LXIV. Luz e Escuridão

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Alick caminhava pela mata, escutando somente os sons dos pequenos animais e do vento conforme traçava seu caminho até a área de estudos improvisada de Azar.

Se por um lado compreendia a necessidade de vencer aquela guerra por quaisquer meios possíveis, não conseguia aceitar aquele método. A magia que produzia era poderosa, isso era fato, comprovado pelos experimentos daquela tarde. Como a magia etérea, moldável e potente, mas difícil de ser controlada e utilizada.

Ainda que a Fura-Coração aprendesse a controlar aquilo, como poderia garantir que aquela energia morta não se voltaria contra ela? Por vezes, a magia parecia ter consciência própria, vontades e desejos. E se aquela também agisse assim? E se Azar perdesse o controle e causasse mais mal do que bem?

Aquelas perguntas assombravam sua mente, principalmente desde  que Lyssa desaparecera do acampamento e não retornara mais. Azar tinha certeza de que a fada fugira após a briga entre as duas, incapaz de aceitar o que ela fazia. Alick não conseguia se convencer de que a pequena amiga as abandonaria por um motivo tão banal. Algo dentro dela dizia que havia algo estranho naquela história.

Ela empurrou todos aqueles pensamentos para o fundo de sua mente quando avistou Azar sentada num tronco caído com seu livro em mãos. Ela desenhava com os dedos na capa negra, uma luz clara saía de onde sua pele encontrava com o papel. Estava realizando algum tipo de feitiço no livro não com a magia negra, mas com a sua própria, a magia da luz do sol.

— Que faz? — Alick perguntou enquanto se aproximava. A outra não respondeu, escolhendo terminar seu desenho antes de dirigir sequer um olhar à Ferro-Brasil.

Eram runas que ela desenhava, percebeu Alick. Runas do alfabeto antigo, de proteção e resistência. Um feitiço realizado com a força mágica do mago, mas cuja forma vinha das palavras escritas secretamente no papel. Azar estava protegendo seu conhecimento obscuro de quem tentasse destruí-lo, percebeu.

Quando a Fura-Coração terminou de escrever, finalmente olhou em sua direção e assentiu, percebendo que a própria Alick já respondera a própria pergunta.

— A fada não voltou? — Indagou Azar, desinteressada.

— Não. E ainda acho que deveríamos procurá-la. — Alick sentou-se ao lado da outra, casualmente.

— Posso senti-la perto. Não está morta. — Foi a única coisa que a Fura-Coração respondeu. — Só deve estar precisando de um ar.

— Acho que devia ouvi-la, Azar. — Não era a primeira vez que Alick insistia naquilo.

— E por que eu o faria? — A Fura-Coração não parecia com vontade de conversar, mas pouco importava para Alick.

— Porque você a trouxe aqui para isso.

— Eu a trouxe para que me ajudasse a desvendar o feitiço da porta. Ela o fez. — Azar cuspia as palavras. Provavelmente ainda estava irritada com o que Lyssa dissera. Alick não conseguia imaginar o que se passava em sua mente, o arrependimento e o fardo de ser malvista por suas irmãs pelo resto de seus dias. Talvez aquela arma fosse, de fato, a maneira mais fácil pela qual ela conseguiria aprovação das outras bruxas. — Ela poderia estar voando de volta para a Gruta por conta própria agora. Não preciso mais dela.

"Nem de você", Alick leu as palavras não ditas.

— Deveria ouvir a opinião das fadas. Se não a de Lyssa, tente pedir ajuda a Fedra. — A Ferro-Brasil tentou argumentar. — Elas podem ver o que nós não podemos.

— Só porque é um tipo de magia diferente, não significa que seja ruim, Ferro-Brasil. Estou apenas aprendendo a reciclar a energia desperdiçada no momento da morte. Não vejo problemas nisso. — A bruxa voltou a desenhar, aquela luz voltando a sair de seus dedos conforme sua magia penetrava nas páginas. — Além do mais, nos tornará tão poderosas quanto um mago feérico, capazes de moldar nossa força da forma como quisermos!

Fura-Coração (COMPLETO - EM REVISÃO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora