26 - Porta do Inferno

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- Alícia on -

  Meu braço que antes estava sendo apertado por Olívia estava formigando e a pele queimava levemente, eu sabia que estava vermelho, e sabia também que depois do que Olívia disse, Mallya se revoltaria. Como se o mundo ao redor estivesse conspirando pra dar tudo errado, uma brisa gelada de vento invadiu a biblioteca pela janela que ficava atrás da cadeira da Olívia, a cortina balançou e meus olhos não desgrudaram de Mallya enquanto um raio de sol iluminou o rosto da menina. Mallya apertou ainda mais os pulsos da velha senhora entre os dedos e o que disse depois, doeu até em mim.
  - Não precisa dizer algo que eu já sei, todos já olham pra mim como se eu fosse a criança nascida de um cadáver. - As palavras amargas de Mallya fizeram a bibliotecária perder sua fúria. Por uma fração de segundo que o raio de sol pareceu focar demais no rosto de Mallya eu tive a impressão de que os olhos dela estivessem vermelhos, mas assim que o sol se ausentou segundos depois dela dizer isto, eu confirmei que eu tinha visto demais, os olhos dela ainda eram castanhos, seu semblante ainda era frio e a amargura que ela transpassou para a bibliotecária foi suficiente para que Olívia parasse. Quando lágrimas começaram a rolar dos olhos da velha senhora até mesmo eu arregalei os olhos. Toda a sua dureza se foi, e seu rosto que estava tão vermelho de raiva, agora estava vermelho de choro.
  - Me perdoe Mallya, eu lamento muito! - Fungou Olívia entre soluços - Me perdoe... - Soluçou pondo as mãos sobre o peito, ela parecia realmente arrependida, estava chorando sem parar - Me perdoe...
  Mallya e eu nos entreolhamos, mas enquanto meu olhar se sustentava alerta, Mallya cambaleou pra trás e eu tive que segura-lá pelos braços e fazê-la apoiar os braços sobre meus ombros pra mantê-la em pé.
  - Mallya? - Chamei mas ela não levantou a cabeça, parecia atônita - Mallya?? - Chamei de novo e em seguida, piscando os olhos repetidas vezes ela levantou o olhar para me encarar, parecia bem de novo.
  - Eu to bem. - Disse ela notando minha preocupação e então acrescentou - Eu só me senti zonza por um instante, mas agora eu to bem. - Disse e então me envolveu num abraço, me apertando carinhosamente.
  - Você me assustou agora! - Desabafei e ela se afastou abrindo um leve sorriso.
  - Você tem que perder a mania de achar que eu vou morrer por qualquer coisa! - Retrucou ela caçoando e eu lhe dei um empurrãozinho no ombro.
  - Não me assuste mais então. - Ressaltei e ela assentiu. Enfim, nos voltamos para Olívia, nossa megera bibliotecária, que ainda estava chorando.
  - Me perdoe Mallya... - Soluçou ela, o que gerou tanto que eu quanto Mallya franzissemos o cenho confusas, acho que a Olívia tem bipolaridade, só pode ser!
  - Escuta! - Mallya falou chamando a atenção de Olívia que tentava enxugar as lágrimas, mas não estava conseguindo, Mallya resolveu continuar - Se você contar tudo que sabe sobre a casa abandonada atrás da escola eu te perdoo. - Propôs Mallya e Olívia nos encarou inconformada.
  - Mas o que vocês tanto querem com aquela casa mal assombrada??! - Indagiu ela indignada e Mallya e eu suspiramos.
  - Ideias e supostamente uma base ora nossa nova história. - Respondi e ela se sentou na cadeira recostável, abriu uma gaveta e pegou um lenço pra enxugar as lágrimas.
  - Vou contar. - Disse ela se rendendo, parecia cansada, e mesmo enxugando as lágrimas elas não paravam de cair. Eu e Mallya puxamos cadeiras de plástico que estavam numa mesa por perto e nos sentamos. - Mas não me interrompam. - Alertou e então prosseguiu - Eu tinha dez anos na época, como todos sabem o que aconteceu naquela casa foi a 60 anos atrás, então é óbvio que nem tudo era tão certinho, e sem as modernidades dos tempos atuais, muita coisa ficou sem explicação. Mas eu me lembro do que realmente acontecia naquela casa, e o que aconteceu com Daniel Mason e com a Thália River, a menina órfã da casa abandonada. Ela sempre teve uma vida muito cercada de privações, os pais dela não gostavam que ela tivesse contato com as pessoas, independente de quem fosse. Haviam muitos boatos de que eles eram amaldiçoados ou que os pais dela eram monstros e que lá dentro da casa existia um portal para o inferno. A minha curiosidade era tanta naquela época, que um dia quando eu a vi na janela da casa, tentei fazer amizade com Thália pra tentar descobrir o que tinha dentro daquela casa, mas a única coisa que ela disse foi aos gritos, logo após o pai dela chegar e encher-lhe de bofetadas na face, ela gritava que ele ia leva-la para debaixo da terra, e que ele a faria atravessar a porta do inferno. Depois daquele dia eu não me aproximei mais dela, e tudo que passei a fazer era assistir o que acontecia ao seu redor, curiosa pra entender sobre a tal porta do inferno, e o porque dos pais daquela menina serem tão rígidos e protetores. Até que quando descobri... Me arrependi amargamente.

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