Capítulo 76: O louco

1 0 0
                                    

— Ele só lê livros sobre feitiçaria — disse Gregoire enquanto esperavam. — Fica pedindo ao pai de Pierre que traduza mais livros sobre reatores de trem.

A porta se abriu e Neville viu-se face a face com um homem negro corpulento, careca de barbas brancas.

— Menior — disse Gregoire — este é Neville de Baynard e precisa de sua ajuda.

— Não — disse o mensageiro. — Não.

Ele passou entre Neville e Gregoire, desceu o morro e Neville perdeu-o de vista quando Menior virou a esquina da uma casa.

— Ele está indo ver o pai de Pierre — disse Gregoire.

Eles seguiram o mensageiro negro e o encontraram parado no meio de caminho, as costas arqueadas para trás, o rosto voltado para o alto, para a copa da árvore negra. Neville não sabia como a árvore se movia, nem em que velocidade, muito menos como ela continuava segurando o cinzento mesmo à distância. Magia, ele pensou, tinha muitas nuances que ele nem imaginava.

Menior foi seguindo os galhos negros da árvore, que tremelicava as folhas aqui e ali como um cachorro secando os pelos. Na ponta de um dos galhos estava o cinzento tentando livrar o braço da madeira mágica.

Neville se aproximou do mensageiro, convsersou com ele, contou suas urgências, pediu que lhe ensinasse o caminho para Tuen. Menior pareceu não ouvir. Continuou com o olhar fixo no cinzento e na árvore.

— Encontrei esses dois nas trevas — disse Neville. — A árvore salvou minha vida e eu trouxe esse homem de volta, mas ele não quer ficar.

— Se não quer ficar, por que não vai embora? — perguntou Menior.

— Porque eu não deixo.

Pela primeira vez Menior encarou Neville. Mensageiro negro e arqueiro mulato se estudaram, se mediram.

— Você sabe quem ele é? — Menior perguntou.

— Não — disse Neville. Ele se aproximou um passo de Menior. — Ouvi dizer que você perdeu a família. Eu gostaria de recuperar o que resta da minha.

— Para isso você precisa ir a Tuen — disse Menior.

— O quanto antes.

— E ele? — Menior apontou o cinzento.

— Vai comigo.

Menior se afastou em direção à árvore negra e examinou o cinzento.

— Menior? É você? Consegue me soltar? — perguntou o cinzento.

Menior demorou a responder. Quando falou, foi uma pergunta:

— Se eu te soltar, o que você vai fazer?

— Vou embora, Menior. O que mais me resta?

— E você — Menior disse a Neville — não deixa ele ir.

— Não — disse o arqueiro.

— Vou pegar meu cavalo — disse Menior. — Arranje provisões para uma semana, roupas quentes, botas impermeáveis.

— Espere — disse Gregoire. — Você vai guiar Neville?

Menior repetiu apenas que botas, roupas quentes, uma semana. Gregoire obedeceu, voltou para a casa que não era mais dele e mostrou a Neville onde ficavam as provisões. Depois foi procurar botas impermeáveis para Neville e para o cinzento.

Gregoire voltou para casa com três botas. Quando Neville perguntou por quê, Gregoire se espantou. Não percebeu que tinha comprado uma a mais.

— É para você? — perguntou o arqueiro. — Você vem conosco?

Gregoire abriu a boca paradizer não, mas a estante de livros estalou, as paredes da casa mudaram de cor. Elenunca quis sair da Fronteira, mas a Fronteira não tinha mais lugar para ele.    

A Boca da GuerraOnde as histórias ganham vida. Descobre agora