CAPÍTULO 8

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Estava deitada quando ouvi um barulho do lado de fora da casa. Me sentei olhando atenta em direção a janela, era noite e estava tudo escuro, por tanto, não podia ver nada com clareza do lado de fora. Pisquei me sentindo nervosa, tinha a impressão de estar sendo observada. Geralmente eu não fechava a janela, pois gostava do vento que refrescava aquele quarto quente, no entanto, naquela hora eu vi uma necessidade de fechá-la.

Mas minhas pernas pareciam estar travadas, como se o medo que tomasse conta de mim fosse maior do que a necessidade de me proteger. Então eu entendi o porquê. Conforme me concentrava, pude ouvir aquele assobio singular e sem ritmo. Estremeci no mesmo instante.

— Não pode ser... — sussurrei incrédula enquanto meus olhos fitavam a janela do meu quarto. Engoli a seco sentindo meu estômago revirar. Conforme o assobio ficava mais próximo, podia ouvir passos se aproximarem da janela. Apertei com força o lençol da cama sentindo até mesmo minha respiração falhar, era como se meu corpo estivesse suspenso. Então o assobio e os passos pararam e tudo o que eu consegui ouvir era minha respiração. Pisquei.

— Está me esperando, Mari? — Aquela voz surgiu ao meu lado. Virei o rosto rapidamente e me deparei com aqueles olhos escuros esbugalhados me olhando fixamente. Gritei o mais alto que pude o empurrando com os braços e pernas até que meu corpo foi contra o chão com força, gemi de dor, mas assim que abri os olhos o procurando, não encontrei nada, nem ninguém ali.

Me levantei rapidamente em busca de qualquer presença em meu quarto, mas não havia nada, absolutamente nada, a não ser eu respirando descompassadamente agarrada a meu lençol como se minha vida dependesse disso. Olhei em volta e reparei que o sol estava nascendo.

Minha nossa, foi apenas um pesadelo? Passei a mão no rosto e andei lentamente, ainda recuperando-me do susto, até meu espelho. Olhei meu rosto pálido, assim como meus lábios e passei a mão nos cabelos da altura do queixo os jogando para trás. Usava uma franja e logo ela voltou a minha testa bagunçada em camadas, assim como parte dos meus cabelos pretos, cheios e bem lisos.

Joguei o lençol sobre a cama e voltei a me olhar no espelho um tanto mais calma. Fazia muito tempo que não tinha sonhos com aquele monstro. Suspirei pensativa. Mesmo que ele me encontrasse, não teria como me reconhecer, eu mudei muito depois que fui embora e não era uma pessoa muito fora do comum a ponto de ser facilmente reconhecida, tinha os olhos grandes, mas puxados nas pontas, meus cílios não eram tão compridos, assim como meus lábios não eram muito grandes e sim pequenos e bem desenhados, como os de uma bonequinha de porcelana. Meu nariz era característico do nosso povo, pequeno e proporcional, meu sorriso era amplo e eu tinha pequenas quatro covinhas. Uma em cada bochecha e quando sorria, aparecia outras duas próximas aos cantos da boca. Ren gostava delas, e isso me fez gostar delas também.

— Mari? — A voz do lado de fora me fez gritar de susto. — Mari? — Ren perguntou ainda mais preocupado.

— Ah! Só um... — Andava de um lado para o outro agora nervosa e envergonhada. — ... Minuto... ah... — Eu estava semelhante a uma barata tonta sem sair do lugar, então parei o que estava fazendo e respirei fundo me acalmando. — Calma... — disse a mim mesma me certificando que minha roupa estava mais ou menos adequada para abrir a porta para um cavalheiro, mesmo que fosse bem inapropriado ele estar na porta do meu quarto a uma hora dessas.

Quase ninguém deve estar acordado. Abri a porta e observei Ren mau vestido e com os cabelos um pouco bagunçados, mas o que mais me chamou atenção foi seus olhos e nariz vermelhos.

— Ren? — perguntei preocupada, mas as palavras fugiram da minha mente quando ele deixou que seu corpo viesse em minha direção, quase como uma criança assustada, e encostou sua testa em meu ombro. Pisquei. Fazia tempos que não o via tão fragilizado como agora. Então pensei que talvez não fosse bom que nos vissem assim. — Venha... — Me afastei lhe dando espaço para que ele entrasse, e assim pude fechar a porta do quarto. Estava nervosa, de fato, mas eu conhecia Ren com a palma de minha mão. — Conte-me o que aconteceu? — perguntei e ele estreitou mais seus olhos como se falar sobre aquilo lhe doesse em alguma parte do seu corpo.

— Eu... sonhei com eles, Mari — contou Ren visivelmente abalado. — E foi tão real que achei que ainda estivessem vivos... — Ele se sentou no canto da minha cama e eu permaneci em pé temerosa de que alguém nos visse ali dentro. Uma dama jamais poderia ficar assim com um cavalheiro. Não uma dama de respeito. Mas...

Fui até a janela e puxei ainda mais a cortina para cobrir qualquer visão que pudesse oferecer e me voltei para ele percebendo que o quarto agora estava mais escuro que o normal me deixado com uma sensação estranha no corpo.

Porém, ao contrário de mim, Ren não apresentou nenhuma espécie de nervosismo. Na verdade, ele parecia bem à vontade, como ficaria se estivesse com Yuna, por exemplo. Suspirei me aproximando e sentando-me ao seu lado. Ele não chorava, mas seu olhar estava caído e entristecido.

E como eu detestava olhá-lo assim.

Eu sabia que não adiantava eu tentar lhe dizer palavras bonitas, muito menos lhe afirmar que deveria superar ou que uma hora iria passar, todas estas coisas foram ouvidas demais por ele, então eu apenas fiquei em silêncio ao seu lado. Apesar de estarmos sozinhos e naquela situação comprometedora, após alguns segundos eu me sentia calma, como se estivesse onde deveria estar, como se fosse exatamente assim que deveria acontecer.

Ele suspirou depois de alguns segundos.

— Não vai dizer nada? — perguntou fitando o chão.

— Não há o que dizer, apenas sentir — respondi fitando um ponto escuro no canto do teto que tenho quase certeza que era uma aranha intrometida, mas parei minha análise assim que percebi que Ren me olhava, o encarei sentindo um rebuliço no estômago. Meu coração disparou no mesmo instante que meu olhar se fixou nos dele. Ren puxou o ar e o vi engolir a seco. Então sorriu sem jeito e voltou-se para frente piscando rapidamente.

— É incrível como me sinto mais tranquilo quando estou perto de você — disse ele depois de alguns minutos em um silêncio desconfortável. Pisquei surpresa pela sua afirmação e meu coração se encheu de esperança. — Sinto que posso contar com você sempre — Ren me olhou sorrindo discretamente como ele costumava fazer. Oh, céus, acho que terei uma morte morrida nesse instante.

Tive a ligeira impressão que ele olhou para meus lábios e me arrepiei completamente. Será que seria errado se o beijasse ali e agora? Será que ele ficaria com raiva de mim? Mas que outra oportunidade teria se todos sempre andam nos vigiando? Talvez eu nunca mais possa me aproximar de Ren tanto como agora. Mas e se ele não sentir absolutamente nada por mim?

Antes que me decidisse, ele acariciou meu rosto delicadamente com seus dedos, estremeci com seu toque e todos meus pensamentos se desfizeram. Me enchi de expectativas, Ren iria me beijar?

Estava quase fechando meus olhos, quando ele acariciou minha cabeça bagunçando meus cabelos e se levantou prensando os lábios e colocando ambas as mãos no bolso. Pisquei confusa e frustrada. Logo quando acabaria com minha curiosidade e descobriria o gosto de um beijo, ele me faz isso! Ren então mordeu o lábio inferior e pigarreou coçando o nariz.

— Acho que devo sair, antes que isso gere alguma confusão — disse ele se dirigindo a porta hesitante, mas parou antes e me olhou. — Obrigada mais uma vez, Mari, e bom dia... — Sorriu e saiu.

Fiquei ali sentada na cama com meu coração na mão. Então toquei levemente em meu rosto onde ainda estava com a breve sensação de seu toque, depois toquei em meus lábios, até quentes estavam. Suspirei fazendo um bico.

— Que constrangedor! — resmunguei ao imaginar beijando-lhe.

Naquele instante, eu estava muito feliz e realizada, mal imaginava que aquele era apenas uma parte do problema que estava prestes a explodir. E o pior de tudo era que eu era o principal alvo. 

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Parece que teremos tempestades, hein?

O CONDE QUE EU AMAVAOnde as histórias ganham vida. Descobre agora