Capítulo 4

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- Pule logo Iran, eu te segurei uma vez, posso fazer isso de novo.

Estávamos saindo do quartel, bom, eu já estava fora mas a garota que me acompanhava na fuga estava, literalmente, em cima do muro de três metros de altura, eu desci como se estivesse numa parede de escalada mas o medo de altura que Iran nutria por altura a impedia de enxergar o quão fácil era descer dali. Ela finalmente pulou e eu a segurei outra vez, com um pouco mais de dificuldade que antes por esse lugar ser mais alto que o outro.

- Sabe, acho super sexy quando você salva a minha vida -ela fala tentando disfarçar o nervosismo depois que eu a coloco no chão

- Você não morreria se caísse de três metros para o chão -digo e noto ela realmente se acalmar com a minha fala - No máximo quebraria uma perna -concluo dando de ombros provocativa e a garota fecha a cara me encarando mas eu dou as costas e começo a andar para dentro da mata que daria ao castelo

- Por que não disse isso antes de eu pular? -ela pergunta irritada e anda até mim batendo os pés

- Se tivesse dito você estaria lá até a agora -respondo continuando o caminho pela mata

- E se tiverem lobos nessa floresta? -ela pergunta apertando o passo para me seguir

- Não tem. -digo simples

- E se tiver? -ela arregala os olhos

- Isso é uma mata pequena lobos ficam em florestas, grandes, onde tem bastante comida, pra toda a alcateia, como eu disse antes, aqui não tem lobos -explico

- Mas e se tiver? -questiona pausadamente.

Paro de andar de repente e sinto ela se chocar contra as minhas costas, me viro para olha-la.

- Se tiverem lobos... -começo outra vez com o tom de voz suave e a expressão calma - Eu deixo eles comerem você -concluo em tom áspero fechando a cara.

A garota bufa irritada com minha resposta mas ignoro sua irritação e volto a adentrar a mata para atravessa-la até a cidade/grande aldeia mais proxima.

- Como aquele soldado da ronda não viu todo esse sangue em sua roupa? Alias, está fedendo.

- Não é da sua conta e se você parar de me atrasar e apertar o passo talvez consigamos chegar antes do alvorecer.

- Está me chamando de lenta? -agora estava ainda mais irritada

- Sim, e escandalosa. -completo

- Escandalosa também? -ela ergue as sobrancelhas ofendida

- Eu poderia ouvir sua voz a quilômetros. -era verdade

Eu obviamente não iria contar a ela que escondi o sangue do meu corpo com um feitiço, muito menos que possuía magia, não muita, ela era limitada nas terras mortais por causa da muralha que nos separava das terras feéricas, do lado feérico, eu podia senti-la correndo em minhas veias e fazia coisas com ela que nunca sonharia em fazer desse lado, é assim que mato feéricos por lá.

Minha mãe havia me contado umas histórias sobre meu pai, meu verdadeiro pai, quando já estava doente demais para sair da cama, eu pensava ser apenas uma das coisas sem sentido que os doentes falam, era nova demais para aceitar que era, de fato, bastarda, Nestha ouviu parte da história uma vez, desde que mamãe morreu ela não parou mais de me chamar de bastarda, como se não me considerasse mais sua irmã, aquilo doia, nós éramos amigas antes, inseparáveis mas a morte de nossa mãe a destruiu, destruiu todas nós mas Nestha lida diferente com a dor, agride as pessoas a sua volta para que elas se afastem e fez isso comigo tão bem que eu nunca mais consegui olhar para ela do mesmo jeito, havia mágoa demais para que eu sequer conseguisse conversar com ela sem lembrar de tudo oque foi dito, ela precisava de alguém para culpar pela morte da mamãe e me escolheu para isso, quando nós mais precisávamos uma da outra, ela virou as costas para mim e aquela não foi a ultima vez.

Só fui acreditar nas histórias que mamãe contava quando me reuni com os assassinos, um deles, o líder deles, Dearil, me ensinou todo oque eu sei, me treinou da forma mais cruel possível, ele dizia que com o treinamento implacável e as habilidades que me foram entregues ao nascer, eu seria a melhor, ele me treinou para que eu fosse a melhor, guardou meu segredo sobre a magia e me ensinou a usa-la, com a "ajuda" de alguns feéricos que sequestrou ao longo dos anos e eu me tornei a melhor, imbatível para qualquer um e incontrolável mas Dearil não sabia dessa parte, pensava me controlar, pensava ter minha obediência e gratidão cegas e por enquanto era útil que se mantivesse assim.

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Iran afrouxou o passo durante os últimos quilômetros reduzindo nossa velocidade e tive que fazer o mesmo para não deixa-la para trás mas já estávamos chegando e o alvorecer também.

- Meus pés doem -Iran reclama

Talvez a garota não estivesse acostumada a se locomover a pé e depressa por uma distancia considerável mas mesmo eu sentia meus pés doerem, primeiramente pelo salto alto que usava no quartel mas agora pelas pedras e cacos de vidro que se afundavam em meus pés descalços.

- Chegamos, já pode parar de sofrer. -pego a garota pela mão e a guio para dentro do prédio.

A fachada do local estava caindo aos pedaços e o prédio tinha quatro andares, um apartamento por andar, o meu ficava no ultimo e os outros estavam desocupados a anos, ninguém queria morar numa espelunca como essa.

- Nem fodendo. -Iran exclama assim que abro a porta do apartamento deixando que ela entre primeiro - Eu pensei que fosse um chiqueiro mas isso aqui...

A garota olhava para a decoração luxuosa da sala de estar, o sofá branco ocupava grande parte de duas paredes, as cores do ambiente combinavam perfeitamente, o sofá era branco e tinham três cores de almofadas em cima dele, branca, cinza claro e vinho, o carpete era do mesmo cinza das almofadas, a decoração da parede e as cortinas combinavam com o vermelho e tinha uma enorme janela que ocupava de ponta a ponta da parede oposta a entrada.

- Você não me disse que era rica -seus olhos estão agora arregalados prestando atenção no local

- Você nunca perguntou -dou de ombros me divertindo internamente com a situação

- Quero virar assassina também-ela diz me fazendo não conseguir conter o riso - Estou falando sério! -ela agora ri também

- Vou tirar todo esse sangue do meu corpo, se comporte.

- Me comportarei, imagina quebrar algo? Deus me livre, um lápis dessa casa custa meu rim -ela diz ainda impressionada enquanto eu me afastava.

Tiro todas as adagas de dentro do corset e as limpo uma por uma, até as que eu não usei estavam sujas pelo sangue que se adentrou ao tecido. Meu corpo também tinha tanto sangue que a água saia turva numa mistura de vermelho e marrom, demorei quase meia hora no banho, só sai quando a água escorreu transparente pelo ralo e eu me sentia finalmente limpa e cheirosa outra vez.

Iran capotou no sofá antes mesmo que eu tivesse saído do banho, com a mesma roupa que chegou, talvez não quisesse se passar por enxerida e não pegou uma roupa limpa em meu armário ou talvez simplesmente estivesse cansada demais para isso já que andamos durante horas.

Apaguei assim que cai na cama, mal tive tempo para organizar meus pensamentos para o dia seguinte e quando acordei, cinco horas depois, a noticia já tinha se espalhado, todos já sabiam que Denner Williams tinha sido assassinado por Scarlet Walker, graças a assinatura que deixei antes de partir, a cortesã que se deitou com ele estava desaparecida, todos achavam que tinha sido levada pela assassina mas ninguém se preocupava com uma cortesã o suficiente para iniciar um grupo de buscas.

Nem aqueles que me contratavam pessoalmente, como Collin, sabiam meu verdadeiro rosto, eu sempre estava sob encantamento, alguns se lembravam de me ver loira, outros me viam ruiva mas as vezes eu tinha cabelos ônix ou olhos e cabelos castanhos, o rosto era sempre diferente, as cicatrizes que exibia também, não importava como me viam, ninguém sabia minha verdadeira feição, todos sabiam quem eu era mas ninguém tinha, de fato, visto meu rosto, Scarlet Walker era um fantasma.

Corte de chamas e pesadelosWhere stories live. Discover now