Orgulhosos e livres - I

109 11 4
                                    

Tokalah lutou o quanto pode conta a correnteza, mas a dor lascerante causada pelo disparo e a constante perda de sangue o impossibitilavam de nadar. Sentiu a água entrar pela sua boca e por mais que tentasse manter-se sobre a água não demorou muito pra que sua mente se perdesse em meio ao fluxo do rio.
Quando despertou novamente sentiu seu corpo sendo arrastado e vozes estranhas conversavam entusiasmadas em seu entorno. Na próxima vez que despertou sentiu o cheiro forte de esterco, haviam cordas em seus punhos e uma corrente grossa em sua perna, seu corpo demasiadamente dolorido e exausto para que tentasse qualquer coisa.

O líder Mandan oscilava entre momentos de consciência e total escuridão, conseguia lembrar da discussão com Navalha do disparo, da luta que teve com ele, depois disso apenas a água. Não conseguia mensurar quanto tempo havia passado ou tinha qualquer ideia de onde estava. Sentia sede e frio, embora seu corpo queimasse devido a febre, vez ou outra era despertado com um puxão nos cabelos que lhe erguia a cabeça e um gosto amargo preenchia a boca.
No terceiro dia conseguiu finalmente recobrar a consciência, o corpo ainda estava extremamente dolorido e a ferida do disparo havia sido cauterizada e agora uma queimadura ardia sobre seu ombro esquerdo.  Ao seu redor haviam baias com cavalos, porcos e a frente viu mais dois homens, um  e um garoto indígena extremamente sujo e maltrapilho, que devia ter a idade de Enepay, ambos amarrados com correntes nos tornozelos.

—  Bem vindo ao inferno pele vermelha — Disse o preto empurrando uma cumbuca com uma papa feita de farinha e água.

Tokalah  voltou seu olhar ao nativo e perguntou-lhe na língua comum a que nação pertencia.

— Lakota, mas faz algum tempo. Estiveram na nossa aldeia, disseram ao meu pai que nos ensinaram a ser civilizados. Levaram as crianças pra uma escola, nos deram novos nomes, mas eu não queria. Eu fuji, estava tentando voltar pra casa, mas o senhor Burt me achou e me trouxe pra cá. Trabalhar pra ele e procurar as pedras amarelas.

— Já disse que se chamam pepitas, garoto burro. — o preto ralhou — O senhor Burt é um grande filho da puta, nos obriga a trabalhar até não aguentarmos mais e quando caímos de cansaço, trabalhamos mais um pouco porque senão ele fica zangado e você não vai querer ver o senhor Burt zangado. Sou Zacarias e esse moleque aqui é o Wallace.

— Hantaywee — Corrigiu o garoto — meu nome.

— E o seu? — Zacarias interrogou.

— Tokalah. Onde estou?

— É uma fazenda. E eles vão te dar um nome novo, não gostam desses nomes pagãos — o preto respondeu.

— Perto de Little Big Horn? — Tokalah questionou.

— Nem tanto, mas te acharam no rio, acho que você veio com a correnteza de presente pro senhor Burt. Estava na batalha que todos andam falando? Quantos bons soldados brancos você matou? — questionou com um sorriso empolgado e Tokalah ficou em silêncio, ajeitando as costas contra a madeira. —  Já vi que não é de conversa, melhor comer, porque se já pode ficar em pé amanhã senhor Burt vai te por pra trabalha.

Tokalah passou a noite em claro, tentando inutilmente soltar-se da corrente que o prendia a um gancho preso um pedaço de ferro fincado ao chão.

— Acordem seus preguiçosos! Anda, levantem! — Um homem vestido com um chapéu largo, cabelos louro escuro e um proeminente bigode batia com um pedaço de ferro ao portão da baia onde estavam — Olha vejam só, meu novo empregado finalmente está desperto. Fala a minha língua? Consegue me entender? — Questionou o homem a Tokalah que permaneceu em silêncio. — Wallace, consegue falar com o grandão ali? — Ele questionou o garoto que balançou negativamente a cabeça.

— Ele fala sim senhor Burt, falou com a gente ontem a noite — disse Zacarias e Burt abriu o portão adentrando a baia.

— Então ele só não quer falar comigo — disse batendo o pedaço de ferro na palma da mão — virou-se para o garoto e acertou-lhe as pernas com a barra fazendo o menino se contorcer — Isso é por ser um mentiroso e você? Você tem olhos de uma fera assassina, um selvagem em seu estado natural —  ele disse tocando o rosto dele com a ponta da barra de ferro — Eu vou te explicar as regras que são muito simples, salvei sua vida, agora você me deve. Então vai trabalhar pra pagar, se tentar fugir eu não vou bater em você, mas sim nos seus dois amigos aqui, se um deles tentar fugir, quem apanha é os outros que não tentaram. Se não trabalhar, não vai comer, se me desrespeitar eu vou bater em você, se tentar me roubar eu corto sua mão fora, se olhar pra minha mulher ou minhas filhas eu arranco seus olhos, estamos entendidos?
Aqui tem roupas, somos uma família descente e agora se chama Carl, um bom nome. — falou lançando um saco na direção dele e Tokalah permaneceu em silêncio encarando-o.— Não vai dizer nada.

A filha do General - EM ANDAMENTOWhere stories live. Discover now