XXVII. Cidade dos Mortos

Magsimula sa umpisa
                                    

- Graças aos deuses, está vivo. - Falou baixo, entre suas tomadas de fôlego.

O amigo não conseguia falar. Estava num estado terrível, provavelmente à beira da morte. A pele do rosto estava toda queimada, o que dava-lhe um aspecto grotesco, o cabelo tinha desaparecido e a espada, ainda inteira, tinha esquentado o suficiente para queimar suas roupas e fundir-se à pele embaixo. O cheiro de carne queimada atingiu as narinas de Eralyn quando este se aproximou o suficiente. Se não encontrassem ajuda logo, percebeu, Deimos teria uma morte dolorosa.

Ele puxou o amigo para longe das pedras quentes, tentando levá-lo para longe dali, mas assim que tentou erguê-lo sobre os ombros na intenção de seguir até o porto, outra onda de tontura e dor o atingiu. Era dez vezes mais forte agora. Parecia que seu cérebro estava sendo esmagado por mãos gigantescas. A força de seus braços sumiu e Deimos caiu no chão com um gemido de dor. Sua visão foi tomada por pontos brancos e, em menos de um segundo, sentiu a consciência sumir e caiu desacordado ao lado do companheiro.


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Alguém estapeava seu rosto do lado direito. Eralyn tentou ordenar a seu corpo que lhe obedecesse. Aos poucos, foi recobrando a consciência e entendendo o que se passava. Era Deimos que tentava acordá-lo, a mão ensanguentada e machucada do elfo se chocava contra sua face num ritmo lento, mas com uma razoável quantia de força. Quanto tempo permanecera apagado? Esperava que não fosse muito.

A dor de cabeça voltou quando abriu os olhos, pontos brancos dançavam em sua vista e faziam-no querer deitar-se no chão e deixar que seu corpo descansasse. Se fizesse isso, no entanto, Deimos morreria e ele, provavelmente, também. Tinha que manter-se acordado, tinha que manter a própria mente viva para que o ferimento na lateral da cabeça não lhe tirasse a vida.

Tentando não exceder as capacidades de seu corpo debilitado, o guerreiro mais arrastou do que carregou Deimos para longe das cinzas e das ruínas do palácio, dirigindo-se para o que ele imaginou ser o sul, rumo ao porto e, quem sabe, uma área menos destruída da cidade. O elfo queimado não disse nada por todo o caminho, apenas gemia quando Eralyn o arrastava por sobre alguma pedra ou detrito jogado ao chão. Ambos em estado deplorável, as chances de conseguirem sobreviver àquilo eram praticamente nulas, percebeu ele com pesar. Se ainda houvessem feéricos pelas ruas de Alis, seriam liquidados em questão de segundos.

Mas tudo que encontraram em seu caminho eram escombros e manchas negras no chão e nas paredes sobreviventes, que indicavam os lugares onde elfos tinham sido cruelmente incinerados. Nenhum feérico, nenhum sinal de que aquelas coisas um dia tinham estado ali. Tinham desaparecido tão subitamente quanto surgiram. Assassinaram os soldados antes que tivessem chances de reagir, deixaram toda uma cidade sem qualquer possibilidade de resistência. Eralyn se perguntava quantos deles tinham morrido. Teria alguém conseguido armar uma resistência contra aqueles selvagens? Quanto mais cambaleava pela cidade, mais tinha certeza de que não.

Mais de uma hora se passou até que, finalmente, o olho bom dele detectasse a silhueta arruinada das construções portuárias surgindo das cinzas que flutuavam no ar. Era o mesmo que no restante da cidade. Escombros e corpos carbonizados. Eralyn já não tinha forças para manter sua bolha de ar puro e carregar Deimos ao mesmo tempo, então abdicou da primeira, tentando levar o amigo rapidamente até a orla, onde imaginava que o ar estaria mais limpo.

Quando  tentava puxar o elfo ferido por sobre a mureta de pedra que separava o porto do calçamento da cidade, ele ouviu o primeiro sinal de vida desde que tinha deixado os arredores do palácio. Vinha do porto, dentre a madeira queimada e as carroças destruídas, um som de passos rápidos e furtivos. Sem magia e sem armas, o desertor só pôde encarar a figura que se aproximava. Ele esperou pela morte, que finalmente o receberia de braços abertos, mas o que veio em sua direção foi a triste visão de um elfo magro e sujo.

Fura-Coração (COMPLETO - EM REVISÃO)Tahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon