Capítulo Seis

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Era injusto.

Era mentira.

Nunca disse que foi abusado, nem que sofreu qualquer tentativa.

Como um beijo pode ter virado uma tentativa de estupro?

Suas palavras foram completamente distorcidas. Nunca se referiu ao seu primeiro beijo daquela forma.

Sete anos atrás...

Samuel engoliu dois comprimidos de uma só vez e sentou na beira da sua cama, para deitar em seguida com cautela, tentando arrumar uma posição confortável para aliviar a dor nas costelas até o remédio fazer efeito.

Eram os últimos, Toni sempre aparecia com mais no fim da semana, talvez até já esteja com eles em mãos, mas fazia dois dias que Samuel não o via, que não ia à escola. Em primeiro lugar porque tinha uma mancha levemente arroxeada na bochecha de um tapa que levou na noite anterior. Era um ponto ruim em ter a pele tão clara, qualquer coisa marcava. O segundo motivo era porque se fosse certamente encontraria Toni, de uma forma ou de outra.

Há dois dias atrás tinha dado o seu primeiro beijo, justamente com o menino do fundamental e não sabia como devia reagir a isso. A lembrança daquela noite estava fresca na sua memória, se fechasse os olhos podia até sentir aquele contato íntimo. Nunca imaginou que seria tão macio e úmido beijar alguém, foi estranho, mas também foi bom. Seu coração acelerava e vinha um formigamento estranho na barriga cada vez que lembrava da sensação da língua do mais novo acariciando a sua. Simplesmente não conseguia parar de pensar nisso.

Imaginou que seu primeiro beijo seria com uma garota, mas a possibilidade sempre foi muito remota já que nunca se envolvia com ninguém. Toni era três anos mais novo e muito mais experiente. Isso lhe irritou um pouco na hora. Sentiu até um pouco de inveja. Não devia sentir nojo do que aconteceu? De ter sido tocado assim por outro cara?

Seu celular tocou pela terceira vez seguida, chamando sua atenção. A foto do seu vizinho brilhava na tela. Era lógico que Eduardo ia ligar para cobrar alguma justificativa pelas faltas, afinal não compareceu ao primeiro jogo dele oficial no time da escola.

— Oi Dudu. Que foi?

— Finalmente! Cara você sumiu! O que aconteceu?

— Nada, só um resfriado, estou com dor de cabeça e essas coisas. Por quê? Perdi alguma coisa interessante?

— Só minha estreia no time! Cara, foi da hora! Você tinha que ter visto! Eu fiz um gol incrível! Se você tivesse lá como prometeu podia ter filmado para mim! Vou tirar a maior onda com os três patetas que apostaram que eu não fazia um gol! Lembra que eu te falei dos caras que não me queriam no time?

— Lembro.

Conversaram mais alguns minutos sobre a escola e as meninas que estavam se jogando em cima de Eduardo agora. Afinal ele era o único aluno do primeiro ano que estava no time, as meninas do último ano o chamavam de bebê. O rapaz prometeu apresentar alguma garota bonita para o amigo veterano, sempre com suas piadinhas sobre o jeito quieto e pouco namorador de Samuel.

— O que houve hein Samuca? Sério. Fala por favor. Você anda sumido está faltando aula direto agora, poxa cara me diz aí. É aquele... negócio lá de novo? Alguém te bateu? Se for me diz logo quem é! Não sei para que fica protegendo esse otário que faz isso contigo — insistiu, cheio de receio na última parte.

Samuel fechou os olhos e respirou fundo, lembrando que a pouco tempo Eduardo havia lhe visto todo surrado no meio da rua e até o levou até a Pensão da Magnólia no meio da noite, já que não conseguiria chegar lá sozinho.

UnilateralWhere stories live. Discover now