Capítulo Vinte

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Samuel engoliu um comprimido do ansiolítico que tinha acabado de comprar, junto com alguns goles de água mineral, bebendo direto da garrafinha plástica.

Sentado naquele banco de praça sentia que a dor de cabeça tinha se potencializado ao extremo e o sol escaldante do meio da tarde não estava ajudando muito. Tirou a jaqueta marrom que usava e puxou as mangas da camisa até os cotovelos. Estava bem perto da Pensão, mas não tinha coragem de voltar para lá, então ficou ali esperando o remédio fazer efeito.

Foi como se o mundo ignorasse sua existência e ele ignorasse a existência do mundo, o tempo passou indiferente a confusão mental do músico naquele banco de praça. Samuel só despertou do seu torpor quando o celular tocou no seu bolso.

Pegou o aparelho com movimentos lentos. Tinha duas chamadas perdidas de Viviane, uma de Otávio, três de Toni. Tinha várias mensagens não lidas, passou os olhos rapidamente por elas, a maioria perguntava onde ele estava. Era estranho receber toda aquela atenção de repente, piscou os olhos para desanuviar a vista ruim e viu que eram quase seis da tarde.

De repente seu celular começou a tocar e o nome de Toni brilhou na tela azulada. Ainda não tinha uma única foto dele para colocar no contato, achava que nunca teria. Apertou o celular na mão por mais um momento, decidindo o que fazer, mas no fundo sabia que tinha que falar com o rapaz, se fosse fora da pensão seria melhor.

— Oi — atendeu enfim.

— Caralho Samuel até que enfim fim atendeu essa porra! Enfiou esse celular no cu foi? — brigou do outro lado da linha, conseguiu ouvir Magnólia repreendendo o filho.

— Desculpe — sorriu só de imaginar a cena tão corriqueira.

— Tá todo mundo doido atrás de ti nerdão. Tu sumiu depois do almoço parceiro, minha mãe tá deixando todo mundo maluco porra! — novamente ao fundo se ouviu uma torrente de reclamações.

— Toni você... Pode vir aqui? Estou na pracinha. Eu preciso conversar com você.

— Ir até aí? O que tá pegando cara? Tu num tá muito normal.

— Eu sei. Vem aqui por favor.

— Beleza parceiro, relaxa aí.

Seu coração estava tão apertado que era sufocante. Se não tivesse tomado o ansiolítico provavelmente já teria tido outra crise de pânico. Toni não demorou nem sete minutos para chegar, a pensão era bem perto da praça. Muitas vezes tocou violão ali na companhia do moreno quando ainda eram amigos. Estava ainda com o celular na mão, pensativo e cheio de receios quando percebeu o rapaz parar na sua frente, ficou encarando o tênis surrado do mais novo por um longo momento, tomando coragem.

— Samuel? Tá com algum problema?

Mesmo sabendo que Toni perceberia, limpou o rosto outra vez antes de levantar a cabeça, mas sua voz não saiu de imediato então acenou negativamente, sem nem conseguir olhá-lo.

— Ah qual é? Deixa de palhaçada! Tá na cara que rolou alguma treta! Desembucha logo palerma!

Samuel sorriu na sua culpa, era tão bom ouvir esse jeito grosseiro e meio carinhoso do rapaz se preocupar. Só que não merecia esse cuidado.

— Eu quero esclarecer as coisas entre a gente.

Preferia uma milhão de vezes não prosseguir, mas lembrava das duras palavras de Otávio, tinha que ser homem, tinha que assumir as consequências dos seus erros.

— Tá falando do que cara pálida? — gracejou o outro.

Novamente precisou empurrar sua ruína emocional para um canto obscuro da sua alma e tomar as rédeas da situação.

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