Narrador POV
- Hm. – Camila gemeu. – Põe outro filme, Lauren, por favor. Eu tenho medo desses filmes de terror.
- Porque eu deveria? – Arqueou uma sobrancelha, desafiando Camila.
- Por favor... – Lauren revirou os olhos. Porque ela tinha que parecer tão fofa enrolada em um edredom no sofá? Aquilo era ridículo e fazia a mulher se sentir como se pudesse se tacar na frente de um ônibus, se Camila assim pedisse. Nem chegava a ser ridículo, era quase doentio.
- Com uma condição. – Levantou um dedo e Camila assentiu. – Você tem que parar de me chamar de Lauren. Lembra-me minha mãe quando eu faço merda e ela berra do outro lado da casa "Lauren!".
- Você quer tipo... Um apelido? – Lauren assentiu. – Me deixa pensar. – A menina torceu a boca e Lauren esperou pacientemente longos segundos até que ela se pronunciasse novamente. – Lolo!
- Que?
- Lolo. É bonitinho e combina com você.
- É gay. – Lauren revirou os olhos.
- Você queria um apelido e eu te dei um. Agora troca o filme, Lolo. – Ela se rendeu, não tendo mais para onde argumentar, se levantando e indo até sua caixa de DVDs, que ela havia trazido junto com suas coisas, de San Miguel.
- De que tipo de filme você gosta? Vou logo avisando que não tenho Crepúsculo, Diário de uma Paixão, Titanic e nenhuma dessas porras melosas. – Camila riu um pouco e se encolheu um pouco no edredom. Era realmente uma noite muito fria.
- Tem algum filme sobre anjos?– Lauren estreitou os olhos.
- Anjos? Daqueles que tem asinhas pequenas e usam fraldinhas? – Camila ficou séria e Lauren caiu na gargalhada. Quantos anos ela achava que a menina tinha? Cinco?
- Não. Anjos de verdade.
- Até tenho, mas... Espero que saiba que anjos não existem. – Deu de ombros, procurando os tais filmes na caixa. Camila pareceu ficar brava por um segundo.
- Existem sim.
- É mesmo? Prova-me. – Ergueu uma sobrancelha, desafiando a mais nova, que ficou sem saber o que responder por alguns segundos antes de piorar sua expressão de raiva no rosto.
- Existem sim, que droga! – Camila parecia realmente brava e Lauren percebeu isso, preferindo não insistir nesse assunto. No fundo, ela não ligava para o fato de anjos existirem ou não, ela só queria irritar Camila, no bom sentido. Mas percebeu que a coisa começou a ficar séria e resolveu dar um fim no assunto.
- Aqui, tem Constantine, Cidade dos Anjos e Legião. – A menina torceu a boca, parecendo um pouco tímida.
- Já vi todos. – Camila abaixou o olhar, se sentindo meio culpada.
Ela era completamente fascinada por anjos e provavelmente já viu todos os filmes sobre o assunto que existiam para ver. E as séries também. Não havia nada que Lauren pudesse ter sobre anjos que ela não tivesse visto. Então se sentiu um pouco mal por ter feito a outra procurar em vão. Ainda assim, ela aceitaria ver qualquer um deles novamente.
- Podíamos ver Legião... Eu realmente gosto desse filme. – Lauren sorriu.
- Tudo bem então. – O micro-ondas apitou na cozinha, indicando que a pipoca já estava pronta.
Lauren se sentiu ridícula indo até a cozinha buscar a pipoca e o refrigerante. Havia coisa mais clichê do que assistir um filme com alguém? Provavelmente não. E era exatamente isso que a deixava apavorada. Ela não costumava fazer isso, mas pareceu não pensar em tal coisa no momento em que perguntou a Camila "Que tal assistirmos a um filme?". A outra concordou prontamente e agora ela se encontrava voltando para a sala com uma tigela de plástico em uma mão e latas de refrigerante na outra. Ridícula, como já havia se definido antes.
Sabe o que era mais ridículo? Aquela porra daquele sorriso que não conseguia sumir de seu rosto nem por um segundo. Era só Camila olhar, falar, respirar, corar, andar, pensar... Ela sentia vontade de sorrir com a menina o tempo todo e, basicamente, era aquilo que ela fazia. O que não era nada normal. No entanto, Lauren não ligava mais. Nada nela era normal perto de Camila – principalmente seus batimentos cardíacos – e ela mesma já havia realizado, naquela tarde, que não havia mais para onde fugir.
- Obrigada. – Camila sorriu, colocando uma mão para fora do edredom e pegando uma lata de refrigerante.
- Tá mesmo com tanto frio assim? – Lauren perguntou dando play no filme e se sentando perto de Camila. Exageradamente perto.
- Eu to congelando. – Um braço da mais velha passou pelo sofá, bem atrás de onde Camila estava. Camila meio que entrou em pânico silenciosamente quando se deu conta daquele fato e logo depois ela relaxou, pois, afinal, não havia nada demais naquilo. Havia?
Elas não estavam se encostando. Não até Camila se sentir levemente sonolenta lá pelos 36 minutos de filme e tombar para o lado. Sua cabeça repousou em algo macio e que possuía o cheiro de sabonete e ervas. A menina já havia sentido esse cheiro em algum lugar... Mas onde foi mesmo?
Inspirou novamente e quase teve um colapso quando percebeu onde ela estava. Camila realizou que sua cabeça confusa e cheia de maluquices estava repousada confortavelmente no ombro de Lauren como se ela tivesse feito aquilo a droga da vida toda. O que ela mais estranhou, foi que Lauren não se pronunciou, não reclamou e nem fez nenhuma piadinha. Provavelmente ela deveria estar dormindo. Então Camila levantou o olhar.
Outro erro.
Lauren lhe deu um sorriso de canto o qual Camila não fazia a mínima ideia do que significava. Ela apenas tentou controlar as batidas do seu coração e se levantar de onde estava erroneamente deitada, mas tudo o que ela conseguiu fazer foi sentir o braço da mais velha descendo e puxando a menina levemente para baixo, em um pedido mudo para que ela não saísse dali.
Camila obedeceu e, depois de mais alguns segundos em pânico, se permitiu relaxar à medida que os dedos de Lauren se enfiaram por debaixo do edredom da menina e começaram a passear para cima e para baixo, por cima da blusa de lã que Camila usava. Suspirou baixo e fechou os olhos, inspirando novamente. O cheiro dela era tão bom...
Ela se permitiu perceber o quão bem se sentia estando ali e deixar o pânico um pouco de lado, era completamente idiota da parte dela. Claro que isso nunca havia lhe acontecido antes, mas Lauren a estava deixando tão confortável que ela sentia como se tivessem feito aquilo à vida toda. [...]
Camila acordou. Não conseguiu descobrir em que momento ela dormiu, mas ela sabia que havia dormido por um bom tempo. Olhou em volta e procurou Lauren, percebendo que estava dormindo em cima de uma almofada. Sentou-se no sofá e suspirou esfregando os olhos e procurando qualquer dispositivo que lhe desse a hora. Que horas deviam ser?
- Já ia te acordar. – Lauren surgiu do nada rindo e Camila pulou de susto.
- Que horas são?
- Quase meia noite.
- Hm. – Camila se espreguiçou e Lauren se sentou ao seu lado. Ficaram um bom tempo em silêncio.
- Nossa, nunca achei que ficar em silêncio olhando para o nada fosse tão divertido. – A menina revirou os olhos.
- Idiota. – Ela riu e em seguida reparou que provavelmente Lauren devia estar entediada e com vontade de estar em qualquer outro lugar que não fosse aquela casa. A possibilidade apavorou Camila e logo ela estava abrindo a boca novamente. – O que geralmente às pessoas fazem a essa hora? – Lauren mal pensou na resposta.
- Sexo. – Camila tossiu de nervoso e Lauren caiu na risada. – Não todas as pessoas, só algumas. – Ela tinha certeza de que nunca havia visto Camila tão vermelha assim. – Ah, sei lá, quando eu fico acordada até de madrugada geralmente eu fico na internet ou não to em casa.
A menina pensou por um momento. Ela não era idiota e sabia muito bem o que era sexo. Só não achava que fosse se sentir tão estranha com essa palavra vindo da boca de Lauren e a possibilidade de Lauren gastar algumas madrugadas fazendo aquilo. Pessoas normais faziam sexo e a maioria das meninas da idade de Camila não eram mais virgens.
Era quase como se ela não quisesse que aquilo acontecesse. Como se, para ela, parecesse errado que Lauren fizesse sexo com alguma outra pessoa que não fosse... Ok, ela não pensou isso. Camila não estava pensando em Lauren e sexo na mesma frase. Ela mal sabia como se fazia aquilo com homens, muito menos com mulheres. Qual era o problema dela?
- Na internet fazendo o que? – Mudar de assunto era a melhor opção.
- Vendo vídeos pornôs. – Lauren disse como se fosse a coisa mais natural do mundo e Camila, novamente, quase morreu de vergonha e nervoso. Ela nunca tinha visto essas coisas e nunca iria ver, pelo menos não com a mentalidade que ela tinha agora. – Eu to brincando, você acredita em tudo, credo. – A menina se sentiu mais aliviada.
- Você faz umas brincadeiras muito sem graça, sabia?
- Sexo não é sem graça. – Ela deu um sorriso safado e Camila queria abrir um buraco no estofamento do sofá. Eram quase meia noite e a menina nunca costumava ficar acordada até essa hora, ainda mais com uma mulher mais velha a qual ela sentia algo o qual não conseguia explicar e muito menos conversando sobre sexo. Nada daquilo fazia sentido. Talvez ela ainda estivesse dormindo e estivesse fantasiando essa conversa. Tinha que ser isso.
- Não é como se eu soubesse como é. – Respondeu e logo quis engolir as palavras de volta, mas Lauren riu e talvez ela não tivesse falado uma merda tão grande assim. Era bem estranho como a mais velha podia provocar reações em Camila que ela nunca sentiu na vida e fazê-la se sentir tão a vontade que ela estava falando sobre uma coisa que não se permitia nem pensar direito. Deveria ser errado, mas com Lauren não era.
- E você sente vergonha disso?
- Porque sentiria? – Camila rebateu.
- Porque você tá mais vermelha do que um tomate.
- É porque eu tenho vergonha de falar de... Disso. – Camila abaixou o olhar, sentindo as bochechas queimarem violentamente.
- Camila, pelo amor de Deus. – Lauren riu. – Não tem nada errado com o sexo. Todo o mundo faz, todo o mundo já fez, todo o mundo vai fazer alguma vez na vida. Já parou para pensar que sua mãe e seu pai fizeram sexo para você nascer? Assim como meus pais fizeram e os pais de todo o mundo. Sexo é vida. Literalmente. – De tudo, Lauren não estava falando merda. Mas era um assunto que a deixava com vergonha, assim como a maioria da população. – Isso é só um tabu idiota, sabe? As pessoas são idiotas. – Camila levantou a cabeça, do nada.
- Não, as pessoas não são idiotas.
- Por quê? – Lauren arqueou uma sobrancelha.
- Porque você é idiota.
- Eu sou idiota?
- É sim. De um jeito bom... – Sorriu e encarou a almofada. – Me faz sorrir.
- Porque eu amo o seu sorriso. – Camila sorriu ainda mais e levantou o olhar somente para encontrar Lauren a encarando de uma forma extremamente intensa.
Lauren levantou a mão e correu as costas dos seus dedos levemente pela bochecha de Camila, que já havia recuperado sua tonalidade normal. Por sua vez, a menina fechou os olhos, apenas sentindo o toque por um segundo e logo em seguida os abriu, apenas para encontrar Lauren ainda mais perto. Que droga que elas estavam fazendo?
"Isso não tá certo", Lauren pensou com tristeza e afastou a mão do rosto de Camila, suspirando longamente e encarando o chão. A menina se levantou e recolheu seu edredom do sofá.
- Acho que eu vou dormir.
- Mas você acabou de acordar. – Lauren riu.
- Idiota. – Camila revirou os olhos.
- To brincando, também vou dormir. Quase caí da cama por causa da sua mãe hoje. – Elas começaram a subir as escadas juntas e logo se encontravam no meio do corredor, entre a porta do quarto de uma e de outra.
- Então é isso... – Camila falou devagar. – Boa noite, Lolo. – Lauren se aproximou antes que Camila processasse qualquer coisa e segurou seu rosto com as duas mãos, apertando os lábios na testa da mais nova. – O... O que foi isso? – Perguntou antes que pudesse engolir as palavras. Agora Lauren a acharia uma retardada, coisa que ela nunca deixou de ser.
- Um beijo de boa noite. – A mais velha deu um daqueles sorrisos capazes de fazer o coração da menina parar.
Se Lauren podia, Camila também podia. Ela apoiou uma mão em cada ombro de Lauren e ficou na ponta dos pés para que sua boca alcançasse a bochecha dela. Não foi tão curto e tímido como o beijo que ela havia lhe dado mais cedo, Camila demorou o tempo que bem entendeu ali.
- Boa noite, Lolo. – Repetiu quando se afastou.
- Sonhe com os anjos. – Lauren piscou e entrou em seu quarto.
Camila ainda ficou um tempo ali, encarando o corredor com a constatação que havia acabado de ser esfregada em seu rosto. Ela não demorou beijando a bochecha de Lauren porque não estava com vergonha de fazer aquilo. Ela só demorou porque, no fundo, estava imaginando beijar outro lugar: a sua boca.