Capítulo Vinte e Quatro

4.9K 611 373
                                    


Depois do estrago que Samuel causou na sua vida achava que podia lidar com qualquer coisa. Mas a confissão chorosa da amiga estava amargando mais do que aquela bebida de quinta.
Por que as pessoas eram assim? Tão traiçoeiras.

Toni virou a garrafa na boca, sorvendo a bebida em goles gulosos, fazendo escorrer pelo seu queixo.

Podia aceitar o fato dela ter se apaixonado por aquele monstro. Afinal as pessoas não controlavam isso. Mas nunca imaginou que ela o exporia dessa forma. Mesmo que não fosse Eduardo, podia ser qualquer outro, nunca permitiria que Viviane falasse dos seus sentimento para outra pessoa, confiou sua parte mais íntima somente para ela.

Os pensamentos vinham e rodavam na sua cabeça, Toni virava a garrafa na boca uma vez, outra e mais outra.

Não tinha noção de quanto tempo fazia que estava fora de casa desde que apagou no bar e acordou jogado na calçada com o sol forte queimando seu rosto.

Em algum momento acabou indo parar naquela praça, aquela maldita praça onde Samuel tantas vezes tocava violão e tudo que podia fazer era assistir de longe, ainda na época que o conhecia apenas de vista e sabia seu nome, mas para o loiro era um estranho qualquer.

Quando reconheceu o lugar para onde suas pernas o levaram se afundou ainda mais na bebida. Completamente alheio ao mundo ao seu redor. Ora ou outra sua vista se focava e conseguia distinguir os rostos desconfiados das mães que iam passando com seus filhos, sempre com aquele olhar reprovativo para o bêbado jogado embaixo daquela árvore. Mas logo tudo rodava outra vez e engolia mais da bebida amarga. Devia ser a terceira garrafa e nem lembrava o que era aquilo.

Sentiu seu braço ser puxado e seu corpo foi levantado, mas suas pernas não o sustentavam mais, seu braço foi passado por cima dos ombros de alguém. Levado pelas lembranças doces da adolescência naquela praça imaginou por um instante que era Samuel, que havia largado o violão para lhe acudir. Seu coração se aqueceu, batendo num ritmo gostoso no peito, cheio de sentimento saudoso. Mas a voz dessa pessoa soava distante, irreconhecível aos seus ouvidos, foi o cheiro que o denunciou.

César.

Enquanto andavam aos tropeços atravessando as calçadas sob o sol forte, foi percebendo aos poucos em meio a sua embriaguez, devia ter percebido logo de cara que não era Samuel, primeiro porque ele não estava ali, o tinha expulsado da sua vida, mas também a altura era diferente. César era mais alto, maior e bem mais forte.

Precisou se convencer da verdade óbvia, mas não conseguiu evitar que seu coração esfriasse e o sentimento bom e saudoso fosse embora. Quando conseguiu firmar a vista melhor um pouco já estavam no carro, César tinha um semblante preocupado e cansado.

O enfermeiro falava alguma coisa, mas não parecia ser direcionado a ele, era como se falasse sozinho. Toni estreitou os olhos e tentou apurar os sentidos e ouvir o que outro falava.

— ...o que eu vou fazer contigo? ... Dois dias sumido... Porra... Bebendo desse jeito vai acabar entrando em coma alcoólico... O que você tem na cabeça? ...

— Cez... — chamou para mostrar que estava ouvindo.

O enfermeiro o olhou rapidamente, meio preocupado e meio aborrecido.

— Ah acordou foi? Que bonito hein seu Toni! — brigou.

— Eu... Tava acordado... — falou embolado.

— Pois não parecia! Faz ideia do que a tua mãe vai fazer com a gente?! — continuou bravo.

— Eu não quero ir para casa.

— Como se você tivesse escolha! Magnólia tá furiosa!

Toni sabia que sua mãe não estava brava de verdade, talvez preocupada. César era o único que tinha medo dela, provavelmente porque era sua sogra. Mesmo meio entorpecido abriu a porta do carro e só não caiu para fora porque estava com cinto.

UnilateralWhere stories live. Discover now