XCIV. Primeiro Sangue

48 10 62
                                    

O amanhecer era o momento propício para o início de uma batalha. Para as bruxas, havia grande vantagem no combate noturno, visto que sua visão conseguia clarear até mesmo a mais escura noite sem lua. No entanto, seus aliados — e os elfos na ponta oposta do campo de batalha — não conseguiriam batalhar sem ajuda de feitiços complicados que desgastariam muito seus magos.

Então, tudo aconteceria à primeira luz do sol.

Às costas do exército da Aliança — quase dez mil destemidas almas prestes a encarar a morte certa —, estava a Floresta Negra. À frente, quase dois quilômetros distante, estava a massa gigantesca de cerca de trinta mil soldados élficos. E aquele não era o contingente total, Asmin sabia. Desanimador era saber que, no momento em que o restante do exército chegasse ali, totalizando uns quarenta e poucos mil, a batalha provavelmente já teria acabado.

A formação da Aliança era bizarra, para dizer o mínimo. No centro de tudo, estavam os cinco clãs de bruxas que restavam na Floresta. Ferro-Brasil, Fura-Coração, Pedra-Negra, Águia-Noturna e (??), todas unidas numa linha que se estendia por quilômetros, esticada ao máximo para se equivaler em comprimento à dos elfos. Em meio às bruxas, montados em cavalos brancos, centenas de magos feéricos preparavam seus feitiços para apoiar a força principal.

Os exércitos feéricos cobriam os flancos e uma pequena parcela servia como reforço para a linha das bruxas, enfraquecida pela tentativa de se equiparar ao inimigo. Eram um flanco forte, feito para pressionar o inimigo e desestabilizar as tentativas de flanqueamento que certamente viriam dos elfos.

Em meio às bruxas e aos feéricos do corpo principal, estavam espalhados pequenos grupos de guerreiros humanos que, com suas runas, esperavam repelir parte dos ataques mágicos dos magos élficos. Se tivessem sorte, seriam uma ajuda formidável ao longo da batalha, para esgotar e contra-atacar os magos inimigos.

Atrás de tudo, escondidos pela floresta fechada, estavam os Middgellers, prontos para atacar onde fosse preciso e, no momento certo, dar a volta na batalha e flanquear as tropas élficas. Tudo bem preparado na ideia, mas Asmin sabia que a prática seria muito mais caótica e difícil de planejar, devido ao tamanho descomunal daqueles dois exércitos.

As demais criaturas, Drakares, Dríades e outros, teriam a função de agir em último caso onde o corpo principal estivesse a se romper. Seu poder era limitado, então era melhor que entrassem na batalha somente em caso de desespero.

E atrás de todos eles, as fadas, que teriam que proteger o último lar da Aliança, caso tudo desse errado. Ao mesmo tempo em que elas eram uma defesa formidável para o caso de precisarem de um último esforço em busca da sobrevivência, uma parte de Asmin não gostava da ideia de ter tropas tão poderosas colocadas em segundo plano. Mas era assim que as bruxas e os feéricos queriam, então assim seria.

Naquele último momento, antes das trombetas de guerra élficas soarem, a Matriarca deixou que sua mente retornasse ao momento, semanas atrás, em que ela, Dreika e Dust, tentaram sacrificar suas vidas pelo clã das Tormentadoras. Pensar nas duas ainda doía em seu peito. Nunca soubera do paradeiro de Dreika e, com tantos problemas emergindo por todos os lados, mal tivera tempo de perguntar pela amiga.

E o corpo de Dust, que jazia em algum lugar naquelas planícies, nunca mais seria encontrado caso ela morresse ali. Se perdessem aquela batalha, pensou com pesar, ninguém se lembraria das bruxas, dos seus nomes e dos nomes de seus clãs. Elas se tornariam apenas histórias de terror nas lendas élficas, daquelas que se conta para crianças para amedronta-las. Nunca seriam lembradas por seus costumes, pelas danças e pelas festas.

Ela engoliu em seco frente àquele pensamento desagradável. Não podiam perder aquela batalha. Não seriam só as bruxas a desaparecer, caso o fizessem. Ela olhou para o lado, para Nualla Águia-Noturna.

Fura-Coração (COMPLETO - EM REVISÃO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora