Capítulo 14

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Narrado por Zahara

Depois de cinco dias na estrada chegamos em Arthland, a cidade que marca o meio do caminho.

— Não quero que mate ninguém nessa cidade. Nem sequer pense nisso. — Digo a Azrael conforme passamos pelo portão de Arthland.

— Você é tão sem graça. — Ele diz.

— Sem graça vai ser ter guardas reais nos perseguindo e nos acusando de bruxaria. —

— Tecnicamente, o fato de eu ser um demônio é pior que isso. — Ele fala, se vangloriando de sua espécie.

— Mas ninguém precisa saber disso. As coisas são diferentes aqui Azrael. Essa é uma das maiores cidades do reino. Há pessoas poderosas aqui. Que se soubessem o que eu sou, me venderiam. — Explico.

Nós descemos de nossos cavalos e o amarramos frente a uma taverna.

— Por que apenas bruxas são perseguidas se outras espécies e até mesmo os humanos praticam magia? — Ele pergunta.

— Talvez elas sejam apenas vítimas de uma sociedade corrompida. Todos dizem que bruxas trazem má sorte e as cidades onde elas passam viram alvos de monstros. — Nós entramos na taverna e nos sentamos em uma mesa.

— Já conheceu alguma? — Azrael me pergunta.

— Sim. Ela era alta, tinha unhas imensas e uma beleza assustadoramente intrigante. — Conto, com a imagem da bruxa em minha mente.

Quatro homens entram na taverna, grandes e musculosos como mamutes. Eles se sentam e não tiram os olhos de nós. De mim, mais especificamente. Eu me mecho na cadeira, desconfortável. Olho para Azrael e ele está com os olhos fixados naqueles homens. Sua expressão é seria e um tanto assustadora. Provavelmente está lendo a mente deles.

— Onde vamos passar a noite? — Ele pergunta, ainda concentrado naqueles quatro.

— Tenho um favor para cobrar da dona de um alojamento do outro lado da rua. Mas não é nada comparado ao que você conseguiu para nós no último vilarejo. — Falo.

— Posso ameaçar algumas pessoas, se quiser. — Eu reviro os olhos.

— Esqueceu o que eu disse? Se ficarem sabendo que há um homem de olhos negros ameaçando as pessoas vão caçar você e eu, provavelmente me acusando de ser uma bruxa e você de ser algum monstro. — Falo baixinho. — Por mais que por parte seja verdade. — Solto uma risada nervosa.

— A parte de você ser uma bruxa? — Azrael pergunta, finalmente desviando o olhar para mim. Há um meio sorriso atrevido em seus lábios. Eu faço uma careta pra ele.

— Pensando bem, você parece uma com esses cabelos longos e seus olhos assustadores. Sabia que em algumas regiões pessoas loiras como você são mortas para que arranquem seu couro cabeludo e vendam para fazerem perucas? — Digo e Azrael faz uma cara de horror.

A mulher que trabalha na taverna se aproxima com um copo de cerveja nas mãos e o põe na minha frente.

— Cortesia daqueles cavalheiros. — Ela diz, apontando para os quatro homens estranhos e logo em seguida volta para o balcão.

— Vamos ficar quanto tempo nesse lugar? — Azrael pergunta se mexendo em sua cadeira, sua voz grave está pesada. Há algo incomodando ele.

— Dois ou três dias. — Respondo.

— Eu estou com fome Zahara. — Reclama.

— Não consegue se manter com comida normal? Por poucos dias apenas. —Provavelmente ele dirá que não, mas não posso deixar ele matar ninguém aqui.

— Eu preciso de sangue. Estou ficando fraco. E ao menos que eu mate alguém nessa cidade miserável ou beba seu sangue, não vejo muitas opções, princesa. — Ele fala, visivelmente irritado. Mas sinto que não é apenas sua fome que o incomoda.

— Mas que droga Azrael. Se você se alimentar mais uma vez de mim vai me deixar fraca de novo, e eu preciso das minhas energias intactas nesse lugar. — Falo, e ele dá um soco na mesa, me assustando.

— Se não quer me ver arrancando os corações de todos nesse lugar, sugiro que peguemos nossos cavalos e vamos embora. — Ele sugere, olhando para as pessoas como se fossem pedaços de carne em um mercado. Escolhendo.

— Tudo bem. — Eu sussurro, um tanto atordoada por ele ter agido dessa forma.

Eu me levanto e vou até a saída da taverna, junto com Azrael. Está no fim da tarde, os homens estão saindo de seus trabalhos e as tavernas enchem cada vez mais.

Nós levamos os corcéis até o alojamento do outro lado e entramos. Vou até um homem que está limpando o chão. Quando nos aproximamos, ele olha com medo para nós. Para Azrael na verdade, em seus olhos amedrontadores.

— Onde está Lydia? — Pergunto. O homem dá um passo para trás.

— E-ela sa-saiu. — Ele gagueja. — Mas podem escolher um quarto, digo a ela que estão aqui. — O homem se afasta mais um passo, provavelmente prestes a sair correndo.

— Tudo bem, obrigada. — Digo e vou até a escada, entrando no primeiro quarto á direita no segundo andar.

Jogo meu arco e minha aljava na cama, livrando o peso da minhas costas. Azrael está inquieto, andando de um lado para o outro. Faz dias que ele não se alimenta. Tentei convence-lo a beber o sangue de algum animal mas ele se nega. E se continuar assim, vai morrer.

— Eu vou matar você, Zahara. — Ele diz se aproximando de mim. Eu me afasto, mas sou encurralada contra parede. — Vou arrancar seu coração. — Azrael fala passando a mão em meu rosto. — Depois vou beber cada mísera gota do seu sangue delicioso. — Ele aproxima a boca do meu pescoço, passando a língua por ele.

—Tente. — Digo. Azrael vira para trás, como se tivesse ouvido algo. Ele se afasta um segundo depois, uma expressão cruel no rosto. — O que há com você? Por que está agindo de forma tão impaciente? — Pergunto, indo até a porta.

— A fome me incomoda. Esse lugar me incomoda. há algo acontecendo nessa cidade. — Ele diz, observando as casas pela janela do quarto. — Eu sinto isso. — Eu solto um suspiro.

— Fique sozinho com seus chiliques, já está quase anoitecendo e eu preciso procurar Lydia. Não mate ninguém até eu voltar. —Falo e saio pela porta.

Lendas de vingança e liberdade - O reino massacradoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora