Capítulo Vinte e Seis

4.9K 608 139
                                    

O apartamento era pequeno. Tinha uma sala de estar, cozinha, banheiro social, um mini corredor, tão pequeno que nem devia ser considerado um corredor, uma suíte que com certeza era o ponto alto, era o maior cômodo do imóvel e tinha um janelão imenso numa das paredes, o vidro fosco aproveitava muito bem a claridade do dia. Também tinha uma pequena área de serviço, muito pequena mesmo, tinha um tanque de cimento acoplado na parede, ao lado dele caberia uma máquina de lavar roupa e sobrava um pouco menos de um metro apenas de espaço livre.

O piso era de uma cerâmica marrom horrível mas estava bem conservado. As paredes era pintadas de um marfim igualmente horrível e sem graça, tinha algum furos de pregos onde com certeza antes tinha alguma coisa pendurada, talvez quadros. Mas a pior parte eram os banheiros, eram todos brancos, os dois.

— O que achou? Para mim parece bom! — César foi andando pelo imóvel vazio.

— É horrível! Mas pelo menos não tem infiltrações, nem rachaduras. Os buracos de prego na parede eu posso massar e pelo que eu vi a instalação elétrica tá boa, só tem duas tomadas na cozinha que precisa trocar — foi listando os pontos altos e baixos do imóvel, caminhando até o quarto.

— O aluguel está bom para caralho você viu. A gente já viu um monte de apartamentos marrento, esse daqui não está tão ruim — argumentou o enfermeiro, abrindo o janelão do quarto.

— Mas é meio afastado cê num acha não? A gente não conhece ninguém por essas bandas.

César riu com gosto, colocando a cabeça para fora e olhando em volta.

— Isso é ótimo! Só ficamos juntos nos fins de semana e só transamos direito quando vamos para um motel de quinta. Porque na pensão ninguém dá sossego é gente batendo na porta o tempo todo. Longe de todo mundo vamos poder fuder à vontade

Toni sorriu, não conseguiu resistir, as vezes seu namorado era muito previsível.

— Que foi? Tá rindo do quê marrento? Vai me dizer que não pensou nisso! Olha nem vamos ter problemas para ir trabalhar, tem o meu carro. No dia que eu tiver plantão você me deixa no hospital e fica com o carro, e vice— versa. Dá certinho.

Toni deu uma última olhada em volta.

— Por mim tá beleza. Mas eu vou pintar tudo de cinza e arrumar cortinas blackout para essa janela ridícula.

César olhou para o janelão aberto um pouco surpreso.

— Como assim? Qual o problema da janela? Eu achei bonita, clareia bacana oh!

— Esse é o problema. A gente acorda antes do sol nascer todo dia. Tu acha mesmo que no meu dia de folga eu vou querer acordar com a claridade seis horas da manhã?

Continuaram debatendo sobre o apartamento, mas no fim acabaram assinando o contrato, afinal o mais difícil era Toni aprovar o lugar por causa da sua experiência com obras.

Não havia romantismo nem carinho excessivo nas conversas dos dois, eram práticos acima de tudo. Toni pegou uma obra nova pela firma e César precisou comprar as tintas sozinho. O moreno só pode pintar o apartamento no sábado, acabou passando o dia todo enfiado nessa empreitada apenas com a ajuda de dois dos seus colegas de trabalho, pois César estava de plantão até a noite.

No domingo o enfermeiro trouxe alguns poucos móveis do próprio quarto que usava na casa da tia adoentada. Quando contou a ela que iria sair da casa para morar sozinho, omitiu a existência de Toni na história, não queria ser xingado logo na despedida. O namorado estava terminando de trocar as tomadas da cozinha quando chegou com o guarda roupas e as mesas de cabeceira, uma mesa média com quatro cadeiras e outras poucas coisas. Quando contou ao rapaz sobre o ocorrido, Toni deu de ombros, sem dar a mínima importância ao fato, respondeu com simples "Tô nem aí. A tia é tua não minha, quero mais que ela se foda. Pega o alicate e a chave estrela para mim ali na caixa de ferramentas". As vezes a indiferença com que o rapaz lidava com tudo era chocante, mas era indiscutivelmente uma característica única.

UnilateralWhere stories live. Discover now