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O dia de hoje foi completamente pacata. E até mesmo agora, já a noite, não havia nada para fazer.
Nada, absolutamente nada de novo aconteceu. Bom, eu continuo caminhando para voltar ao normal, mas tirando isso fizemos praticamente nada.
Não encontrávamos nem mais assuntos para conversar. Já havíamos passado tanto tempo juntos, nos conhecendo e nos tornando amigos, que eu não tenho mais nada a revelar. Porém, uma notícia que me dei conta só agora, salvou todo o dia. Hoje é o último dia que teremos que ficar aqui. Claire, pelo menos na última vez, disse que eu precisaria de apenas quatro dias, e bom, hoje é o quarto dia, no caso sexto, mas enfim. O ponto é: amanhã estaremos "libertos" novamente e poderemos seguir. Quero acabar com tudo isso o mais rápido possível e ganhar essa maldita guerra.
-A lenha acabou, vou pegar mais. – Claire disse se levantando.
Todas as noites fazíamos uma fogueira para nos aquecer.
-Não, deixa que eu vou. – Falei a parando ao tocar seu ombro, a mesma fez cara feia. – Por favor, eu estou bem, vocês sabem. E eu preciso me exercitar para voltar ao normal. – Argumentei torcendo para que desse certo e a mesma bufou e revirou os olhos.
-Está bem. – Disse ainda de braços cruzados, irritada por estar concordando com isso.
-Vou com você. – Samuel anuncia e eu assinto, mesmo que não tenha perguntado. – É melhor nunca sairmos sozinhos. – Diz ao resto que concorda.
Eu e ele seguimos pelo mesmo caminho descendo até o riacho para procurar alguns gravetos que serviriam de lenha para a fogueira que já se apagava.
-É melhor irmos um pouco adentro da floresta. A os gravetos daqui estão muito úmidos. – Ele diz segurando graveto e depois soltando no chão.
-Pode ser. – Disse já andando, o mesmo veio ao meu alcance, apertando o passo e entrando no meu ritmo.
Fomos andando enquanto pegávamos alguns gravetos no chão.
-Acho que aqui não é o melhor lugar para o meu poder se desenvolver. – Lhe respondo. Conversávamos sobre como usávamos nossas habilidades, coisa fáceis e difíceis de fazer.
-É talvez algum lugar com mais eletricidade seria melhor, não? – Sugere com um sorriso de canto e eu acabo rindo.
-Mas para você está ótimo. Tipo, seu poder não se abala por esse ambiente, certo?
-Sim, minha habilidade, felizmente, é bem versátil.
-Pode me mostrar alguma coisa? Nunca o vi usando suas habilidades. – Peço.
-Claro. – Responde com um sorriso leve dando de ombros. – Vamos ver... – Ele olha para cima pensando em algo. – Ah, já sei. – Volta seu olhar para mim.
Da sua mão, inexplicavelmente começa a se moldar um ferro. Não entendo o formato nem o que tenta fazer no início, mas então começo a reconhecer e a entender o que fazia. Tudo isso aconteceu muito rápido, mas para mim foi como se estivesse em câmera lenta.
-Prontinho. – Me entrega a adaga. – Elas são a minha especialidade. – Diz e enquanto eu admiro o objeto pontiagudo em minhas mãos. – Treinei a vida toda para aprender faze-las de modo rápido, eficiente, e é claro mortal. Consigo cria-las e atira-las em uma fração de segundos.
-Isso é incrível. – Lhe digo.
-Pode ficar, sei faze-las quando quiser. – Diz e eu assinto sorrindo para o mesmo. – Ah, e tome cuidado, ela é de dois gumes. – Avisa e eu assinto, não que eu não tivesse percebido antes. Entendo bem de facas, treinava tiro ao alvo com várias delas junto de Reynold.
-Obrigada. – Digo me referindo a adaga que ele me deu.
-Um presente para se lembrar do nosso tempo como aliados dentro dessa ilha maldita. – Ele sorriu docilmente e eu retribuí.
-Vamos continuar? Já demoramos bastante e daqui a pouco vão achar que fomos atacados. – Disse rindo nasalmente ao pensar em Claire surtando, Felix sem saber como lidar com ela e acabando surtando junto.
-É, sei como Claire ficaria. – Diz fingindo ter calafrios o que me faz rir mais uma vez.
-Vocês são mesmo como irmãos, não são?
-Sim, meu pai é o primeiro-ministro e sempre estivemos juntos, além de que a mãe da Claire praticamente me adotou depois que a minha morreu, elas eram grandes amigas na adolescência. – Disse agachando-se novamente.
-Sinto muito. – Falei abaixando a cabeça surpresa pela revelação.
Há uma pausa. Um silencio repentino desconfortável.
-Tudo bem, foi a muitos anos. – Diz dando de ombros ao se levantar. – Continuando. Quando meu pai ia para sua viagens devido aos deveres do reino, eu sempre ficava no palácio. Claire e eu treinamos juntos, fomos educados juntos então sim, somos basicamente irmãos.
-Eu tenho um irmão mais novo de 17 anos e uma prima de 21, sei como é legal ter alguém como igual na família. Alguém que você pode se abrir e aproveitar a vida juntos por serem muito parecidos. – Falei e ambos continuamos nosso trabalho.
Não demorou muitos minutos para que voltássemos a gruta, onde encontramos Felix e Claire discutindo sobre algo.
-Chegamos. – Samuel declarou o que os fez se calar no exato momento.
-Sobre o que discutiam? – Pergunto deixando toda a madeira que tínhamos no chão.
-Sobre se íamos ou não atrás de vocês. – Claire respondeu cruzando os braços nervosa.
-E por quê? – Arqueei uma das sobrancelhas intrigada.
-Porque estavam demorando de mais, ora. – Felix respondeu dessa vez. – Aconteceu algo? – Indagou já colocando os gravetos juntos, pronto para incendiá-los.
-Não. Apenas tivemos que nos afastar. Os gravetos estavam muito úmidos devido ao riacho. – Apressei-me a explicar. – E ficamos conversando, perdemos a noção do tempo. – Acrescentei sentando-me no chão frio da gruta.
-Eu te falei que nada teria acontecido. – Claire se voltou para Felix.
-E como eu saberia? – Retrucou.
-Estava claro que nada aconteceria. – Ela rebate.
-Estamos em uma ilha, no meio do nada, com o único objetivo de matar uns aos outros. Acha que aqui é um bom lugar para abaixar a guarda? – Ele questiona irritado e Claire se calou, recuando com a aspereza de suas palavras. – Não estamos de férias, não estamos explorando uma região. Não podemos nos acostumar com a calmaria, porque, vocês sabem disso, a tempestade logo vai chegar. – Pausa e olha rapidamente ao redor. – Estamos em um jogo. Um maldito jogo onde somos controlados. Um jogo de sobrevivência no qual o prêmio é sair com vida. – Continua, o peito subindo e descendo pela respiração descompassada, com certeza estava zangado. – Então acho que a minha preocupação com as nossas duplas foi totalmente tolerável. – Por fim fala.
-Desculpa, Felix. Eu... eu não tinha pensado assim. – Claire diz baixinho ao sentir o pesar das palavras do meu parceiro, seus braços cruzados na altura do peito.
Samuel e eu assistíamos atentamente a discussão, ambos calados, não ousaríamos interferir.
As palavras de Felix perfuram meus pensamentos. Estamos mesmo em um jogo. Nossas vidas estão em jogo.
-Eu vou até o riacho. – Ele diz e antes que qualquer um diga qualquer coisa, ele passa por Samuel e eu, saindo direto da gruta.
Claire olha para mim, como se buscasse uma resposta sobre o que fazer, sabia que Felix estava nervoso.
-Eu vou falar com ele. – Digo a eles, mais a Claire do que Samuel, e ela assente sorrindo fraco. Me direciono ao mesmo caminho que Felix seguiu.
Ele se encontrava na frente da cachoeira, em pé, nitidamente irritado, ou preocupado, acho que a segunda opção. Os braços cruzados, mandíbula travada e músculos tensos. Talvez, de todos nós, é ele quem mais está realmente nervoso com tudo isso. Quero dizer, todos estamos, e muito, tanto que não sou capaz de descrever. Mas Felix está preocupado com a nossa sobrevivência, e ele, em nenhum momento tem conseguido descansar. Sempre querendo ficar de vigia durante a noite, sempre pronto, de prontidão para qualquer ameaça, sempre em alerta. E isso está o destruindo, é perceptível. E a pior parte é que ele não conversa, se abre, com ninguém. Já havia notado que detesta falar sobre seus sentimentos, não que eu seja super aberta, mas se houver alguém que seja de minha total confiança, serei mais aberta a conversar, a desabafar. Já ele? Nem comigo, a pessoa mais próxima dele aqui, ele conversa. Agora sou eu quem está ficando preocupada com ele.
-Felix... – Falo me aproximando do mesmo.
-Grace? – Vira-se bruscamente, mas então suspira ao notar que era eu. -
É disso que eu estou falando. Ele sempre, em todo momento, sempre em alerta.

O Preço da CoroaWhere stories live. Discover now