CAPÍTULO 58

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Com firmes batidas, não demora muito para que Claire abra sua porta.
-Grace, oi. Achei que nos encontraríamos apenas nos carros. – Ela fala surpresa por me ver, mas me dando espaço para que entrasse em seu quarto.
-E nos encontraríamos, mas pensei em passar aqui antes e ver se precisava de algo, ou sei lá, somente te esperar.
O ponteiro do relógio marcava exatamente cinco horas da manhã. É obvio que eu havia acordado mais cedo e organizado tudo uma ultima vez, e agora, com todo esse tempo livre, resolvi aproveitar para checar Claire ou qualquer outro amigo meu antes que partíssemos.
-Está ansiosa com a viagem? – Ela pergunta presumindo o porquê da minha agitação tão cedo.
-Pra falar a verdade, estou. Mas é mais pela possibilidade de encontrarmos minha irmã, não vejo a hora de revê-la. – Admito à minha amiga.
-Eu nem imagino como deve estar sendo para você e para sua família esse momento. – Diz compassiva.
-Tivemos que aprender a lidar. – Respondo com um meio sorriso sem humor.
-Mas agora conseguiremos acha-la, e tudo voltará a ser como era antes para a sua família.
-Talvez não será como antes, mas aposto que melhorará, pelo menos por um tempo eu espero; não posso me esquecer que tenho uma guerra para travar, segundo motivo pelo qual estamos indo até April.
-Lembre-se que não estará sozinha nessa, não precisa colocar todo o peso disso em você, ok?
-Não se preocupe, minha mãe me relembra disso todos os dias. – Lhe digo e ambas sorrimos em meio a um leve e suave riso.
-Só falta eu colocar essas blusas dentro da mala. Maldita procrastinação. – Ela bufa para si mesma. – Ontem a noite fiquei enrolando para arrumar e agora tenho que terminar as pressas.
-Quer que eu vá indo? Não estou atrapalhando?
-Não, não, não se preocupe, sua companhia não me atrapalha. – Diz sorrindo abertamente e eu me sento em um poltrona bem ali, esperando-a para que juntas fossemos ao encontro dos outros.
Ao adentrarmos juntas o hall onde a entrada e a saída do palácio se localizam, fomos recebidos por nossos pais que já estavam conversando e muito bem-dispostos para o dia.
-Mãe? Não imaginei que conseguiria a ver. – Falei me aproximando da mesma e tocando em seu braço.
-Pensou mesmo que iria viajar sem se despedir de mim? Pois estava tremendamente enganada, mocinha. – Disse em meio a um sorriso travesso que tomava seu rosto, sorrio em resposta, genuinamente feliz por vê-la uma ultima vez antes de partirmos.
Juro que tentei fazer com que a despedida fosse o mais breve possível, mas como eu disse: tentei. Assim que ficamos a sós, minha mãe deu inicio ao seu sermão explicando como eu deveria ser cautelosa, agir com prudência, não me meter em confusão ou ir para algum campo de batalha. Passou mil e uma regras de etiqueta que deveriam ser seguidas e ainda fez ameaças caso eu voltasse com um mínimo corte.
Apenas assentia e dizia que faria o que disse, não seria eu quem discutira com a referida. E mesmo que ela não se convencesse de que eu cumpriria o que instruiu, fingia acreditar piamente. E assim foi a despedida com a minha mãe.
Meus irmãos estavam dormindo e decidi que não era necessário fazer estardalhaço somente por uma simples viagem que eu aposto que não durará tanto tempo.
Quando ela finalmente encerrou seu discurso e permitiu que eu, juntamente dos meus amigos que também se despediam de suas respectivas famílias, seguíssemos rumo aos carros que nos levariam até o aeroporto, o relógio marcava quase seis horas da manhã. Nem eu acreditava que eu estava tão preocupada com o horário – e sendo tão pontual – coisa que certamente não é do meu feitio.
Avançando pela sala, encontro-me com Samuel, Alicia e Claire.
-Desculpe a demora, minha fez um enorme falatório sobre a viagem e regras.
-Não se atrasou. – Samuel da de ombros como se dissesse que estava tudo bem. – Além de que ainda não iremos. – Ele acrescenta e o encaro confusa.
-O príncipe está atrasado. – Alicia ironizou.
-Falando nele... – Claire apontou com os olhos para atrás de Alicia e eu.
Felix vinha acompanhado de... Jane? Os dois riam e conversavam de forma entusiasmada. Mais atrás, os reis de Giethorn, com sua filha Jade, caminhavam sendo acompanhados de servos e mais servos que carregavam bagagens e o resto de seus pertences.
-O que eles estão fazendo aqui? – Pergunto a ninguém específico dos três, ainda encarando Felix e Jane, e os soberanos de Giethorn, é claro.
-Estão voltando para Giethorn. – Claire é quem responde.
Virei-me novamente para os meus amigos e parei de olha-los como se os observasse, o que eu claramente não fazia, e em hipótese alguma farei, afinal, estão conversando, seria estranho se eu os observasse.
-Estamos todos prontos? – Questionei mais uma vez tentando ocupar minha mente.
-Não esqueci nada. – Alicia declarou convicta.
-Poderíamos deixar nossas malas nos carros, certo? – Samuel sugeriu e eu assenti, acatando de imediato a ideia.
Nós quatro então começamos a caminhar em direção ao lado de fora do palácio, porém, algo, ou melhor, alguém, nos parou, impedindo que continuássemos o percurso até os carros.
-Ei, ei, ei, onde estão indo? – Felix questionou aproximando-se apressado, como se houvesse acabado de perder um voo.
-Estávamos indo deixar nossas coisas nos carros já que você estava ocupado. – Alicia diz direta em um leve tom de acusação.
-Foi mal, acabei encontrando a família real de Giethorn no corredor, e como estávamos todos indo na mesma direção, os acompanhei. Me distrai conversando com Jane. – Ele explica totalmente despreocupado.
-Precisamos ir, já demoramos de mais. – Disse cortando o assunto. Sem nem encarar Felix, volto-me para o caminho anterior e seguindo até um dos inúmeros carros blindados.
Sinceramente, não sei por que fiz isso.
-E Reynold? Ele não virá? – Samuel perguntou ao alcançar, fazendo com que ambos andássemos a frente dos outros.
-Ele já está nos esperando no aeroporto. Precisou organizar algumas coisas da viagem e por isso foi na frente. – Lhe respondo.
Ao chegarmos nos carros, alguns dos servos pegam nossas bagagens, colocando-as nos porta-malas enquanto adentrávamos os veículos rumo ao aeroporto.
O caminho não era demorado, e, embora estivéssemos com um comboio que protegia a rainha — eu —, não levou muito tempo para que chegássemos.
As ruas estavam vazias pelo horário, e nenhuma movimentação suspeita ocorreu.
Felix que estava no banco a minha frente trocava alguns olhares de relance comigo, mas percebi que o mesmo estava bravo, pelo menos aparentava estar; e eu também não estava no meu melhor humor.
Alicia e Claire, mesmo que de forma discreta, trocaram olhares cumplices que se direcionavam a nós. As duas conversavam apenas com gestos e, principalmente, com o olhar.
Que raios elas poderiam estar falando ao se comunicar dessa maneira?
Chegamos no mesmo aeroporto pelo qual Felix e eu havíamos sido mandados até a competição. Esse lugar tinha memorias tenebrosas e pesadas, difíceis de serem relembradas até hoje.
O lugar onde eu vi meu pai pela ultima vez...
Chacoalho a cabeça como se isso fosse me fazer parar de pensar nele, e até que resolve, bom, imagino que o real motivo por eu ter me distraído foi o fato de termos estacionado naquele instante, e não porque simplesmente mexi a cabeça como se magicamente isso pudesse afastar meus pensamentos de um certo alguém que me fazia muita, muita falta.
Outros funcionários pegaram nossas malas e, enquanto entrávamos a nave e nos arrumávamos confortavelmente, nossas coisas seriam colocadas no "porta-malas" do avião.
Uma escada foi posta e um por um entrou adentro.
-Aqui, deixa que eu te ajudo. – Samuel me estende a mão para que eu possa equilibrar-me ao adentrar o avião em segurança.
Havia um pequeno vão que separava a nave da escada, todos acabamos precisando de uma pequena ajuda para que pudéssemos atravessar tal parte, principalmente alguém como eu que usava saltos e poderia facilmente cair rumo ao chão e quebrar dois ou três ossos, ou pior...
-Eu posso ajudar a minha noiva. – Felix o corta, sua voz fria e impassível.
Ele encarava Samuel como se pudesse o matar. Fuzilava-o apenas com os olhos.
Se olhares realmente matassem... Samuel com certeza já estaria a sete palmos da terra.
Felix, embora fosse sempre descontraído e humorístico, podia ser bem intimidador. Vi isso pela primeira vez na arena, e bom, aí está ele com esse olhar matador outra vez.
Samuel não insiste, e nem é louco para o desafiar, por isso apenas sorri sem graça e segue adentro.
Estico a mão até Felix, que me segura firme e me ajuda a adentrar na aeronave como os outros que já tomavam seus respectivos assentos.
-Podemos conversar? – Ele sussurra para mim, seu olhar ainda sem qualquer traço de emoção. Concordo positivamente com um aceno de cabeça.
Seguimos para o segundo compartimento do avião, ficava a frente dos outros que estavam na traseira do jato.
Ao ficarmos sozinhos, ambos não dizemos nada, apenas nos encarávamos de forma estranha.
O mesmo, inesperadamente, suaviza sua feição, deixando que um mínimo sorriso surgisse no canto de seus lábios.
-Está brava comigo? – Ele pergunta iniciando a conversa.
-Pode ser mais específico? – Sugiro cruzando os braços na altura do peito.
-Hoje mais cedo, quando estávamos indo até os carros. – Ele explica.
-Impressão sua, eu estava normal. – Respondo.
-Fria e sem nem sequer me olhar? Acho que não estava tão normal assim. – Sua voz, que possui um leve sarcasmo, soa como uma acusação.
-Já disse, eu não estava assim, bom, eu não percebi, e se estava, não sei por quê.
-Eu sei. – Ele afirma.
-E por quê? – Pergunto irônica.
-Por causa da Jane? – Arqueia uma das sobrancelhas e eu franzo as sobrancelhas.
Ele não está sugerindo o que eu penso que está sugerindo, está?
-O quê? Não... não. – Nego com a cabeça. – Por que seria por causa dela?
-Não sei, me diz você. – Ele rebate e eu o olho entediada.
Mentiria dizendo que não fiquei incomodada, mas não me senti tão incomodada a ponto de demonstrar isso, senti?
-Bom, eu não sei sobre o que você está falando. – Digo dando de ombros ainda tentando soar indiferente.
-Eu acho que você sabe. – Ele se aproxima alguns passos.
-Não, não sei. – Asseguro mais uma vez.
-Ficou com ciúmes. – Diz simples com um sorrisinho malicioso se formando no canto de sua boca.
-Não fiquei. – Me defendi.
-Ficou sim. – Ele rebateu.
-Não fiquei.
-Ficou.
-Não fiquei.
-Posso repetir isso o dia inteiro. – Se gabou. – Afinal, você ficou com ciúmes. – Falou pausadamente o que me irritou por inteiro.
Droga.
Eu tinha ficado...
E isso era patético. Completamente ridículo!
Eu me sentia tão boba. Essa sensação é boba e extremamente torpe.
-Rá! Você ficou. Está estampado em seu belo rosto. – Disse tocando levemente em meu queixo.
-Sabe, estou começando a me lembrar o porquê que eu tentava mata-lo quando nos conhecemos. – Retruquei cínica afastando sua mão.
-Bom, pelo menos agora entende como eu fico quando te vejo com Samuel. – Se afasta novamente.
-Não acredito que fez isso por causa disso. – Observei indignada e incrédula. – Como é infantil. – Revirei os olhos, revoltada com o que ele possivelmente fez.
-Talvez. – Deu de ombros. – Mas funcionou. – Sorriu maroto.
-Não, não funcionou. – Tento contradize-lo outra vez.
-Não adianta mais tentar, Grace.
-Você quer falar sobre ciúmes? Ok. Então o que foi aquele showzinho com Samuel, hein?
-Ele estava claramente flertando com você. – Se defende como se fosse a coisa mais obvia do mundo. – Não é possível que não tenha percebido.
-Confesso que no momento não, mas concordo que ele tem se mostrado bastante prestativo.
-Prestativo? – Felix ri falsamente. – Está bem, chame do que quiser, mas depois, quando ele se declarar para você, eu direi: eu te avisei. – Afirma, seguro de que estava certo e sabia sobre tudo e todos.
-Vou voltar para o meu assento. – Declaro. – Provavelmente já irão decolar.
Estava cansada daquela conversa... discussão...?
Seja lá o que aquilo era, era idiota. Eu já havia me irritado o suficiente com tudo aquilo.
-Grace. – Felix me chama mais uma vez.
Suspiro e acabo me virando para o mesmo.
-O que é Felix? – Questiono enraivecida por todo esse drama.
-Sei que somos dois cabeças duras e sempre queremos ter a razão. – Se aproxima, mais uma vez deixando-me estranhamente nervosa com a aproximação inesperada. – E sei que pareço ridículo falando isso, mas gosto muito, muito de você, e fico assim porque não quero te perder, ok? 
-Primeiro, eu também gosto muito, muito de você. – Repito sua fala e o mesmo sorri pelo canto da boca. – Segundo, assim como você, eu não quero te perder. Terceiro, foi mal por ter ficado com ciúmes da Jane, sei que foi estupidez.
-Ah, então admite? – Observa em tom levemente arrogante, se gabando de que tinha razão.
-Deixa eu terminar? – Ele arqueia as sobrancelhas como se estivesse incrédulo por tê-lo cortado. – E quarto, você pode ficar bem tranquilo, não vai me perder. – Afirmo já sentindo minhas bochechas queimarem em pura vergonha e constrangimento.
-Já falei que gosto quando fica ruborizada? – Ele pergunta sorrindo abertamente, colocando alguns fios do meu cabelo claro atrás da minha orelha enquanto eu corava mais ainda pela afirmação e pela atitude.
Era ridiculamente inexplicável a forma que eu ficava com ele por perto. Me sentia uma tola que não sabia controlar as emoções e as aparências.
Infelizmente somos interrompidos com fortes passos se aproximando.
-E aí pombinhos? – Alicia aparece com um sorriso ladino, nos afastamos em um pulo, assustamos por sua intromissão.
Obrigada Alicia
-Já se entenderam? Ótimo, agora vão logo para os seus assentos, o piloto já quer decolar. – Diz antes que tenhamos qualquer segundo para responder ou entender o que dizia. – Parem de enrolar e vamos. – Nos apressa sem paciência alguma.
Felix e eu nos entreolhamos outra vez antes de a seguirmos e tomarmos nossos relativos assentos.
Ao entrar no compartimento, percebo apenas naquele momento que minha secretaria, Tiffany, e Reynold estavam presentes; estava mesmo sentindo falta dos dois, mas supus que já estariam presentes levando em conta a organização e a pontualidade que ambos possuem.
Acenei discretamente para os dois apenas para que ficássemos cientes da presença um dos outros, rapidamente voltando a atenção ao cinto de segurança que eu colocava para que pudéssemos finalmente decolar e seguir o rumo até a base April. Lugar onde toda a ação acontecia, e onde, provavelmente, viveríamos muitas aventuras.
Que todos esses militares nos aguardem.




Que todos esses militares nos aguardem

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O Preço da CoroaWhere stories live. Discover now