CAPÍTULO 49

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— Você bateu a cabeça também? Tem agido meio estranho.

Ren soltou o ar impaciente e ao mesmo tempo avermelhado.

— O que quer ouvir de mim? Já pedi desculpas... Eu... eu sei que não funciona assim, mas estou tentando... — Me olhou por alguns segundos enquanto eu semicerrava os olhos. — Poderia não me olhar com esses olhos apertados? Estou ficando desconfortável — resmungou ele aborrecido e ri, mas a cabeça doeu e fiz uma careta.

Suspirei pensando por onde começar, de alguma forma, ter falado um pouco de minha dor para Ryan aliviou minha sensação de medo. Eu me sentia mais feliz, pronta para ver o céu, disposta a aproveitar um pouco mais minha vida, mas contar isso para Ren parecia ser ainda mais complexo, talvez por que Ren não era um desconhecido, se duvidar, Ren era a pessoa que mais me conhecia depois de minha família, até mais que Yuna. Prensei os lábios e suspirei me preparando para falar a respeito do que faltava ele saber de mim, meu passado sombrio.

— Eu nasci em uma família simples, sou a terceira de seis meninas. — Sorri ao lembrar delas. — Quando eu nasci, minha irmã mais velha cuidou de mim, nós tínhamos só 4 anos de diferença. A minha irmã do meio, entre mim e a mais velha, morreu um pouco depois que nasci, não sabia o porquê ao certo, mamãe nunca quis me contar, Lisa também não, então não insisti, mas eu sabia que tinha haver com papai.

— Seu pai a matou? — ele perguntou assustado.

— Meu pai matou a Jade, a Lohane e minha mãe. Ele as batia muito, mas parece que com a Jade foi o mais cruel. Mamãe e Lisa não quiseram me falar sobre, mas depois eu o ouvi ameaçar-me dizendo que me mataria como fez com ela. — Conforme falava, vi em seus olhos o horror crescer misturado com surpresa e raiva, era adorável como Ren era transparente. — Minha mãe definhou com a falta de alimento que tínhamos e com os ferimentos que ele lhe causava depois de chegar bêbado em casa. Minhas outras irmãs morreram doentes, e com fome. Nós sentíamos tanta fome que doía quando comíamos qualquer coisa. Eu tinha 5 anos quando tive que enterrar minha mãe e 3 irmãs junto com Lisa. Sei que ela sofreu muito mais do que eu, teve mais tempo para se apegar a elas... — Minha voz vacilou e o olhei, Ren piscou desconcertado. — Mas um dia tive a oportunidade de aceitar um trabalho, Lisa sempre se sacrificou por mim, e naquela vez não foi diferente, ela podia ter aceitado ir no meu lugar, mas foi eu a ser vendida.

— Você foi vendida? — ele perguntou perplexo.

— Por muito pouco, minha irmã convenceu uma senhora a treinar-me para trabalhar em casa de família, mas a única forma de meu Pai deixar uma de nós ir, era se a senhora me comprasse, e em troca, eu lhe pagaria pelo trabalho. E assim o fiz, parte do meu salário por alguns anos foi para ela. Mas se eu tivesse ficado, Lisa teria essa oportunidade, mas eu a deixei sem olhar para trás... Me sentia vitoriosa, só que quando olho para trás, a imagino lá sozinha com aquele homem, e as vezes me pergunto: se ela morreu, quem enterrou seu corpo?

Ele piscou em choque. Então continuei com os olhos marejados e um aperto no peito.

— Não quero ser outra pessoa, Ren. Eu só não podia abandonar a Yuna quando ela me pediu ajuda, eu não podia. Ela parecia tão sozinha e aquilo pareceu ser muito importante para ela..., talvez não consiga entender, mas no dia fez muito sentido para mim...

Ele ficou em silencio por alguns segundos então suspirou.

— Eu... sinto muito — disse meio rasgado e me surpreendi.

— Por isso eu entendo sua dor, sei como é perder alguém que se ama. — Prensei os lábios e ele me olhou com os olhos preocupados, misturado com culpa, compreensão e carinho.

— Eu sinto muito — disse novamente sem saber o que dizer ao certo. — Eu não fazia ideia...E ainda a fiz aguentar meus choros por conta de minhas perdas... — Balançou a cabeça em modo negativo como se fosse um idiota.

O CONDE QUE EU AMAVAOnde as histórias ganham vida. Descobre agora