Capítulo 7 - MK Ultra

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"Você não tem mais controle sobre seu corpo
Esses direitos não são mais seus
Você vai acordar quando dissermos pra acordar
Você vai dormir quando apagarmos as luzes
Aprecie sua estada
Porque você não pode ir embora"

Emilie Autumn - Take the pill

Estou em uma daquelas vigílias em que tudo e nada é real, em que tudo faz sentido quando não deveria fazer. Pelo menos desta vez, fico feliz em não possuir um corpo. Corpo sólido, maciço. A parede de alvenaria brilha em tons de verde e dourado enquanto escuto gritos masculinos vindos do lado de fora. É como se eu estivesse em dois lugares ao mesmo tempo.

Por que estou com medo?

Minha garganta dói, como se algo tivesse atravessado meu pescoço e corroído toda a matéria viva. A carne decomposta se arrasta dentro de mim como um verme pernicioso. A necessidade de cuspi-lo para longe me assombra, mas sei que não posso: mulheres de cabelos vermelhos ardentes disseram-me para manter a boca fechada. Do contrário, morrerei.

Já não sei o que é mais agonizante: o desejo de eliminar a pele morta ou o medo de morrer junto com ela. Cerro os lábios, cada vez mais perturbada pela ideia de que meu corpo (ou a ausência dele) traia minha vontade.

Estou em uma cela, uma cela grande, uma cela pequena que treme, convulsiona, sofre espasmos. Abre e fecha. Eu sou o espasmo. Eu sou a pústula no meio do nada. A cela tremula em meus olhos. Estou tonta, que vou cair para longe, como uma folha tragada pelo vento. Em preto e roxo. Em azul e rosa.

Em vermelho.

Vermelho sangue.

Os gritos continuam, ecos inconscientes em meio ao umbral. A porta está aberta, uma boca obscura dando para o corredor escuro e é ela quem grita e agoniza enquanto mastiga suas vítimas e bebe-lhes o sangue. Mas ela chora, chora insatisfeita, insaciável.

Ela quer a mim.

A boca vomita duas figuras diminutas. Baratas? Pedras? Estou tonta, tonta demais, tão tonta que as figuras voam ao meu redor, como em um carrossel macabro. E não! Já disse que não posso abrir a boca!

Tento concentrar-me em suas figuras, que embaçam meus olhos no momento em que as focalizo, como uma baixa impressão periférica.

Elas existem?

Logo vejo que são velhas, seus narizes aduncos curvando-se no centro dos rostos deformados, lembrando o bico de pássaros, de aves de rapina. Seus olhos esbugalhados inspiram-me um terror louco, encontrado apenas em bonecas maltrapilhas e parques de diversão antigos. Ambas possuem pântanos lodosos em vez de pele - carne verde e viscosa escorrendo como que derretida, tendo apenas robes pretos como vestes. A única coisa que as diferencia são suas vastas cabeleiras arrepiadas - uma clara e cristalina como gelo, outra inflamável e viva como fogo.

Seus olhos gigantes são capazes de engolir meu corpo inteiro, que agora estica e puxa, fora de controle. Elas riem, seus olhos riem junto, crescendo, crescendo, crescendo, bolas cintilantes e gigantescas a esmagar-me os ossos com um mero olhar. Tento gritar, mas a pele decomposta dentro de mim chegou à língua, selando meus lábios com pus e fel.

Elas riem.

Elas riem.

– Que coisinha mais interessante, Kotake! – exclama uma das velhas, que continua a girar sem parar.

– De fato, Koume! – respondeu a outra – Ela é diferente de qualquer outra criaturinha daqui.

– Vamos nos divertir muito hoje, não é mesmo, Kotake?

A Garota que Nunca ExistiuOnde as histórias ganham vida. Descobre agora