Capítulo Dezessete

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Simplesmente não viu o tempo passar.

Quando percebeu que o remédio que o namorado de Toni lhe deu não faria efeito buscou na internet rapidamente a bula do Ibuprofeno e passou a tomar a dose máxima, mas a dor no seu joelho apenas suavizou um pouco, quase nada. Era justamente o que o estava matando. Não viu o dia virar noite, em algum momento caiu no sono, cheio de sonhos confusos e agitados, acordou suado no meio da madrugada, o desespero foi tomando conta do seu corpo, logo as lágrimas escaparam, silenciosas e incontroláveis. 

Quando pareceu que estava se acalmando veio aquela sensação de perigo, como se tivesse que levantar e sair correndo ou morreria. Só o que fez foi cobrir o rosto com uma das mãos e soprar o ar para fora. Por mais que tivesse consciência que estava com os nervos à flor da pele e ansioso não conseguia evitar que tudo piorasse. 

Seus sonhos ruins foram se misturando com as lembranças recém recuperadas e seus pensamentos rodavam em torno disso de forma involuntária, em voltas intermináveis, permaneceu deitado, quase imóvel, porque simplesmente não havia nada que pudesse fazer.

Logo estava soluçando baixinho, sozinho no meio da madrugada, se controlando para não acordar o colega de quarto, Toni dormia na cama ao lado e não pretendia perturbar o rapaz. Embora sua vontade fosse gritar a plenos pulmões até o fôlego acabar. Estava tendo outra crise de pânico. Se sentia patético por ter consciência disso e não conseguir parar. Quando o dia finalmente amanheceu estava vazio e desgastado de qualquer emoção. Continuou deitado na esperança de conseguir dormir, sentindo o joelho latejando dolorosamente.

A fratura no fêmur foi bem perto do joelho, ao qual já havia lesionado dias antes de quebrar a perna. Toni estava certo na época, tinha rompido um ligamento. Seu joelho nunca se recuperou completamente, por pouco não ficou manco. De um modo geral ele funcionava bem, desde que não fosse forçado demais. Agora estava inchado e reclamando do esforço do dia anterior quando correu pelo centro da cidade.

Em algum momento ouviu a porta do quarto abrir e passos soaram pelo recinto.

— Toni... você não tem nada mais forte por aí? — a voz soou rouca pela falta de uso.

— Oi? — se surpreendeu com manifestação de vida no corpo que estava jogado na cama.

— Esse analgésico é fraco para mim.

Toni pegou o frasco em na beira da cômoda. Ibuprofeno. Leu mentalmente.

— Tá tomando quanto disso?

— A dose máxima.

— Saquei. Foi mal aí, eu não tenho mais essas coisas em casa, mas tu tá com dor aonde?

Samuel sorriu minimamente da pergunta, foi tão bom ver aquele sorriso simples que Toni ficou um pouco aliviado.

— Quer uma lista em ordem alfabética? — brincou o músico.

Como César previu o antebraço que levou a primeira pancada estava inchado, um hematoma surgiu nas costas, exatamente onde bateu contra o latão de lixo, mas a novidade foi o joelho.

— Acho que corri demais — concluiu se referindo a fuga pelo centro da cidade.

Pela primeira vez aquele silêncio desconfortável passou a incomodar o mais novo ali. Samuel permanecia deitado como estava antes, os olhos fechados o tempo todo, como se estivesse concentrado em alguma coisa.

— Faz muito tempo que não falo com meu fornecedor então só tenho gel de arnica aqui.

Viu Samuel abrir um sorriso sincero, mesmo de olhos fechados, parecia que não via esse sorriso há séculos.

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