CAPÍTULO 6

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11 ANOS ATRÁS:

Tremia. Eu estava tremendo tanto que mal conseguia pronunciar uma palavra sequer. Além de estar muito frio, eu estava com medo. Estava com medo do que me esperava. Fechei os olhos com força sentindo aquele carroção se balançar mais uma vez.

— Estamos chegando, Mari — falou a bondosa governanta que foi me buscar a mando de seus patrões. Lembro de seus olhos bondosos e suas mãos quentes. Se não fosse seu abraço apertado, eu estaria tremendo ainda mais.

Eu era uma criança pequena e magra com olhos arregalados e cabelos na altura do pescoço, lembro-me de usar um casaco feito de sacos de linho grosseiro e sapatos que já haviam sido emendados mais de 10 vezes, estavam tão gastos que já se formavam buracos na sola.

Assim que a carruagem parou, desci naquele solo coberto de neve fofinha que me afundou até os joelhos. Estremeci sentindo meus ossos doerem, minhas roupas não eram tão adequadas para isso.

A senhora de mãos grandes me puxou com cuidado para dentro da mansão e agradeci no momento que as portas se abriram e eu pude sentir um pouco do calor do local. Ela me ajudou a tirar a neve do corpo e ajeitou a touca apertada que cobria minha cabeça e protegia as orelhas. Seu olhar era doce e lembrava um pouco da mamãe, por isso me acalmei e aceitei segurar sua mão.

Assim que chegamos no grande salão, vi um homem de olhos pequenos, óculos bem redondos assim como sua barriga, e pouco cabelo na cabeça me olhando fixamente, ele estava de mãos dadas com uma menina com olhos grandes e nariz vermelho. Ao seu lado estava um menino cabisbaixo com a franja cobrindo parte dos seus olhos.

Travei, mas a senhora apertou minha pequena mão indicando que tudo ficaria bem.

— Está será a sua dama — disse o homem sério. Sua voz era rouca e grossa de forma que me assustou. Encarei a menina nervosa, não queria que ela me batesse. Tinha medo que eles me batessem.

Mas ao contrário do que pensava, Yuna soltou a mão de seu pai e se aproximou a passos decididos e largos parando em minha frente. Ela usava um vestido rosa claro bonito e seus cabelos compridos estavam penteados com duas mechas da frente unidas atras da cabeça com um laço grande que combinava com o vestido. Yuna me encarava séria e eu engoli a seco. Ela era menor que eu, mas passava autoridade.

— Eu me chamo Yuna Wamura, e você? — perguntou com sua dicção já bem formada. A encarei sentindo um pouquinho mais de confiança.

— Eu sou Mari Momo — respondi tensa. Ela então sorriu e meu coração disparou animado. Naquele momento, eu só desejei que Lisa estivesse ali também.

— Está bem, Mari Momo, então podemos brincar lá fora? — perguntou já segurando minhas mãos que estavam um pouco sujas.

— A Mari vai tomar um banho quente antes querida, e vamos lhe dar roupas mais quentes, e aí ela poderá brincar com você — respondeu a senhora gentil me segurando pela mão suja. Observei -a sentindo um aperto no peito. As pessoas sempre se recusavam a segurar minha mão por que eu era suja e fedida, mas elas não pareciam se importar...

— Eu posso esperar, então. — Yuna sorria animada. Olhei por cima do ombro para o senhor Wamura e o vi satisfeito. Já o seu filho, me olhava fixamente um tanto sério. Me senti nervosa e voltei-me para frente. Será que ele não gostou de mim?

No quarto de banho, a empregada me ajudou a me lavar e me deu um vestido limpinho e confortável, o melhor vestido que já usei em minha vida. Fiquei imensamente feliz com isso, mas quase não consegui controlar as lágrimas quando a vi me entregar um par de botas em bom estado. Me calcei e me olhei no espelho no meu quarto, estava muito apresentável. Da janela havia uma árvore, pelo seu tronco era uma cerejeira, eu amava cerejeiras. Tive certeza de que ficaria naquele lugar, e me senti feliz, mesmo que no fundo, uma tristeza se instalava ainda mais profundamente.

No caminho para o lado de fora, me lembrei das palavras do meu antigo dono e estremeci. Ele me disse que, se me devolverem, ele me mataria, mas antes faria questão de arrancar meus dentes um por um com o alicate que ele cortava as unhas. Fechei os olhos com força temerosa de que eles me devolvessem. Olhei para a menina que me acompanhava animada. Ela tinha a pele perfeita, olhos grandes e cabelos brilhantes. Já eu era magra e fraca, meus cabelos estavam um pouco opacos e minha pele descamava um pouco, mas eu jurei para mim mesma que me esforçaria para ser uma boa empregada.



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Um pouco do passado da Mari Momo, parece que ela sofreu bastante, não?

Chegou ali cheia de traumas, tadinha.

O CONDE QUE EU AMAVAWhere stories live. Discover now