível de tudo o que me rodeava. Isso só não incluía o Renan. Mas é óbvio que eu não pensei exatamente nisso na hora, só fiz. E fui fazer a prova.... E o resultado, uma semana depois, na última semana de aula, deixa nós dois numa saia justa ridícula, que eu poderia muito bem ter evitado...

Estamos com horários vagos porque os professores já deram toda a matéria e estão se ocupando de tirar dúvidas sobre questões de vestibulares, então as duas turmas do terceiro ano podem transitar livremente pelo corredor. Muita gente está sentada nos ladrilhos, encostadas nas pilastras, entediada. Até que a Maria Eduarda dá um gritinho fino com o celular na mão, chamando atenção. Luiz e toda a sua trupe estão por perto, e se empoleiram sobre sua mesa para ver o motivo da empolgação.

Estou quieto na minha carteira quando Renan aparece no marco da porta. A professora de biologia não liga quando ele me chama e eu saio da sala. Ele também está com o celular na mão e vira a tela pra mim assim que ficamos distantes o suficiente para não sermos ouvidos ou incomodados.

Ele me mostra uma lista. A lista de aprovados da universidade que eu fiz a prova.

Então entendo o gritinho da Maria porque o nome dela está lá.

E o meu também.

***

No dia seguinte, uma outra lista de aprovados sai. De outra universidade, desta vez uma que está localizada na nossa cidade mesmo, e sou eu quem a vê primeiro porque aparentemente eu e o Renan estamos fazendo o papel contrário: ele fica monitorando as minhas coisas, e eu monitoro as dele.

Eu não prestei para essa, mas fico mais contente quando vejo o nome dele do que fiquei no dia anterior com a minha aprovação! Renan não queria fazer vestibular algum, pra começo de conversa, mas foi mais ou menos convencido (por mim e pela mãe), e levado pelo calor do momento, e nós já sabemos que ele não é lá de se esforçar muito nos estudos, então... Bem, então somos honestos em afirmar que isso é uma conquista e tanto!

No intervalo do almoço, eu lhe dou os parabéns com um beijo, e tenho a nítida impressão de que ele fica mais feliz com o gesto que com a aprovação, o que me faz rir e esquecer um pouco dessa nossa tragédia. Ele pergunta se podemos almoçar na cantina da escola porque está sem vontade de ir pra casa, e o restaurante serve uma comida que ele não é lá muito fã nesse dia, então acabamos sentados numa mesa ao lado do grupinho da Maria Eduarda, que resolveu fazer o mesmo.

— Parabéns, Renan! — e ela se levanta e o abraça, meio que espalhando a notícia para quem não sabia. — Vi seu nome na lista!

— Valeu. Parabéns pra você também, por ontem! — ele fica um pouco encabulado, o que me arranca um sorriso.

Aprendendo a Gostar de Você {Aprendendo III}Onde as histórias ganham vida. Descobre agora