Capítulo Quarenta e Seis

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Magnólia serviu um prato generoso de comida para o filho e sentou à mesa também saboreando o seu café. Era muito estranho Toni aparecer assim no meio da noite, todos na pensão já estavam dormindo e o casarão estava às escuras, exceto pela cozinha onde o moreno jantava enfim.

— Mas ele ficou bem? Você só disse que encontrou o menino e nem falou mais nada — questionou preocupada com a afetação do filho.

Desde que Toni chegou estava aéreo e reflexivo, sem falar naquela frustração estampada no seu rosto. Logo imaginou que tinha a ver com o sumiço do garoto que estava hospedado no apartamento do filho. Desde a manhã Toni rodava a cidade com César atrás do fujão.

— Ele tá bem. Se enfiou na casa do Samuel e passou o dia todo enfurnado lá, enchendo saco e perturbando só para dar um susto no César.

— E essa sua carinha amarrada aí é por causa disso? Porque o menino passou o dia com o Samuel e você não? — palpitou, muito compreensiva.

— Não né mãe! Que besteira. Eu hein — falou voltando a comer.

— Então tem a ver com esse amor todo que você tem pelo Samuel. As coisas não estão sendo fáceis não é?

Toni olhou um pouco surpreso para a mulher, que falava com aquele jeito de mãe tão especial de quem sabe de tudo.

— Como a senhora...?

Magnólia sorriu de forma serena e passou a mão no cabelo rebelde do filho.

— Oh querido. Eu sou sua mãe. Eu te coloquei nesse mundo e te criei. Pensa que eu nunca percebi como os seus olhinhos brilhavam toda vez que o Samuel aparecia aqui em casa? Vocês dois ainda eram meninos... mas eu via seu jeitinho alegre sempre ao redor dele.

Toni pousou o garfo no prato, pensando a respeito.

— Então a senhora já sabia que eu era gay antes d'eu falar...

— Não amor. Não é que eu soubesse. Quando você falou eu lembrei do Samuel e aí tudo fez sentido! Eu nunca vi você tão animado com alguém como você ficava perto dele. Até hoje na verdade né?!

Toni não escondeu toda sua confusão, nem sua frustração. Até a fome passou, respirou fundo e olhou nos olhos da mulher que lhe deu a vida sem se fazer de forte como sempre.

— Eu amo ele mãe — aquilo saiu como um desabafo, como se fosse um segredo nunca falado em voz alta.

Os olhos pretos da mulher foram marejando, muito emocionados e ao mesmo tempo doloridos pelo caminho tortuoso que o filho percorreu até o momento. Compreendia então cada lágrima derramada, cada momento de dor e aflição que assistiu impotente durante os últimos anos.

— Eu sei. Porque não fala isso para ele — sugeriu tomando uma das mãos do rapaz nas suas e afagando a fim de lhe dar conforto.

— Eu não posso.

— Mas porque filho? Vocês dois já não tão até se agarrando aí pelos cantos?! — insistiu, querendo rir com emoção.

— Ele não tá pronto...

Magnólia ficou mais séria, um pouco desentendida da conversa.

— Como assim, filho?

Toni suspirou outra vez e empurrou o prato, sem esconder o peso que esse assunto lhe trazia.

— Igual o Lucas quando veio morar com a gente. Lembra? Ele era desconfiado e não acreditava na gente. O Samuel é mais ou menos assim, é que ele passa pouco tempo aqui e a senhora não percebeu. Como que eu posso dizer... na cabeça dele é como se ele não fosse digno de amor. Ele não ia entender se eu falasse isso agora, mesmo que entendesse... não acreditaria... eu meio que tentei alguma coisa e não deu certo– falou, um pouco mais entristecido do que gostaria de admitir lembrando da frajuta noite dos caras.

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