Saint Luna, 21 de dezembro de 1991
Sábado - 08:00 A.M.
Havia se passado quase dois meses desde quando prendemos Lúcifer no inferno. Do outro lado, Lilith, Stephen e Josephine nos esperavam. Eles haviam feito exatamente o planejado, que era prender Lúcifer em uma cela no castelo de Lilith. Parece algo meio irreal de se dizer, parece que estou apenas lendo um livro antigo medieval de fantasia, mas tudo era real. Quando absorvi todo o fogo no inferno na igreja, senti algo forte dentro de mim querendo se libertar, um demônio interior que eu mesma controlava. Por sorte tudo acabou bem. Ajudamos Adam e fizemos um feitiço de hipnose para que ele não se lembrasse do ocorrido. Já Alex precisou de um tratamento espiritual já que ele quase perdeu sua alma.
Alice e Jesse ficaram bem. Jesse ainda ficou meio em choque por quase ser queimada viva, mas logo passou bem. Quanto a Alice, com certeza aquela foi a melhor habilidade de ilusão que ela já fez, alterando por parte a realidade. Não teríamos conseguido prender Lúcifer sozinhas, Crystal também nos ajudou quando exorcizou aqueles demônios que saíram do portal lá na igreja.
Aos poucos tudo voltava ao normal. Fizemos as provas finais do último ano do colegial e já estávamos planejando o futuro. Bem, eu não sabia exatamente o que faria no futuro, mas Mariyah prometeu me ajudar nisso. Lucy estava ansiosa com os preparativos do baile de inverno que teria na escola, o último do ano, mesmo sendo uma bruxa imortal com síndrome de adolescente colegial. Anne ficou bem, entrou oficialmente ao coven e voltou à escola mesmo faltando algumas semanas para acabar. Ela pretendia se aprofundar mais nos poderes, nas suas origens, para isso Nantai e as gêmeas Madison e April iriam ajudá-la.
— No fim você estava certo. Eu era mais forte do que podia imaginar, conseguimos vencer Lúcifer e vivemos felizes para sempre. — Falei aos ventos e soltei uma risada sarcástica fraca. — A felicidade para mim é só um detalhe. Desde que você se foi... eu sinto um vazio insubstituível dentro de mim. Eu sinto a sua falta, Chris.
Sussurrei a última frase limpando algumas lágrimas que rolavam sobre a minha bochecha. Estava frio e nevando, eu usava um casaco quente e luvas enquanto tentava não me tremer. O cemitério estava vazio como sempre, preferi não deixar flores no túmulo de Chris para que não morressem tão cedo.
Seis meses desde a sua morte. Chris morreu de forma honrosa enquanto tentava nos ajudar, por parte eu acreditava que a culpa fosse minha. Eu não deveria ter o colocado naquela posição, eu deveria ter impedido.
Saio dos meus pensamentos e me despeço de Chris, sem saber se ele estaria ou não me ouvindo. Corro de volta até o carro e entro, finalmente saindo daquela neve. Dirijo até a floresta onde aconteceria o último ritual anual. O Sabá Yule era responsável pelo solstício de inverno, o primeiro que eu teria sendo uma bruxa. Tudo ainda era uma experiência nova, daqui a um mês seria meu primeiro ano inserida neste mundo mágico e oculto aos olhos humanos.
Estacionei o carro na estrada perto da floresta e comecei a andar por um atalho mais rápido até chegar na cabana. Assim que me aproximei, vi uma guirlanda enfeitando a porta de entrada. Abri e vi que o lugar estava cheio, todos estavam presentes e em clima de comemoração.
— Olha quem apareceu, só faltava você. — Jesse falou vestindo um casaco vermelho e uma touca preta parecida com uma boina.
— Já estou aqui, vamos começar o ritual. — Avisei saindo da cabana de novo, caminhando para a área na frente já me posicionando no círculo.
A cabana estava enfeitada por dentro e por fora. Havia uma enorme árvore de Yule de pé na sala, só faltava decorar assim como uma árvore de natal. Peguei o bloquinho e arranquei um pedaço de papel, começando a escrever meu pedido nele. Na verdade eu não fazia ideia do que pedir, então puxei no fundo da minha mente. Eu ia pedir o que? Um cavalo?
Eu quero ser feliz.
Dobrei o papel e o segurei por enquanto. Por sorte não estava nevando, mas o chão estava todo coberto com as que já haviam caído. As árvores estavam sem folhas e com bastante floco de neve pendurados em seus galhos. Havia velas vermelhas espalhadas por todo o lugar junto com incenso. Com a ajuda de Nantai, Jesse trouxe um caldeirão razoavelmente grande e colocou no centro.
— Você pode me ajudar? — April pediu se aproximando com uma caixa cheia de velas pretas, vermelhas e brancas.
— Claro.
Caminhei com ela na direção do caldeirão e a ajudei a posicionar as velas no chão formando um triângulo com elas. Depois que terminamos e o caldeirão ficou no meio do triângulo de velas, vi Madison levar nove cálices dourados com vinho até o altar, logo atrás Alice e Anne carregando uma pequena árvore de pinheiro até o altar, colocando-a atrás dos cálices.
Depois que tudo estava arrumado, nos posicionamos no círculo prestes a iniciar o ritual. O céu estava iluminado por fracos raios de sol que tocavam alguns pontos do altar.
— Bem vindas, irmãs, a mais um ritual Yule. — Lucy cumprimentou alegremente iniciando o Sabá, começando a tocar o sino que segurava em sua mão. — Que o poder do sol e do espírito da luz voltem! Que eles voltem do país de verão! Que a luz extinguida renasça agora!
Me aproximo, junto com os outros, das velas ao redor do caldeirão e começo a acender as que estavam próximas de mim, vendo os outros fazerem o mesmo até que todas as velas estivessem acesas.
— Que a partir de hoje a luz aumente e que a força do inverno enfraqueça aos poucos. Oh grande deusa e deus, que o sol renasça através de vossa ajuda e amor! — Falamos juntas enquanto acendíamos as velas e voltamos às nossas posições no círculo, começando a andar em volta dele, com o meu pedido em mãos.
— O amor renascerá e a luz voltará. — Repetimos em uníssono várias vezes enquanto andávamos em círculo, até sentir meu espírito alterado, em transição.
Soprei três vezes o papel com o pedido ao parar de andar na frente do caldeirão, que de perto pude notar estar cheio de folhas de louro. Os outros também pararam de andar e fizeram o mesmo, logo começando a repetir novamente.
— Sol dos vales, rios e cachoeiras. Sol das fontes, mares e montanhas. A roda do ano continua a girar. Que no decorrer deste mesmo ano os meus pedidos possam frutificar. Que assim seja e que assim se faça!
Me aproximei da árvore no altar e pendurei o meu pedido nela junto aos outros.
— Por ti e para ti, deus da luz, luminosidade, senhor da aurora. — Sussurrei pegando um dos cálices e tomando um gole do vinho, despejando o resto na raíz da árvore.
Quando encerramos aquela parte do Sabá, voltamos para a cabana. As outras estavam animadas, definitivamente aquele estava sendo o melhor Sabá que participamos. No momento em que entramos, observei pela janela que começava a nevar forte. Me aproximei da lareira e joguei lenha, ligando até aquecer o lugar.
— VAMOS COMEÇAR A MONTAR! — Lucy gritou animada, fazendo com que eu levasse um pequeno susto.
— Montar o que? — Alice perguntou confusa e olhei para Lucy esperando uma resposta, pois eu também estava confusa.
— Bonecas de milho, oras. — Falou pegando um milho que estava com vários outros em uma cesta ao lado da porta.
Depois de montar minha bonequinha de milho, deixei ela na janela enquanto ouvia Lucy e Anne cantando músicas de natal para alegrar o ambiente.
— Meninas, um instante! — Aylen interrompeu a alegria e olhou para todas da sala. — Vamos dar as honras para a nova tríade de Hécate. Agora que são bruxas oficiais, esse é o primeiro Yule de vocês. Todo ano montamos juntos a árvore de Yule, esse ano deixaremos para vocês decorarem.
Sorri animada junto com as meninas e fui até a árvore vazia. Abri os enfeites da caixa e comecei a enfeitar, decorar e colocar pisca-piscas para enfeitá-la. Havia diversos enfeites e luzes espalhados por dentro da cabana também, uma mesa enorme com alguns alimentos no qual ainda não desfrutamos. A mesa estava farta de bolos de fruta, nozes, pães, vinho, maçãs e doces de abóbora.
Ouvi o som de comemoração quando terminamos de decorar a árvore e acendemos as luzes brilhantes. Até Nantai que era fria e não demonstrava sentimentos, mostrava que estava feliz. Aquele era um momento único de comemoração o qual eu nunca iria esquecer. Nesse exato momento, meus pais deveriam estar preparando o almoço e decorando a casa, eu queria estar com eles.
Todos os meus natais eram decorando as árvores com os empregados ou em um evento com meus falsos pais que nem me davam atenção. Sempre foi sozinho, triste, não tinha um significado para mim. Agora tem e eu não queria desperdiçá-lo, iria aproveitar o máximo possível com meus amigos, meu coven e minha família.
— Está tudo bem? Você parece um pouco distante. — Alice sussurrou ao meu lado, me fazendo sair da distração.
— Eu só estava pensando. — Suspirei passando os olhos pela sala e me voltando para ela. — Isso tudo é novo para mim, tenho medo de tudo não passar de um sonho e a qualquer momento eu acordar na minha mansão em Madrid com Eva e Julian mandando eu me arrumar para algum grande evento.
— É, eu entendo as vezes. — Comentou ficando pensativa também. — Mas me diz. Como estão seus pais? Como você se sente agora morando com eles?
— Eles estão bem. Chegou um momento que me acostumei com eles dois, mas custou a acreditar que Stephen não era do mal depois de tentar nos matar, sequestrar Crystal e matar meus pais falsos. — Citei me lembrando vagamente dos momentos e dei de ombros. — No final ele era apenas mais um manipulado por Lúcifer durante anos. Agora só quero que ele e Mariyah sejam felizes.
— Isso é bom. Agora você tem pais que te amam e que cuidam de você. — Falou sorrindo e eu retribuí o sorriso.
— Com certeza. E a tia Ellie? Está feliz com o marido? Como está se sentindo na casa nova?
— Eles estão super felizes, Caleb é bem gentil e amigável comigo, são quase meus pais. Eu demorei a me acostumar com a casa nova, mas passei a decorar meu quarto do meu jeito e acabei gostando. — Respondeu feliz e de repente ficamos em um silêncio por alguns segundos, até ela começar a falar de novo. — Eu não sei se vou passar na Oxford com tanta facilidade que Jasper, não sei nem se ficaremos juntos depois disso.
— Eu tenho certeza que você vai passar, Alice. Você é a pessoa mais inteligente que eu conheço, é basicamente impossível essa Universidade não aceitar um gênio como você. Logo logo sua carta de admissão irá chegar, fique calma. — Falei repreendendo a sua insegurança e me levantei do sofá em que estava sentada. — Vamos, vamos comer alguma coisa.
Puxei ela para cima e caminhei até a mesa. Peguei algumas coisas para comer e aproveitei o clima enquanto jogávamos conversa fora. Logo quando nossa comemoração antecipada do Natal acabou, Alice e eu levamos Jesse para casa seguindo a trilha da floresta. Depois, dei uma carona para Alice e a deixei na porta da sua casa, seguindo o caminho da minha.
Desci do carro e caminhei até a varanda, sorrindo com os enfeites e com um boneco de neve de pano gigante que provavelmente meus pais haviam feito. Abri a porta e passei pela cozinha, vendo meus pais conversando e rindo de algo enquanto preparavam brownies.
— Cheguei! — Avisei me aproximando da bancada, fazendo eles se virarem para mim.
— Oi, filha. Como foi o Yule? — Mariyah perguntou colocando a bandeja no forno e se virando para mim novamente.
— Foi bom, comemoramos na cabana quando terminou e decoramos a árvore de Yule. — Respondi rapidamente e comecei a andar na direção das escadas. — Vou tomar banho e já desço para contar tudo em detalhes.
Eles concordaram com meu aviso e eu logo comecei a subir até chegar ao meu quarto. Tomei um banho quente e troquei de roupa, colocando a outra para lavar. Me aproximei do espelho e peguei um pente para começar a desembolar meu cabelo. Meus olhos então fixaram em algo atrás de mim, algo que me encarava através do espelho. Olhei para trás e não vi absolutamente nada, mas naquela altura eu já queria gritar de medo. Me virei novamente e vi uma figura mais nítida e real de alguém que eu já conhecia.
Alguém que eu já matei.
Era a figura de Matteo, o meu ex namorado morto-vivo.
Espero que tenham gostado. Vote no capítulo se você gostou e comente suas opiniões sobre o livro! Sz