Consulta

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         Individualistas. Não por natureza, mas por influência do meio. Os olhos são treinados a procurar nos outros o reflexo de si mesmos. Imersos em uma sociedade pré-moldada para fabricar cidadãos estruturados de acordo com o que se espera, quando há um desvio de comportamento, de emoção ou de cognição, este pequeno detalhe passa despercebido, até mesmo para os entes próximos. Na aparência, todos são iguais: perfeitamente sãos e com vidas maravilhosas. Ninguém nota a diferença. Ninguém nota quando alguém sofre de depressão ou de ansiedade ou, quem sabe, de algum outro transtorno. Ninguém repara quando alguém precisa de ajuda, a menos que alguma tragédia aconteça e mude o jogo. É psicologicamente inevitável: como humanos, são levados a focar a atenção somente naquilo que os interessa verdadeiramente. Se foge de seu campo de conveniência, energia alguma será desprendida para tal direção. É um fato.

        Sterling mordeu os lábios inferiores.

        Pintou de nervosismo a sua palidez momentânea, mas camuflou o drama com uma postura que não lhe condizia. Mesmo assim, era evidente que ela não possuía toda a confiança que desejava transmitir. Seu andar hesitante e incerto explanou os defeitos das peças do quebra-cabeça. Ela intimamente flertava com o colapso. Sorte sua foi que ele não lhe deu tanta bola.

         O ponto era que, porque o desconhecido não tinha nem rosto nem tampouco cheiro, Sterling o temia. Não estava acostumada com mudanças em sua rotina. Chata que fosse, mas era sua rotina. O desvio das rotas antes tão certas e o ingresso em territórios estrangeiros afetaram-na, mas ela sabia que tinha de o fazer. Estava ali para aquilo. Tinha que fazer a consulta.

        Foi então que acompanhou a doutora Melissa Jansen até sua sala. Adentrou, e a porta se fechou por detrás de si.

       O coração batia forte.

      Mas, felizmente, se surpreendeu com a quebra de suas más expectativas. A imagem que ela própria coloriu com tinta de negatividade em sua mente caiu imediatamente por terra no instante em que pisou lá dentro. Respirou até mais aliviada ao se dar conta de que o lugar não era nada parecido com o que imaginara. Seus olhos varreram com curiosidade o ambiente para se familiarizar e a aflição, aquela que a acometia, foi ficando pelo caminho conforme avançava mais e mais.

        Com decorações leves e bonitas espalhadas por todo o lugar e livros enfileirados organizadamente nas prateleiras e estantes, o consultório parecia agradavelmente acolhedor. As persianas das janelas estavam fechadas para oferecer mais privacidade e as paredes eram lilás clarinho, um tom de cor comumente associado à sensação de paz e equilíbrio para a mente. Funcionava, pelo visto. No centro da sala, havia um tapete felpudo e uma mesinha de madeira ao meio das duas poltronas de couro reclináveis, as quais estavam uma defronte a outra.

        Melissa disse a ela para ficar à vontade para escolher o sofá que quisesse, então Sterling, depois de ponderar por um instante, escolheu: estrategicamente pegou o assento que ficava mais próximo da porta. Se tudo desse errado, era só dar um salto e sair correndo de lá.

       Elas tomaram seus respectivos lugares e a doutora, já com a prancheta em mãos, recostou-se na própria poltrona e cruzou uma perna sobre a outra elegantemente. Sterling, por sua vez, manteve a postura rígida.

— Relaxe. — Jansen preparou o território a fim de tranquilizar a adolescente. — Se quiser, pode puxar essa alavanca aí ao seu lado para se ajeitar melhor. — e apontou com o indicador para o acessório lateral do sofá, que erguia o apoio para os pés.

        Sterling acompanhou com os olhos o caminho que lhe fora mostrado, mas apenas por curiosidade, porque, em seguida, balançou a cabeça em negação, recusando a oferta.

Teenage Bounty Hunters 2 (Stepril)Where stories live. Discover now