Cap.25 "I'm sorry for the things that I did not say" (Akon)

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Eu deveria saber que ela não atenderia aos meus telefonemas, ou abriria a porta de sua casa, ou sacada, pra que eu entrasse, mas ainda assim eu tentei, tentei dia após dia, o tempo todo, era tudo o que eu conseguia fazer, tudo que ficava em minha mente nas três semanas posteriores àquele dia. Procurei-a, enviei flores, cartas, ursos, e tudo isso estava sobre a minha cama, espalhado pelo chão do meu quarto, trazidos pela mesma pessoa que os levou. Jellybean. Ela não queria me ver, nem saber o que eu tinha pra dizer, não lhe interessava e eu compreendia. Ela não queria se lembrar de mim e minha insistência a atrapalhava. Há apenas uma semana atrás eu tive uma resposta, a primeira e única. Também foi a última vez que tentei recuperá-la, ou me explicar. Seu bilhete dizia, exatamente com estas palavras: Por favor, não volte a me procurar, se você sente qualquer consideração por mim, me deixe em paz, é tudo o que eu quero de você, distância. Obrigada.
Era muito fácil ignorar seu ódio e rancor, era muito fácil continuar tentando qualquer contato enquanto ela apenas se negava a aceitar qualquer coisa de mim, pois eu sabia que isso aconteceria ainda por um bom tempo até que ela estivesse aberta à respostas. Mas aquele era um bilhete que eu não podia fingir não ter lido, eu não podia negar a ela a paz que ela me implorava. Elizabeth estava sofrendo e eu estava colaborando com isso a cada vez que tentava ser lembrado por ela. Ela estava sofrendo tanto ou mais que eu e esse era um ponto de vista que eu não podia mais me esquivar. Eu não podia mais fazer isso, então minha prioridade foi dar a ela o tempo que ela precisava.
A primeira semana, ao contrário do que muitos pensam, não foi a mais difícil, nunca é. Embora eu não pensasse em outra coisa que não fosse me reconciliar com ela, eu ainda tinha esperanças que em uma das tentativas ela fosse abrir a porta pra mim, me deixar falar, contar-lhe tudo desde o começo. O verdadeiro terror veio na semana seguinte, pois eu começava a deixar de acreditar que um dia ela fosse me perdoar. Eu estava cansado de pensar em maneiras de me humilhar, eu só queria que ela fosse a garota madura que eu havia conhecido e quisesse me ouvir, ela podia me dar um limite de tempo, podia ser por telefone, por carta, SMS, com limite de caracteres, mas eu precisava que ela quisesse conversar comigo. Eu não merecia e eu estava ciente disso, esse fato me privava de fome, fazia com que o sono me abandonasse todas as vezes que eu ameaçava encostar a cabeça no travesseiro. Eu não me lembrava de como era chorar, havia um bom tempo que eu não tinha razões boas o suficiente pra isso. Mas tive tempo pra reaprender e agora a prática me levava a fazer com mais frequência do que eu gostaria.
Minha mãe estava preocupada, mas ela também tinha seus problemas com meu pai. Minha casa estava fora de ordem e a única pessoa que me faria sentir bem, não queria ouvir falar meu nome. Os caras vieram me visitar frequentemente nos primeiros dias, tentando me fazer sair de casa, me convenceram uma vez. 9 doses de tequila e 1 de glicose. Quem sabe seja por isso eles não tenham tentado outra vez e passaram a me visitar muito pouco. Talvez tenham, finalmente, percebido que eu preferia não me levantar da cama, pelo menos não até ter certeza de que não iria me embebedar e acabar chorando num hospital. Eu também tinha meus limites, acreditem, descobri isso depois de ler, pela última vez, o bilhete de Elizabeth e decidir, de uma vez por todas, que eu não tinha valor pra contrariar sua vontade, nem direito. Era seu bem estar que eu havia afetado, agora eu devia deixá-la ir e recuperar sua felicidade. Esse foi o momento mais difícil daquelas três semanas sem Elizabeth.

- Filho... - A voz de minha mãe invadiu o cômodo, desviei meu rosto da minha mochila sobre a cama para examinar seu rosto - Fangs e Archie estão lá embaixo, te esperando.
- Diz que eu já desço. - Murmurei, sem a menor vontade, e me levantei.
- Tudo bem.

Viagem de fim de férias. Sempre uma furada. O diretor programava a última semana de férias do último ano em um Resort a três horas de Bolton. É um bom lugar, grande, cheio de mato e piscinas, praia. Ele prepara uma gincana idiota para, no final, o grupo vencedor ganhar um troféu, que eu mesmo compro em qualquer loja de velharia.
Eu era momentaneamente incapaz de enxergar qualquer lado positivo em passar três horas dentro de um ônibus e uma semana num lugar distante, vendo as pessoas que, por hora, eu preferia apagar da minha mente. Mas Fangs fez questão de colocar meu nome, sem meu consentimento. Minha mãe pagou, ela deve ter pago pra ele também. Se bem que Fangs tem um grande problema, nunca gosta de fazer nada errado, mas quando decide fazer, não sabe ser sutil. Aquela viagem seria um desastre, será que ninguém percebia isso?
Calcei meu vans e peguei a camisa xadrez que estava embolada no canto da minha cama, coloquei-a sobre a regata que eu já estava usando e me levantei, trazendo junto a mochila, em meu ombro, e uma mala que minha mãe havia preparado, pois se dependesse de mim...
A mãe de Fangs nos levou até o colégio e assim que descemos do carro pude ver o movimento na calçada, em frente ao ônibus vermelho que nos levaria ao resort. Soltei um suspiro pesado e olhei de esguelha para Fangs, sentindo o mal humor preencher cada milímetro do meu corpo. As pessoas me olhavam como se quisessem descobrir o que eu estava sentindo, por um momento eu não sabia se eu queria que elas realmente descobrissem um dia. Não é o tipo de coisa que eu desejaria a alguém, honestamente.
Coloquei meu óculos de sol e tentei tornar minha aparência menos apática. Na verdade eu queria ignorá-los, como se desviar meus olhos fosse afastar os seus. Nos encostamos na grade, esperando que todos estivessem ali para que finalmente pudessemos dar início aquela porra toda da qual eu queria passar longe. Sweet Pea não demorou a chegar, era o mais animado de nós. Boa sorte pra ele.
Um burburinho começou a incomodar meus ouvidos, eu estava tão cansado daquela gente que eu desejei acordar na minha cama, sozinho e só sair de lá quando fosse realmente necessário. Suspeitei que o diretor estivesse chegando, todo mundo começou a se mover, provavelmente querendo ser os primeiros da fila pra escolher o melhor lugar no ônibus. Quanta besteira.
Dois pés diminutos, calçados por uma sandália sem saltos, entraram em meu campo de visão. Eu não reconheci o perfume, mas meu coração disparou diante do short curtíssimo usado pela dona daquelas pernas. Ergui minha cabeça de uma vez quando Archie esbarrou seu cotovelo em minha costela, soltei um gemido baixo, só não sei se foi pela dor, ou pela surpresa de ver Elizabeth parada em minha frente depois de tanto tempo. Ela não parecia nervosa, o nervoso ali era eu. O óculos de sol segurava parte de seu cabelo pra trás e me permitia ver seus olhos, indiferentes, em minha direção. Eles estavam vivos, mais escuros, e bem contornados por uma camada grossa e preta de lápis de olho. Também retirei meu óculos, tentando examinar aquilo mais de perto. Ela pareceu hesitar quando o contato visual se concretizou, mas piscou uma, duas vezes, e deu um passo pra trás, retirando de seu ombro um case preto, o qual me estendeu em seguida.

- O-o que é isso? - Minha voz falhou logo no início da frase, minhas pernas vacilavam e só notei o quão trêmulo eu estava quando estendi minha mão pra agarrar a alça do case.
- Soube que eu valho um violão pra você, aí está ele, caso você sinta minha falta.

Sem vacilar, ela me deu as costas e foi em direção a Chuck, que a esperava com uma mão estendida, ela não percebeu, ou fingiu não ver. Isso não fez diferença, pois eu ainda estava parado, inexpressivo, com aquele violão na mão, sem saber o que deveria fazer com ele e sem nenhuma idéia de quem era aquela garota, pois de uma coisa eu estava certo, não era a minha garota.
Ouvi dizer que cada pessoa lida com a dor de uma maneira diferente e que existem diversos tipos de mecanismos de defesa para simplesmente não ter de lidar com ela. É comum vermos pessoas demonstrando seus sentimentos e o quão afetada estão, como as que riem de desespero, ou choram compulsivamente apenas para enfatizar a dor. É ainda mais comum encontrarmos pessoas que recalcam esse sofrimento, uma pena que elas não queiram dividir isso e, por isso, tantas e tantas vezes passem despercebidas. Eu não sei quem supera primeiro, eu não sei qual a melhor maneira de sobreviver à dor. O que eu sabia é que Elizabeth havia se esquivado de tudo isso, ela não parecia ter chorado dias, eu parecia. Ela também não parecia estar reprimindo coisa alguma, ou nem estaria ali, como eu estava. Elizabeth não havia superado aquilo, como eu também não. Eu não fazia idéia das coisas que ela tinha escutado nas últimas semanas, mas descobri qual a válvula de escape ela havia escolhido para recalcar seu sofrimento: vingança.

Betting Her - Adaptação BugheadOnde as histórias ganham vida. Descobre agora