—– Você deu um passo em tanto viu garota — Richard falou tocando em meu ombro.

—– Obrigado — Agradeci tanto ele como a minha mãe

Ambos me olhavam orgulhosos.

Sabe quando você está tão feliz que mal consegue esconder, era assim que eu me sentia, meu próprio sorriso não cabia na minha boca.


Logo o clima ficou descontraído, com boas conversas e risadas, e depois disso cada um foi para um lado. Richard para o seu novo emprego no quintal de casa e minha mãe após  levar Zyan pra creche, também foi trabalhar, e eu acabei ficando sozinha, como sempre, mas eu estou tranquila quanto a isso, no começo era assustador com todas aquelas alucinações, mas hoje eu me sinto confiante, e se as assombrações aparecerem, eu vou estar pronta para enfrenta-las.

Mas pela primeira vez eu tive uma tarde tranquila e normal.

Eu aproveitei o tempo livre para arrumar a casa, especialmente o meu quarto, retirei  tudo aquilo que achava inútil pra mim e coloquei numa caixa grande para doação.

O que não serve pra você, pode servir para outras pessoas, desde que esteja em bom estado.

E no meio dessa faxina, acabei encontrando a antiga caixinha de música, que o meu pai havia me dado, por incrível que pareça ainda estava funcionando.

Só que a música não me traz boas lembranças. Era uma melodia doce mas que agredia severamente os meus ouvidos

Depois de tirar toda a poeira dela, a  peguei com cuidado e coloquei dentro da caixa junto com as outras coisas.

Passei pela a janela e resolvi parar para olhar, fiquei feliz por não sentir mais aquela mágoa reprimida dentro de mim.

Agora mais do que nunca, eu reconheço que a culpa não foi minha e que eu não deveria pagar por isso. O culpado não está mais aqui, e eu espero sinceramente que esteja ardendo no inferno.

Vi o que antes era a oficina do meu  pai, se transformar em uma simples mercado onde o Richard está trabalhando agora.

Apesar de quase termos a mesma idade eu decidi trata-lo como o meu padrasto e respeitar a relação que ele e minha mãe estão tendo, finalmente ela encontrou alguém que a ama de verdade, que a trata como ela merece,  e se ela pode, significa que eu também posso.

Eu não fico triste de ver que ele acabou com algo que antes pertencia ao meu pai, muito pelo contrário, estou muito feliz.

É muito bom substituir coisas velhas por coisas novas, e coisas ruins por coisas boas.

E também, o meu pai sempre deixou claro que aquilo seria meu um dia,  e eu não vejo outra pessoa melhor para cuidar da oficina como o Richard, mesmo que ele tenha optado em não continuar com o negócio.

Peguei a caixa e levei pro carro, porque mais tarde eu vou levá-la para uma instituição de crianças carentes.

O quarto agora ficou sem identidade.

As paredes ainda tinham alguns vestígios de papel, por conta dos posts das bandas que eu curtia, mas nada que uma boa tinta não resolva.

Esse quarto vai ser do Zyan um dia, se ele quiser, quero que ele tenha  o privilégio de ver o seu pai vindo do trabalho, o seu pai de verdade,  quero que ele decore esse quarto do jeitinho dele.

Me ocupei o resto da tarde procurando em catálogos casas para alugar e achei uma simples, com um valor acessível.

Enfim, a minha vida estava voltando para os eixos.

Assim que voltei para academia de dança, notei que as minhas crianças haviam sofrido demais a minha ausência, pois me receberam como papai Noel em noite de natal.

Fiquei muito feliz por perceber que eu era amada de verdade, pois crianças são sinceras com seus sentimentos, e nunca mentem.

Notei que Annabelle tinha faltado à aula, e que de acordo com as outras crianças essa não foi a primeira vez.

Será que Diego preferiu tirar a menina das aulas de dança para não ter o desprazer de me ver.

Afinal tivemos um único encontro, e depois disso eu sumi, ignorei suas ligações, e não dei sequer explicações, ele deve ter se sentido culpado, coitado.

Preciso me desculpar com ele, e talvez acabar de vez com algo que nem começou.

Mas notei que desde que fiquei ausente mentalmente, havia um silêncio ensurdecedor vindo de sua casa, eu costumava ouvir o som da água da mangueira, todos os dias de manhã, sempre quando a sua mãe molhava as plantas e nem isso eu consegui ouvir mais.

A casa estava completamente vazia, e as janelas e portas estavam sempre  fechadas.

Pra onde será que eles foram, será que se mudaram?

Eu nem tive a chance de me despedir dele, eu gostava dele, foi o primeiro homem que gostei depois de tudo que aconteceu, e eu gostaria que além de  primeiro, ele tivesse sido o último.

Fiquei apreensiva,  buscando respostas na minha mente para justificar o desaparecimento de alguém.

Me sentia extremamente culpada. Eu tinha encontrado o homem dos meus sonhos e deixei ele escapar por entre os meus dedos.

E a única coisa que restou foram as  imagens dele sorrindo e me olhando com aqueles olhos capazes de desconcertar qualquer um.

Como eu pude ser tão burra.

Peguei o celular e procurei seu número no registro de chamadas, e como havia um que se repetia mais do que os outros, imaginei que fosse o dele, mas ele não estava atendendo, a ligação só dava na caixa postal.

Passei a mão pelos cabelos, aflita, e suspirei decepcionada.

E agora como vou dizer a ele que o amo.

O vizinho Where stories live. Discover now