LVII. A Magia dos Mortos

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Na mente de Alick ainda martelavam os trechos do livro antigo que Azar a fizera memorizar. Da mesma forma como fora ensinada durante o treinamento, ela desenvolveu atalhos mentais que a fariam lembrar das palavras quando fosse requisitada.

Não fosse o ataque daquele Primordial, aquilo seria desnecessário. Graças à Deusa, a Fura-Coração ainda tinha um pouco de papel e carvão consigo e não precisara decorar o livro inteiro.

Eram textos estranhos, sobre energias e teorias sobre magia e o funcionamento do universo. Nada fazia sentido, mas Azar parecia compenetrada e pensativa conforme as três caminhavam para fora de Til Onag e rumo ao norte, de volta à Floresta Negra. Alick não tinha certeza se queria que aquelas palavras fizessem sentido em sua mente.

— Alguém vai falar, ou vamos assim até a Gruta? — Lyssa perguntou após várias horas de caminhada. A fada estivera estranhamente quieta desde o ataque dos selenares, mas parecia ter fechado definitivamente o bico após saírem da fortaleza abandonada. — O que vocês leram naquele livro que era tão chocante?

Alick e Azar trocaram um olhar, a primeira fazendo uma pergunta silenciosa à Fura-Coração, reforçando o questionamento da fada. A loira parecia relutante, abaixando a cabeça para encarar as pedras no chão sobre o qual caminhava antes de responder.

— Quando retornava de minha última ronda, poucos dias após encontrar as três Flor-Invernal e os orelhas-redondas, nós cruzamos com um antigo Santuário anão. — Apesar de relutante, Azar contou às duas sobre uma estranha visão que tivera, de um ritual bizarro praticado pelos anões para sacrificar um prisioneiro élfico.

A simples menção da raça extinta entristecia Alick e a tristeza rapidamente se transformava em ódio direcionado aos elfos, mas ela fez o possível para manter a atenção nas palavras da colega.

— Eles pareciam acreditar que podiam usar o espírito dos mortos para lutar uma espécie de guerra espiritual, escravizar a energia vital dos elfos. — Ela continuou, parando de falar para encarar a planície ao redor por um alongado momento. — Vamos parar por uns minutos. Precisamos comer e tomar um ar.

A Ferro-Brasil pensou em resistir àquela ordem, mas ao ver a rapidez com que Lyssa encontrou um lugar para sentar, seguida por Azar, decidiu que talvez fosse melhor escutar aquela história enquanto enchia o estômago com algumas das rações envelhecidas que ainda restavam na sacola. Tinham que chegar à Floresta logo, pensou ela, ou ficariam sem comida.

— Eu achei que era algum tipo de superstição — levaram alguns segundos para que Alick percebesse de que Azar falava —, mas de alguma forma aquela energia permaneceu em mim, atravessou de minha visão para o mundo atual. Acho que a minha presença despertou algum resquício daquela magia residual no Santuário. O que quer que seja, Asmin e Dreika viram com seus próprios olhos.

— E o que a fez ligar essa visão a Til Onag? — Lyssa se adiantou à pergunta que formigava na língua da Ferro-Brasil. Azar deu de ombros.

— Um palpite. Pensei que talvez o motivo de eu ter encontrado o Santuário fosse por já ter encontrado aquela magia aqui antes, então decidi apostar nisso. — A bruxa falou. Parecia tolice, mas Alick começava a ligar os pontos.

— Aquela magia estranha! — A fada constatou, quebrando um pequeno galho com as mãos.

— A excomungação? — Perguntou Alick, impedindo que Azar falasse.

— Não. Havia outra energia em Til Onag. — Explicou Lyssa. — Uma que só existia dentro daquele corredor.

— É do que o livro fala? — Alick perguntou, olhando diretamente para a Fura-Coração, que acenou positivamente com a cabeça.

Fura-Coração (COMPLETO - EM REVISÃO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora