Capítulo 19 - Três cruzes à beira da estrada

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"O maior terror que uma criança pode ter é que ela não é amada, e a rejeição é o inferno que ele teme. Eu acho que todos no mundo em grande ou pequena medida sentiram rejeição. E com a rejeição vem a raiva, e com raiva algum tipo de crime em vingança pela rejeição, e com a culpa do crime - e há a história da humanidade. Eu acho que se a rejeição pudesse ser amputada, o humano não seria o que ele é. "

(John Steinbeck, A leste do Éden)

Raditz tirou a bandana que cobria o rosto, lentamente, para encarar o rapaz. Afinal, ele já havia visto o seu rosto descoberto uma vez em West Sayan, não havia por que se esconder mais. Ele o encarava altivamente, ainda de arma em punho, e Raditz decidiu que, sendo ou não ele seu irmão, gostava da ousadia daquele guri. E tinha certeza que ele não atiraria nele depois de se identificar como sendo Kakarotto, seu irmão de quem ele pouco lembrava.

Lentamente, Raditz guardou seu revólver no coldre. Talvez se arrependesse disso, mas queria pagar para ver:

- Você pode provar o que diz, guri?

O rapaz colocou a arma no cinto e ficou encarando-o um instante antes de dizer:

- Ninguém no bando de Freeza sabe que você tem um tio chamado Toma e uma tia chamada Seripa. Nappa escondeu isso deles, porque sabia que eles seriam mortos se Freeza achasse que eles estavam com o suposto tesouro de Bardock. Seu pai se chamava Bardock e tinha no rosto uma cicatriz de combate, que ele conseguiu na Guerra Civil, sua mãe se chamava Gine e te chamava de pequeno gatinho peludo.

- Os dois foram mortos nessa curva, vinte anos atrás, eu fui deixado para morrer, você foi levado e criado por Nappa. Nossos pais estão enterrados nessa mesma curva, ao lado do condutor. A cruz do centro é a de Bardock, a da direita, de nossa mãe. O pobre condutor, Deus o abençõe, está na cruz à esquerda. Meu avô Gohan me fazia rezar pela alma dele... mesmo que eu nunca tenha sabido seu nome.

Raditz encarou o rapaz, atônito. Ninguém sabia que sua mãe o chamava de gatinho peludo, talvez só o tio Toma.

- Meu tio Toma... está vivo? Nappa me disse que ele havia ido embora de West Sayan.

- Nappa não queria que o último amigo dele da guerra morresse assassinado como King Vegeta e Bardock. Não era de você que ele os escondia, mas de Freeza.

- Você... você é mesmo ele. – a verdade atingiu Raditz de repente. Crescera sozinho, vivera sozinho, aprendera a não ter medo sozinho. – Como você se salvou?

Um arrepio o percorreu. Por anos, ele teve pesadelos em que coiotes estraçalhavam o corpo do seu pequeno irmão e ele acordava suando frio, sempre socorrido por Nappa que dizia para ele não gritar, não chorar, não parecer fraco ou Freeza o mandaria cortar a garganta do menino.

- Eu tive sorte. A sorte que você não teve. Um índio avisou um homem bom chamado Son Gohan que havia uma criança aqui e ele me recolheu. Por anos pensei que ele era meu avô, até que ele me contou parte da verdade... e agora há uns dias, quando me mudei para West Sayan eu descobri o resto. Tio Toma me contou.

Os dois se encararam em silêncio por um longo instante até que Raditz disse:

- Eu sempre quis saber qual era a cruz da mamãe... e qual era a cruz do meu pai.

Surpreendendo Goku, o homenzarrão apeou e andou devagar, ficando de pé entre as duas cruzes. De repente, sem aviso, ele caiu de joelhos, as mãos apoiadas na terra avermelhada, e começou a chorar, as lágrimas grossas descendo sem pudor pelo rosto másculo, pingando sobre a vegetação rasteira que cobria os dois túmulos.

- Perdão, pai, perdão mãe... eu nunca vinguei vocês dois. Eu vivo do lado dele, do assassino de vocês... eu trabalho para ele.Eu já matei em nome dele! E eu sei que não ia conseguir matá-lo porque já vi muitos morrerem tentando. Vocês tem um filho covarde e inútil.

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