XLIX. Entre Inimigos

113 35 285
                                    

Dalária despertou com dores no corpo, mas viva. Estava viva e não parecia ter lesões graves, apenas um ou outro arranhão e um hematoma na nuca, onde fora atingida por um Midgeller raivoso.

Suas mãos estavam atadas. Por quem, ela não sabia. Tampouco sabia onde estava. Definitivamente não era o vale de Parsos, mas sim uma abertura entre diversas rochas de uma montanha que se erguia orgulhosamente sobre sua cabeça. Tinham se movido para uma das cordilheiras, então. Quanto tempo se passara desde a batalha? Quanto tempo desde que tinham falhado em proteger aquele maldito estandarte?

Ela pensara, na arrogância de um soldado inexperiente, que conquistariam uma vitória naquela colina. Os inimigos enfrentaram a resistência élfica com dificuldade nos primeiros momentos, encontrando no terreno desfavorável a principal razão da perda de seu impulso. Cavalgar colina acima não era algo que aqueles touros sabiam fazer muito bem.

Os elfos defenderam, mataram e pareciam estar ganhando terreno. Ao menos até que um dos jovens inexperientes se empolgou com a aparente vitória e começou a avançar a linha, levando outros consigo colina abaixo. Quem quer que comandasse os touros, percebeu isso e usou a oportunidade para flanquear e destruir a guarnição soldado a soldado. Nenhum deles sobreviveria, pensou Dalária, antes de levar aquela pancada na cabeça e cair desacordada.

Agora, um feérico a observava, silencioso, o rosto selvagem e sagaz, magro e inteligente. Era jovem, fresco, percebeu a Rainha. Provavelmente não completara cinquenta anos. Ele sorriu quando a viu de olhos abertos.

— Finalmente, Alteza. — Falou. A voz era suave e aguda, não demais a ponto de tornar-se desagradável. — Começava a ficar preocupado.

Dalária absorveu os detalhes ao redor, tentando identificar rotas de fuga e possíveis fraquezas na tropa inimiga. O feérico não estava no grupo de ataque. Haveria mais deles por ali? Se sim, aquela escapada seria ainda mais difícil.

A Rainha não respondeu, apenas o encarou com ódio e ressentimento.

— Não pense em fugir. — Disse, novamente. Seu tom era debochado e desrespeitoso, como ela esperava que seria. — Se for para lá — o feérico apontou para trás dela — encontrará apenas gelo e morte brutal. Para cá — o dedo foi na direção de suas costas, para onde Dalária imaginara ser a base da montanha — somente alguns touros sedentos por, bem, você.

A Rainha de Parsos ignorou o pensamento de qual tipo de interação, exatamente, aqueles selvagens desejavam. Com um sacudir da cabeça, ela tentou focar sua atenção no feérico à frente e não nos possíveis caminhos para escapar das montanhas.

— Não sabe falar, Majestade? — Caçoou, pegando de sua bolsa uma maçã. Dalária cuspiu aos seus pés. — Rude. — Ela cerrou os dentes, sentindo-se como um animal enjaulado. — Mas extremamente ineficaz. Era de se esperar que seu povo fosse um pouco mais esperto, visto tudo que alcançaram.

— Veremos se fala com tanta audácia quando eu estiver com minhas mãos em sua garganta. — Era uma ameaça vazia, mas ela precisava mantê-lo falando.

— Oh, ela tem voz! — Respondeu o rapaz, abrindo os braços e girando o corpo, como se falasse para alguma platéia invisível. — Não se preocupe, Alteza. Sei muito bem que você me destruiria com um único golpe. Por isso tenho meus amigos ali atrás e você está acorrentada. E não tente truques mágicos, pois sabemos muito bem quem leva vantagem nestes.

— De uma forma ou de outra, vão pagar pelo que fizeram, selvagens. — Ameaçou ela, sua magia se agitando, mantida sob controle somente por muita força de vontade.

— Não fomos nós que chegamos a uma terra estranha ateando fogo em tudo e matando os nativos, sabe? — Ele cortou a maçã agilmente com uma faca e esticou-lhe um pedaço que ela recusou com um gesto da cabeça.

Fura-Coração (COMPLETO - EM REVISÃO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora