[✓]𝐂𝐨𝐫𝐭𝐞 𝐝𝐞 𝐅𝐥𝐨𝐫𝐞𝐬 𝐞𝐦 𝐂𝐡𝐚𝐦𝐚𝐬| ᶜᵃˢˢᶦᵃⁿ

Capítulo 68

❦┊ATHENA

Tropecei em meus próprios pés enquanto Wilmot me puxava para andar mais rápido. Não sei porque estamos indo andando, ele poderia simplesmente ter nos levado direto para seu prédio, mas resolveu que seria melhor uma caminhada noturna por Velaris.

— Não podemos simplesmente voltar logo? — Perguntei a ele.

— E não apreciar esta bela noite? — Apontou para o céu — Veja como está bonito.

— O que você vai ganhar com isso? — Parei de andar fazendo com que ele também parasse.

— Eu já tenho o que eu queria — Disse ele, erguendo meu queixo com o dedo indicador — Só estou apreciando minha vitória.

— Não sou seu troféu — Rosnei e ele me olhou com tédio antes de se virar e voltar a andar ignorando minha fala.

Tentei soltar meu pulso e Wilmot o apertou com mais força me enviando um olhar de aviso. Cravei minhas unhas na palma da mão me permitindo ser guiada por ele, meus pés já estavam doendo por conta dos saltos e a noite estava ficando mais fria do que o normal.

— Wilmot? — Chamei o fazendo parar e me olhar por cima do ombro, me aproximei ficando ao seu lado e consegui soltar meu pulso, meu coração falhou algumas batidas quando encarei a casa da minha mãe um pouco distante — Me deixe ir até ela.

— Como é? — Perguntou como se fosse uma audácia pedir aquilo e minhas pernas se moveram inconscientemente — Athena!

Seu tom era de aviso, só que eu não dei ouvidos e já estava andando em passos rápidos em direção a casa.

A porta está aberta, a luz da sala está piscando, a sala está fria e não tem mais aquela áurea feliz que tinha quando vim aqui pela primeira vez.

— Mãe? — Chamei por ela, por algum motivo minha voz está embriagada e eu sinto um aperto no peito, uma dor.

— Athena, vamos embora — Wilmot ordenou e eu apertei o maxilar sentindo minhas costas queimar. Ignorei a dor e fui mais além, passando pela sala, cheguei no jardim no fundo da casa.

Eu entendo a dor de uma criança que perde seus pais. Sei como é horrível e sufocante descobrir que não os verá mais, mas dói muito mais quando você vê e tem noção de que aquilo acabou de ser um assassinato. Dói de um jeito arrebatador e eu não tinha em mente que ver Ravena na beira da sua morte seria tão doloroso.

— Jasper, está tudo bem, querido — Ela falou com a voz falha tocando o rosto do garoto que chorava silenciosamente.

Me aproximei em passos lentos perdendo o fôlego ao encarar a ferida em sua barriga. Seu sangue manchando a camisola junto com um líquido preto e viscoso, sua pele está pálida, quase azul ou roxa e seus olhos estão vermelhos demais. Soltei o ar e a atenção dos dois foi voltada para mim, os olhos de Ravena brilharam em surpresa.

— Athena…

— Ele me contou — Murmurei a interrompendo e me aproximei mais devagar desviando o olhar para o garoto que me encarava atentamente e na defensiva — Ele me contou tudo.

— Me desculpe, Athena — Pediu tentando erguer a mão, me ajoelhei ao seu lado puxando o ar pelos dentes quando minhas costas doeu. Sua pele está incrivelmente gelada e a ponta dos dedos está ficando azul — Eu não queria que sofresse nas mãos dele, mas acabei te entregando para alguém ruim também.

— Poderia ter me contado — Falei piscando os olhos para espantar as lágrimas — Poderia ter contado ao meu pai.

— Eu teria botado Jasper em perigo, eu não podia — Ela chorou — No final acabei perdendo vocês dois.

— Eu estou com você agora — Sussurrei apertando sua mão e ela deu um pequeno sorriso — Mãe…

— Me desculpe — Pediu novamente — Me perdoe, Athena.

Umedeci os lábios quando ela ofegou apertando a ferida que sangrou mais forte, concordei com a cabeça freneticamente me aproximando mais.

— Eu te perdoo — Disse a ela, com a voz embriagada — Eu te perdoo, mãe. Está tudo bem.

— Eu gostaria de ter te dado uma vida… Uma vida melhor — Sussurrou e as veias do seu pescoço começaram a ficar pretas, assim como seu braço. Olhei para o garoto, Jasper, vendo que as veias dele também estavam pretas e então minha mãe suspirou em alívio.

— O que está fazendo? — Perguntei a ele e olhei para ela — O que Trigon fez com você?

— Ele está me matando — Respondeu — Mas está me punindo. Está machucando minha alma, me fazendo sofrer por… Por ter fugido com você.

— Tem algum jeito de salvá-la? Eu posso… — Ravena tocou meu rosto me fazendo parar de falar e ela negou com a cabeça — Mãe…

— Eu sabia que isso aconteceria, uma hora ou outra — Sussurrou e puxou minha nuca para perto do seu rosto — Athena, sei que não tenho o direito de te pedir nada — Começou e fez uma pausa para recuperar o fôlego, a pele do seu pescoço começou a ficar da mesma cor que seus dedos e eu sei que ela tem poucos minutos — Mas cuide dele, por favor — Ravena chorou com mais intensidade e pegou a mão do filho — Ele é seu irmão e sei que… Sei que serão bons amigos.

— Eu irei…

— Não deixe… não deixe que ele sofra, por favor — Apertei os olhos sentindo minhas lágrimas escorrerem pelo meu rosto — Eu gostaria de ter conseguido cuidar de você, de vocês dois.

— Ele irá ficar bem — Sussurrei e ela concordou — Eu prometo.

— Estou tão orgulhosa de quem você se tornou. Mesmo depois de tudo que ele fez… Você ainda brilha — Ela sorriu e eu me afastei lentamente — Eu te amo, Athena.

Engoli em seco sentindo meu peito doer e observei ela olhar para Jasper e o chamar com a mão, o garoto colou suas testas ao se aproximar e sussurrou algo do tipo “eu sinto você”, minha mãe sorriu e seus olhos começaram a se fechar lentamente.

— Você pode confiar nela, querido — Sua voz saiu em um fio e quando ela deu seu último suspiro, Jasper desabou. Suas mãos agarraram os ombros dela e ele chorou contra seu pescoço, olhei para cima segurando as lágrimas e arrumei a postura ao sentir a presença de Wilmot.

— Precisamos ir — Falei para Jasper limpando minhas lágrimas e ele ergueu a cabeça lentamente — Vai ficar tudo bem.

— Seu pai… Ele matou ela! — Grunhiu tocando o rosto dela — Ele matou ela.

— Ele não é o meu pai — Retruquei me levantando e o olhei seriamente — Meu pai morreu, foi morto assim como ela. Eu entendo sua dor, garoto, então se levante e venha comigo, a não ser que queira ficar aqui sofrendo sozinho.

— Se eu for com você, quem eu terei?

— A mim — Respondi — Eu sou sua irmã e você é minha responsabilidade a partir de agora.

Jasper ficou em silêncio e segundos depois beijou a testa de Ravena, ele deitou a cabeça dela na grama e se levantou. Minha tatuagem queimou me fazendo cerrar os punhos e olhar para Wilmot por cima do ombro.

— Vamos, agora — Grunhiu me olhando e eu voltei minha atenção a Jasper.

— Sei como se sente…

— Ela me contou sobre você e sua vida — Me interrompeu — E se ela confia em você para cuidar de mim, eu também confio — Ele andou até mim e segurou minha mão me encarando — Eu não odeio você pelo o que seu pai fez, Athena.

— Eu não disse que achava isso — Retruquei.

— Não é necessário, eu sinto — Disse me deixando em silêncio.

O corpo de Ravena começou a se transformar em uma poeira azul brilhante e voou para o céu com a ventania. Jasper e eu observamos em silêncio compartilhando da mesma dor.

— Eu também te amo, mãe — Sussurrei fechando os olhos e então me virei, puxando Jasper para fora do jardim.