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Na noite passada, após nossa chegada, havíamos jantado no refeitório. Havia poucas pessoas, mas das que estavam lá, reconheci duas em específico, Damian II e Charlie, são irmãos, os herdeiros de Northshire, as pessoas que são o meu principal foco aqui. Damian, o mais velho, tem o mesmo nome do pai, e, acho que isso já ficou claro, é o herdeiro. Charlie, dois anos mais novo que o irmão, é da minha idade. Os dois são corpulentos e grotescos, porém não me intimidam. Apenas dois idiotas se achando os reis do mundo.
Felix os encarava como se pudesse os matar com o olhar, e os dois retribuíam. Apenas quando Reynold começou falar, foi que ele desviou o olhar da mesa dos herdeiros de Northshire. Parece que Felix é mais cabeça quente do que eu imaginava.
Hoje acordamos cedo e nos encontramos com Reynold para nos direcionarmos a área de treino.
Não era uma arena muito diferente da que temos no palácio. Porém era divida em setores para que os participantes não tivessem a "sorte" de se encontrarem.
Almoçamos em nossos apartamento enquanto Reynold fazia praticamente uma tese sobre as novas táticas de treino que usaríamos a partir de agora.
À tarde, tivemos um período de descanso, porém terminou rápido como um raio, voltamos para os treinos.
Durante uma das pausas, sentei-me em um banco que havia na arena de treinos e tentei recuperar o folego para continuar lidando com tudo o que estaria por vir.
-Oi. – Uma garota ruiva, não parecia ser tão mais velha que Ashley, senta-se ao meu lado.
-Oi...? – Falo com um sorriso tímido, não que eu fosse do tipo introvertida, mas é que aqui não é o melhor lugar para fazermos amigos, se é que me entendem...
-Eu amei o seu cabelo. A cor é natural? – A menina pergunta descontraída.
-É sim, obrigada. – Agradeci gentil, contudo, ainda não entendendo o que ela fazia ali conversando comigo. Se ela for de qualquer outro reino não aliado ao meu terei que, quando chegar o momento, a matar. E aposto que se a conhecer o suficiente, não conseguirei o fazer.
-Sabe, eu já te vi na televisão e em várias entrevistas, mas você é muito mais bonita pessoalmente. – Diz com um sorriso inocente. – Inclusive, eu te admiro muito. – Fala, dessa vez, um pouco corada.
-Ah... obrigada.
-E as suas habilidades? São incríveis! Você as controla como ninguém. – Diz animando-se. – As minhas são chatas, não serve para nada. – Fala cruzando os braços, desapontada consigo mesma.
-Qual a sua habilidade? – Pergunto curiosa já levando aquela conversa adiante.
-Controlo a natureza, tudo o que tem haver com a flora, sabe? Desnecessário, não?
-Não. Seu poder é tão incrível quanto o meu. Tem noção de quão extraordinário é o que você pode fazer? – Falei tentando mudar sua opinião sobre si mesma.
Seu poder é fantástico! Eu nunca havia conhecido alguém com essa habilidade.
-Mas ele é meio inútil. Quando eu tiver que usa-lo na arena, digo. – Ela argumenta.
-Não se subestime. Esse é o primeiro passo para o fracasso. – Tentei a encorajar. – Você não elogiou a minha habilidade? – Ela assentiu. – E se eu te disser que houve uma época que eu não gostava dela. – Seu queixo caiu. – É sério. Eu me achava inútil e tinha em minha mente de que não era bom o suficiente. E hoje em dia? Consigo fazer coisas espetaculares. Por isso, não caia nessa armadilha de se inferiorizar. – Falo a ela e vejo sues olhos brilhando, acho que ninguém lhe disse isso de forma tão explicita.
-Obrigada Grace, de verdade. – Falou tocando de leve em minha mão. – Isso me ajudou muito.
-Quantos anos tem? – Perguntei a ela.
-16. – Respondeu.
-Você me lembra minha irmã mais nova, ela é alguns anos mais nova. – Disse um pouco aleatória, mas ela sorriu sem mostrar os dentes enquanto comprimia os lábios.
-Ah, e eu me chamo Alexia. – Falou de forma mais formal.
-Prazer, Alexia. – Retribuo o cumprimento.
-Bom, acho melhor eu voltar para o treino. Minha treinadora pega pesado. – Falou arregalando os olhos.
-Pode acreditar, eu entendo. – Rimos juntas.
-Não quero tomar muito do seu tempo também, acho que tem tanto treino quanto eu. – Ela se levantou e eu fiz, subitamente, o mesmo. – Espero que possamos ser aliadas. – Ela sorriu novamente. Ela tinha um belo sorriso, ainda demonstrava a inocência e a ingenuidade da infância. O que apertou o meu coração. Se eu, que já sou adulta, estou apavorada com tudo isso, imagina ela? Que não faz muito tempo que deixou a infância. – De qualquer jeito, foi um prazer conhece-la pessoalmente, espero que nos encontremos mais vezes. – Falou e demos um aperto de mãos. – Até mais. – Falou por fim e se retirou.
-O que foi isso? – Escuto uma voz atrás de mim e vejo Felix.
-Estava nos observando? – Questionei com um sorriso de canto.
-Talvez. – Responde sugestivo.
-Acho que eu fiz uma amiga. – Respondi a sua primeira pergunta.
-Grace, você sabe-. – O corto antes que possa terminar.
-Sim, eu sei que se ela não for aliada provavelmente terei de mata-la, e se não for eu, outro fará. – Continuo o que ele provavelmente falaria. – Mas, se ela for do nosso lado, poderíamos ser aliados e não ter que nos matar, certo? – Acrescento.
-Acredito que sim. – Ele responde. – Eu conversei com Reynold sobre isso mais cedo, e tem um pequeno problema, talvez essa aliança seja falsa. Apenas para que no final possa mata-la pelas costas, entende? – Assinto com a cabeça pensando na hipótese.
Alexia com certeza não faria isso. Eu percebi, mesmo que por pouco tempo, um pouco de seu caráter. Ela não faria isso... faria?
Estamos em guerra, não conheço essas pessoas e não posso confiar nelas. "Não tenha dó. Seja individualista. Vença. Sobreviva. Isso é uma guerra. Todos traem, principalmente em situações como a nossa.
Lembro-me das palavras do meu tio, talvez ele tenha razão... de qualquer forma, é melhor ficar alerta a tudo e a todos. Isso é algo que eu certamente farei.
-Olha só quem está aqui, Charlie. – Uma voz masculina é soada perto de Felix e eu, o que faz com que nos viremos imediatamente para a pessoa.
-Parece que eles já estão cansados do treino, Damian. – O irmão mais novo fala rindo com o mais velho. – Precisaram até descansar, e olha que não se passaram nem uma hora de treino.
Reviro os olhos para os dois.
-E vocês? O que fazem aqui? – Questiono sem conseguir me segurar e os dois voltam seus olhares para mim.
-Não lhe devemos explicação. – Damian diz com desprezo.
-Estão descansando, ou... ah não, não seria possível. – Falo cínica e posso ver o olhar de Felix queimar sobre mim, assim como os dos dois homens a minha frente, e mesmo assim, mantenho a postura serena e calma que adotei desde o início dessa conversa.
-O que quer dizer? – Charlie questiona começando a se enraivecer.
-Eu não quis dizer nada, só foi uma ideia que passou pela minha mente. – Dou de ombros.
-Que foi...? – Ele me estimula a dizer de uma vez.
-Sinto que estão obcecados por nós, acertei? Suas vidas são assim tão sem graça pra cuidarem das nossas? – Debochei "levemente" dos irmãos o que fez suas expressões mudarem e Felix enrijecer o corpo, estávamos todos em alerta, qualquer movimento brusco poderia ser fatal.
-A princesinha sabe discutir? Que novidade... achei que só servisse para bordar e fazer acordos políticos. – Damian retrucou falando a parte final virado para Felix.
Era fato que, provavelmente, todos os reinos, principalmente Northshire, perceberam que o nosso casamento era puramente política e estratégia para vencermos essa guerra.
-Quer que eu te mostre o que mais posso fazer...? – Indago com um sorriso de canto e uma sobrancelha arqueada enquanto vou me aproximando pronta lançar uma descarga elétrica em ambos.
Seria uma imensa satisfação acabar com os dois, bem aqui e agora. Contudo, como um estraga prazeres, Felix me segura, fazendo com que eu volte para o seu lado, distante dos irmãos.
-Felix...? – O questiono sussurrando para que me deixasse enfrentar aqueles dois.
O mesmo apenas nega com a cabeça e vira-se para os herdeiros de Northshire.
-Olha, eu vou ser bem claro pra ter que falar só uma vez. Calem a boca e voltem para o treino de vocês, parece que precisam mais do que nós. – Meu aparente noivo diz com tom firme e autoritário para aqueles irmãos que agora continham os maxilares e a mandíbula travados, demonstrando a irritação que sentiam por nós dois naquele momento.
-Só viemos parabenizar o casal. Estão noivos, não? – Charlie se explica com um fingimento cínico.
-Obrigado, agora precisamos voltar. – Felix fala por fim direto, já querendo cortar aquele assunto que poderia acabar muito mal. – Vamos, Grace. – Ele fala esperando que eu vá na frente.
Confesso que a tentação de irritar esses dois príncipes prepotentes era grande e atraente, mas ao ver a feição de Felix, percebi quão má ideia seria, além da infantilidade e irresponsabilidade da situação. Assenti e segui até a nossa área de treinos, mas antes de entrarmos sinto meu braço sendo puxado, não com muita força.
-Grace, o que foi aquilo? – Felix questiona irritado.
-Desculpe, eu só falei, foi sem pensar. – Respondo vendo a idiotice que eu fiz, o mesmo ainda me fitava.
-É, deu pra perceber. – Ele replica o que me faz revirar os olhos.
-Foi mal, eu sei que deveria ter me mantido calada. – Cruzei os braços. – E você também retrucou no final.
-Eu tentei acabar com aquela discussão idiota. – Explica um tanto nervoso, mas então respira fundo e se volta novamente para mim. – Só... só tenta não se meter em confusão, ok? – Ele aconselha e eu assinto. – Já teremos muitos problemas quando entrarmos na competição, se tivermos aqui será só mais dor de cabeça. – Concordo mais uma vez sem poder discutir contra isso.
Assim, entramos para mais serie de treinamentos intermináveis.
No jantar, fomos ao refeitório, que estava consideravelmente cheio se comparado ao dia anterior, mas não creio que todos os participantes estejam presentes.
Quarta-feira, aconteceu, literalmente a mesma coisa. Tínhamos a mesma rotina do palácio. Estávamos fazendo a mesma coisa a praticamente duas semanas, contando com essa.
Treinar. Treinar. Treinar. Treinar. Treinar. Treinar.
Era tudo o que se passava em minha mente agora.
Pelo menos, eu não pensava muito em casa, ou nas pessoas que eu amo. O treinamento contribuiu positivamente para isso, deixando-me distraída de todas as coisas na maior parte do tempo. Durante a noite, dormia tão profundamente, após o esgotamento dia, que não conseguia sequer sonhar, ou não me lembrava dos sonhos. Quinta-feira foi a mesma rotina.
Durante o jantar da Sexta-feira, no qual estávamos no refeitório, Alexia me procurou mais uma vez, sentando-se comigo no final do jantar para conversarmos.
-Aquele ali é o Ben, Benjamin, na verdade, mas sempre o chamamos de Ben, ele é meu melhor amigo desde sempre, filho de pessoas importantes do parlamento do meu reino, também tem 16 anos, e é o meu parceiro. – Ela falou apontando para um garoto muito parecido com ela, cabelos ruivo, aparentemente alto e esguio, o formato do rosto também era parecido, os dois tinham olhos escuros, a cor se aproximava do preto. – Ao lado dele estão alguns dos nossos aliados. – Ela informou, continuando a conversa que já era estendida por mais de dez minutos.
-Formaram aliados? – Perguntei olhando de soslaio para Felix e Reynold que comiam quietos apenas observando e escutando a minha conversa com a garota.
-Sim, aquelas são gêmeas, acho que da para perceber, são Jade e Jane, tem a sua idade. São ótimas com suas habilidades, embora sejam as mesmas. – Fala também apontando para as meninas.
-Alexia, sabe o outro dia quando você falou sobre sermos aliadas? – Ela assente. – Então, acho que seria uma boa ideia. – Falei sorrindo no final, mas pude ver a expressão de surpresa e choque no rosto de Reynold e Felix.
-Isso é sério? Você quer ser a minha aliada? – Apontou para mim com o indicador e depois para si mesma, ainda maravilhada por tal fato.
-Quero sim. – Assenti.
-Não irá se arrepender, eu prometo. – Ela fala extasiada. – Se quiser, posso te apresentar aos meus aliados, assim poderemos todos nos ajudar quando estivermos na arena. – Ela sugere deslumbrada com a possibilidade.
-Claro, seria ótimo. – Falo sorrindo com os lábios comprimidos.
-Está bem, pode ir até a minha mesa, conversarei com eles, claro que aceitarão, sabe como você e o seu parceiro são poderosos e são por quem estamos lutando nessa competição. O que nos faz querer sermos seus aliados mais ainda. – Ela fala mordiscando o lábios inferior. – Bom, eu já volto. – Ela se retirou e então me voltei para Felix e Reynold ainda atônitos com a minha declaração.
-O que? – Questiono os dois.
-Tem certeza sobre isso? Sobre esses aliados? – Reynold pergunta hesitante.
-Tenho. Viu como ela falou? Eles estão se arriscando por nossa causa, pelo nosso reino. São nossos aliados. – Observo e os dois parecem começar a compreender.
-Acho melhor ir até ela e fazer mais aliados então. – Felix sugere.
-Eu? Por que você não vai? Estamos invertendo os papeis. Você é o simpático carismático. – Constato.
-Mas é você que tem encantado as pessoas. – Ruborizo com a sua fala. – Ou seja, é melhor que você vá. – Ele fala por fim com um olhar penetrante e seu sorriso de canto, aposto que fiquei o encarando como uma boba.
-Que seja. – Disse conseguindo me desvencilhar e seguir para a mesa de Alexia.
Estava um pouco nervosa, mas deixei isso de lado e fui falar com todos eles de uma vez por todas.
Alexia me apresentou a eles e então começou a apresentar cada um para mim. Primeiro, as gêmeas, dessa vez pessoalmente. Eram duas garotas quase albinas, uma beleza peculiar e diferente da que estava acostumada a ver em meu arredor, porém, não deixava de ser impressionante.
Ela me apresentou, então, Ben, que pelo visto é totalmente o contrário da amiga, tímido e introvertido, apertou de leve a minha mãe e continuou a jantar.
E, por último, fui apresentada a Samuel e Claire, ambos tinham a idade de Felix e Daphne, não tinham nenhum nível de parentesco, mas pelo o que eu pude observar, forma criados juntos como irmãos, provavelmente. As gêmeas são de um reino que também faz divisa com Hallstatt, como o meu, seu reino é Giethorn; Ben e Alexia são de Clivertown, que é localizada no extremo sul de outro continente; já Samuel e Claire eram de Monte Bello, apenas o mar dividia nossos territórios. E também eram os mais próximos de nós. Claro, eu conhecia todos os reinos, já havia estudado sobre eles, e sabia que eram nossos aliados, meu pai já havia os citado diversas vezes em reuniões.
Todos foram muito gentis e simpáticos comigo, conversamos abertamente e até algumas risadas foram soltas da roda. Concluo que essas pessoas não são do tipo que nos trairiam, porém nunca se sabe. Não darei a eles minha confiança tão fácil, por enquanto os observarei, e quanto foram dignos, confiarei neles, não 100%, mas pelo menos terão meu respeito.
Quando voltei para minha mesa estava com seis aliados, fiquei orgulhosa de mim mesma, havia sido um grande avanço.
-Como foi? – Reynold perguntou direto no seu objetivo.
-Conseguimos seis aliados. – Respondi.
-Quais são os reinos? – Ele pergunta cauteloso novamente.
-Monte Bello, Giethorn e Clivertown. – Respondo novamente.
-São reinos confiáveis, mas veremos quais são suas reais intenções, nunca se sabe. – Ele fala alertando-nos e absorvo suas palavras. Ele tem total razão, a palavra deles não me vale nada até que a cumpram.
É melhor que eu não crie expectativas quanto a eles...
-Bom minhas jovens Altezas, já subirei, preciso preparar minhas malas. Partirei hoje pela madrugada. – Reynold nos informa.
-Já? – Questiono um pouco surpresa e triste, ele é o nosso último contato com o "exterior", com alguém da nossa vida normal.
-Eles querem que vocês fiquem totalmente reclusos do mundo antes de entrar naquela arena. – Ele explica.
-Subiremos com você. – Felix fala me olhando de relance e assinto para o mesmo.
Nós três subimos e fomos nos despedir de Reynold, afinal, provavelmente estaríamos dormindo no momento de sua partida.
-Obrigado por tudo, Reynold. – Felix falou ao homem mais velho antes que entrasse em seu quarto para arrumar as malas.
-Foi uma honra Alteza. – Disse para Felix.
-Adeus, Reynold. – O abracei fortemente. Ele seria a última pessoa que eu teria contato além de Felix.
-Estarei torcendo e orando por vocês. – Falou e nos desvencilhamos do abraço. – Lembrem-se de tudo que lhes ensinei. Não sejam impulsivos, pensem, montem estratégias. Procurem água, depois comida, e por último um abrigo. Não percam tempo procurando seus aliados, a não ser que seja de suma importância. Não se separem. Sejam frios, calculistas, não tenham piedade. Ataquem primeiro. – Essa última frase me lembrou de Marli, que me disse algo parecido antes da minha partida.
Eu e Felix ouvimos atentamente suas sabias palavras, elas seriam extremamente necessárias e eficazes a partir do momento em que pisássemos naquela arena.
-Bom, boa noite aos dois, descansem o máximo que puderem já que não terão mais treinos nos próximos dois dias. – Ele nos instrui. – Até breve. – Fala e, embora não quisesse, soou com um ar de esperança. Espero mesmo que nos vejamos em breve.







 Espero mesmo que nos vejamos em breve

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O Preço da CoroaWhere stories live. Discover now