27.

12 4 10
                                    


No regresso a casa fui no carro com Diego, no banco de trás. Pelos vistos, a saída era mais problemática do que a volta. Estava mole, dorida, faminta. Ele estava enérgico e feliz, fartava-se de falar e contava piadas. Os tipos que iam no banco da frente, o condutor e Carmando, no lugar do pendura, riam-se.

Aproveitei os poucos minutos em que podia, finalmente, estar com ele. Havia assistência, mas não me importava. Acreditava que tanto o motorista, como o massagista, seriam discretos. E não acreditava, obviamente, que Diego provocasse alguma cena que pudesse ser mais censurável, nem eu o deixaria avançar por esses caminhos, para bem dele e, sobretudo, para meu bem.

Sentávamo-nos muito juntos, no meio do banco, quando podia ir, cada um, à janela. Estávamos perna com perna, mas ele não me segurava na mão, nem me abraçava pelos ombros ou pela cintura. Utilizava os braços e as mãos para vincar o que dizia, para mexer no cabelo e puxar os caracóis para trás que lhe descaíam para a testa, para coçar a face. A dada altura lembrou-se que eu estava ali com ele. Girou o pescoço, encarou-me, sorriu-me. Corei, pois claro. Enchi-me de calor que se manifestou todo no meu rosto vermelhão. Para piorar, Diego pespegou-me um beijo na bochecha, demorado, ao ponto de conseguir sentir completamente a macieza dos seus lábios... que eu já tinha provado, diga-se de passagem. Remexi-me, incrivelmente atrapalhada.

– Deves estar toda partida – disse-me, divertido.

– Sim.

– Queres que o Carmando te faça uma massagem? Ficas logo a sentir-te melhor. Ele não se importa nada de te fazer uma massagem. Não é, Sasá?

Desde o assento do pendura, o massagista fez um gesto vago de concordância.

– Não é preciso, Diego – respondi, envergonhada só de imaginar a cena de ser massajada, as mãos sabedoras e profissionais de Salvatore Carmando a calcar-me as pernas, os braços, as costas, as mesmas mãos sabedoras e profissionais que tratavam de Diego. Partilhar o massagista do argentino soou-me a demasiado íntimo.

– Tens a certeza? Olha que vais precisar, vai por mim. Imagino como deves estar a sentir-te, mais desconjuntada que uma boneca partida. Percebi que não estás habituada àquele ritmo que te impus no campo de ténis. Esforçaste-te e fiquei muito agradado com o teu empenho. Tens estofo de campeã, Tina. Assim é que é! Assim é que se faz! Mesmo que não nos apeteça, mesmo que não seja a nossa onda, damos o melhor de nós mesmos.

– Tenho, sim, tenho a certeza – afirmei mais convicta. – Não preciso de uma massagem. Se descansar fico melhor. Uma boa noite de sono e amanhã já não me vai doer nada. Sou forte, muito forte. – Mordi o lábio, pestanejei. – Diego...

– Sim, niña?

– Gostei muito de ter visto ontem o jogo do Napoli. Foi... especial. – Tentava iniciar a nossa conversa com um assunto que o fizesse falar, que ele comentasse e ao qual desse continuação sem esforço, com gosto.

Ele fez um gesto muito parecido ao do massagista.

– Foi só mais um jogo. Vai acontecer e estamos muito próximo do nosso objetivo. É nesta época que iremos ser campeões. Hum, Sasá? Este já não nos escapa.

O massagista concordou. O motorista também era da mesma opinião e os dois puseram-se a falar animadamente sobre o clube, sobre a história do clube, sobre os jogos, os golos, as picardias com o Norte, os momentos felizes e os traiçoeiros, a força do Sul. Senti-me mais à vontade para desfrutar de Diego e insisti no tema para não perdê-lo, pois podia suceder ele ficar mais interessado no que os outros dois discutiam alegremente.

– O Napoli poderá ser campeão de Itália?

– Vai acontecer – repetiu o argentino entusiasmado. – Estou aqui desde 1984, tem sido um caminho difícil, mas esta época está a correr-nos muito bem. Temo-nos aguentado no primeiro lugar. Estamos a jogar muito motivados, mesmos nos jogos difíceis conseguimos ter a sorte do nosso lado e isso ajuda-nos a manter a moral elevada. – Agarrou-me no joelho, exibiu um sorriso feroz. Sobressaltei-me. – Sinto-me como se fosse no México, Tina! – exclamou contente. – Estamos todos concentrados num objetivo, o grupo é muito unido, o que fazem a um, fazem a todos. Entramos em campo com vontade de vencer e não admitimos dar menos do que o máximo de nós próprios. Cada domingo é uma final. Se o jogo nos corre pior, fazemos uma reunião e tentamos perceber o que correu mal, falamos uns com os outros. É como no México, já te disse! – repetiu.

Aqueles Dias de MaravilhaWo Geschichten leben. Entdecke jetzt