Capítulo 81: Olivier e sua raiva

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Olivier e sua raiva açoitando a estrada com os cascos lascados de seu cavalo. Boca e olhos arregaçados, o cavalo furava o ar com narinas rachadas.

Se Olivier fosse Fulbert, Pierre estaria morto, Tuen inteira teria perdido a orelha direita, Thaila seria sua. Ele teria arrancado os olhos enojados do rostinho moreno, tapado os buracos vermelhos com uma faixa preta e cortado fora a língua que gritava monstro. Se Olivier fosse Fulbert, Thaila estaria morta. Mas seria sua.

Se Olivier fosse Clément de Deran, não teria feito nada. Thaila haveria fugido com seu pai, atravessado noites até a Eslarina, onde esqueceriam Olivier, Baynard, a Franária. Thaila viveria. Mas não seria sua.

Não. Olivier era mais como Henrique: deixava morrer fingindo não ver. Mandou o Eslariano para a escravidão, arrancou as pernas do melhor amigo, deixou o filho do amigo jurar lealdade ao mesmo rei inútil, entregou Maëlle a Anuré.

Maëlle era tão parecida com a esposa de Olivier. Nobre, peito inchado de bushido, romantismo implacável. Se fizermos o que é certo, seremos a diferença.

Fulbert de Patire ao menos matava com as próprias mãos. Olivier largava as pessoas onde morriam sozinhas, longe dos olhos, da consciência imaculada. O Esmeralda reluzente, exuberante, como se a Guerra não existisse. Que tudo e todos morressem, desde que não manchassem as pétalas alvas das orquídese nas estufas de Henrique.

Olivier chegou a Debur, desceu do cavalo, cambaleou, apoiou-se no muro do Esmeralda. Estava velho. O cavalo dobrou as duas patas da frente, deitou, morreu. Olivier sentiu um prazer imenso. Matara um cavalo de exaustão. Foi ele, sim! Foi ele quem matou aquele cavalo no castelo vazio.

Tão vazio. Onde estavam os soldados? Onde estavam as pessoas? Olivier endireitou as costas, procurou as muralhas. Silhuetas imóveis espetavam o céu, mas Olivier não conseguia dizer se eram gente ou espantalhos. Onde estava Henrique?

As batidas do cavalo morto ecoavam fantasmagóricas contra o pavimento de Debur. O eco foi crescendo, se aproximando, não era eco. Um cavaleiro surgiu na curva, desmontou no portão, lançou um olhar ao bicho no chão.

— Trago notícias de Fabec.

— Fabec não existe mais — disse Olivier.

— Mesmo assim foi invadida.    

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