Capítulo 1: Frederico - A Ponte

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Aos doze anos de idade, o príncipe Frederico de Patire se preparou para sua primeira batalha. Ele usava uma armadura grande demais, que havia sido feita para Felipe, o irmão morto em batalha três anos antes, e depois passada a Fernando, o irmão morto em batalha um ano antes. Frederico só tinha um irmão ainda vivo: o mais velho, forte e magnifíco príncipe Faust.

Foi Faust quem içou o irmãozinho de armadura para cima do cavalo quando eles levantaram acampamento naquela manhã sem orvalho. Faust trazia a cara fechada. Na noite anterior, Frederico havia se aproximado da barraca do irmão e ouviu ele dizer ao pai:

— Eles não estão prontos para a batalha. Deixe-me treiná-los.

Mal Frederico se arrumou na sela, o rei Fulbert de Patire, montado em seu cavalo de guerra pardo, cutucou a orelha com o dedo mindinho e disse:

— Hoje vocês aprendem a matar ou aprendem a morrer.

Frederico se dobrou sobre a sela e despejou o café da manhã na relva. O rei Fulbert veio em direção ao filho devagarinho feito tortura.

— Você não merece o F do seu nome — disse o pai.

— Mas ia ficar muito esquisito eu me chamar Rederico — disse o filho, certificando-se de que não tinha caído vômito dentro do elmo.

Quando Fulbert sentia raiva, até os poros do pescoço ficavam vermelhos. Atrás do rei, o príncipe Faust soltou uma gargalhada tão explosiva que ele quase caiu do cavalo.

— Rederico! — ele repetiu. — É boa! Rederico.

O rei olhou intrigado para o filho mais velho, então puxou as rédeas com força e se afastou do mais novo. Fulbert não usava armadura completa. Era seu jeito de demonstrar desprezo pelo inimigo. A única proteção que ele tinha era o escudo.

— Suponho que ainda me chamo Frederico — murmurou o principezinho.

Quando a estrada chegou na margem do Loefern, Fulbert e Faust guiaram os soldados para o sul, coisa muito estranha, já que todas as batalhas aconteciam na Boca da Guerra, para o norte de onde eles estavam. Frederico teve esperanças de que não houvesse batalha. Faust deve ter convencido o pai a nos treinar, ele pensou. Hoje é só um exercício.

Talvez ele se sentisse mais seguro se estivesse entre veteranos, mas, com excessão de Fulbert e Faust, os outros soldados eram todos mais ou menos da idade de Frederico, a maioria órfãos, recém recolhidos e sem treinamento, pois Fulbert de Patire acreditava que jogar seus homens (ou crianças) de encontro ao perigo era o melhor treinamento que eles podiam receber.

— Coloque-os contra a morte e veja se não aprendem a matar — ele dizia.

O pequeno contingente de pequenos soldados seguiu para o sul em direção a Lencon, ao longo de uma antiga estrada de ferro às margens do Loefern. Frederico nunca tinha visto uma linha de trem. A maioria havia sido desmontada e suas partes reutilizadas após o desaparecimento das locomotivas. Esta que beirava o Loefern continuava relativamente completa, apesar de os trilhos de vez em quando sumirem, engolidos por ondas de natureza selvagem.

A paisagem se eriçava cada vez mais e a estrada seguia se escondendo atrás de pequenos montes que pareciam gatos gigantes com pelagem verde. Frederico podia ouvir o sussurro líquido do Loefern, que foi ficando cada vez mais lá embaixo, conforme a estrada de ferro escalava as colinas. Não era um som agradável, a risada da água, filtrada em metal, sufocada pelo elmo pesado. A viseira ficava caindo, tapando a visão do príncipe.

A estrada fez uma alça para o Oeste, o terreno foi se elevando como uma serpente nadando para o topo do céu, mas uma guinada virou-a de volta para o leste, em direção ao rio, e os soldadinhos de Fulbert deram as costas à cordilheira dos Oltiens, que abocanhava o horizonte oeste com dentes serrilhados de gelo. Frederico inclinou-se um pouco em sua sela para olhar a água escura vinte metros abaixo. Seu cavalo relinchou e escoiceou.

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