LXXVI. O Palácio dos Traidores

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Dalária encarou com pesar o muro alto do Palácio. Seu lar, onde crescera e aprendera a governar, agora tomado por traidores e oportunistas.

Como diferenciar estes, no entanto, dos inocentes? Como saber quais foram os que tinham conspirado contra si e quais tinham apenas recebido com pesar a notícia de que sua rainha falecera?

Ela suspirou fundo antes de se voltar para os cinco elfos — e Limenn — que a encaravam, silenciosos. Uma pequena tropa de trezentos elfos tinham aparecido dos campos no final da tarde anterior para auxiliar sua rainha e agora aguardava escondida no bosque ao sul por ordens. Eram fazendeiros e guardas mal treinados e pouco experientes, mas se tudo desse certo, sequer teriam que desembainhar suas espadas.

— Se quem quer que está no comando ainda seguir o calendário usual, dentro de duas horas a corte deve reunir-se no salão principal para discutir e... — ela buscava a palavra correta — aconselhar.

— Quer dizer implorar por favores? — Um dos elfos retrucou. Eram machos simples, mas ousados. Todos riram em resposta à provocação.

— Acho que será o momento perfeito para entrarmos e retomarmos o palácio. — Dalária ignorou os fazendeiros. — Se Silhy permitir, não haverá derramamento de sangue.

— E como vamos entrar? — Limenn falou, repentinamente.

— Você e seus amigos não vão. — Anunciou a Rainha. — Não quero mais problemas do que já tenho.

— Eles juraram...

— O juramento era de não machucar a mim. — Ela interrompeu o protesto. — Não disseram nada sobre meu povo e tampouco disse meu povo sobre vocês. A presença de selvagens lá dentro só me faria perder ainda mais o prestígio da corte.

Limenn pareceu aceitar as ordens, ainda que não parecesse nem um pouco satisfeito. Qualquer que fosse o motivo, ele queria muito entrar no Palácio. Dalária temia pensar em quais seria a sua motivação.

Durante quase quarenta minutos, ela repassou seus planos com as lideranças de sua pequena tropa, rezando que sua liderança fosse suficiente e que não houvesse problemas com o elfo escolhido por Vélis para atuar como regente em sua ausência, quem quer que este fosse.

Os preparativos foram acertados, os mensageiros partiram para o bosque para avisar as tropas e a Rainha ficou para trás, usando uma pedra de amolar cedida por Limenn para afiar uma adaga de ferro comum forjada pelos feéricos. Não era o equipamento ideal, mas serviria como bom complemento para sua espada de ferro branco.

Ela encarou o próprio reflexo num escudo que jazia ao lado de uma carroça, os cabelos desgrenhados e a típica aparência de alguém que não dormia direito há dias e sequer tivera tempo para praticar higiene pessoal. A falta de uma armadura, no entanto, era o que mais lhe incomodava. Se tivesse que lutar, estaria em desvantagem contra soldados bem equipados.

— Seu povo irá segui-la. — A voz de Limenn soou às suas costas. O que o feérico ainda fazia ali? — Não terá que lutar.

— Gostaria de aprender a ser tão otimista quanto você, feérico. — Ela respondeu, sinceramente. — Não adianta implorar, não deixarei que entrem no Palácio. — A mudança de assunto repentina pareceu deixar o jovem desnorteado por um segundo.

— Não vim para pedir isso. — Ele assegurou.

— O que quer, então? — Instintivamente, a Rainha deu um passo para trás, mesmo sabendo que o feérico não poderia machucá-la.

— E-eu... — Limenn buscava palavras. — Apenas vim desejar boa sorte.

Dalária ergueu uma sobrancelha, estranhando aquela atitude do feérico. Por fim, apenas assentiu em agradecimento antes que ele saísse novamente de seu campo de visão, provavelmente para retornar aos seus colegas Middgellers e aguardar pelo momento de reaver sua recompensa.

Fura-Coração (COMPLETO - EM REVISÃO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora