Capítulo 9

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Narrado por Zahara

Desperto pela manhã com o barulho na rua das pessoas do vilarejo. E como de costume, Azrael não está por perto quando acordo. As vezes penso que ele sequer dorme.

Me espreguiço, lutando para sair da cama confortável. Após me levantar eu tranço meu longo cabelo preto e coloco o casaco que Azrael trouxe para mim. Pego minhas facas, coloco minha aljava e meu arco nas costas e saio do quarto.

Já fora do alojamento vejo que há uma pequena multidão agitada e assustadas de pessoas no outro lado em volta da fonte. Eu me aproximo para ver o que houve ali.

Há duas mulheres mortas no chão, ambas sem sequer uma gota de sangue em seus corpos e sem seus corações. Eu as reconheço. São as duas que estavam com Azrael ontem. Saio dali imediatamente.

Não sei porque fiquei tão decepcionada. Azrael já fez isso antes. Ele matou centenas! Mas parece diferente agora. Ter matado as jovens moças. Eu sei da sua natureza, sei que é um demônio. Mas depois da conversa de ontem, quando me contou sobre Mora...

Não sei porque algo mudaria depois daquilo.
Ele continua sendo a fera selvagem de sempre, eu apenas me esqueci disso e tentei ignorar. Por mais que a tenha amado, acho que esse amor só serviu de combustível para sua raiva quando ela foi tirada dele. E isso deixa tudo pior.

Não há nada mais destrutivo que a raiva e a dor da perda. E talvez aquela conversa de ontem tenha servido como gatilho.

Tento entender seu lado. Sei que não há nada para se entender no assassinato de duas pessoas inocentes, mas tento mesmo assim.

Azrael veio de um mundo onde não há bondade e foi deixado para morrer. Foi rejeitado pela sua espécie e a única pessoa que tinha foi estuprada e assassinada. Depois ficou preso por 600 anos. E para um demônio, ele não tem se comportado tão mal quanto certos humanos.

O que eu deveria fazer? Tentar ignorar todas essas mortes e agir como se ele fosse um animal selvagem que não se responsabiliza por seus atos? Sei que não posso fazer nada para impedi-lo, mas isso precisa parar!

Volto para o alojamento para pegar os corcéis. Quando chego, vejo que há apenas um. Onde está o outro? Eu monto no cavalo e saio, procurando. Provavelmente Azrael o pegou.

Procuro por todo o vilarejo mas não os encontro. Até que ouço um relinchar vindo duma clareira próxima, na floresta. Eu sigo o som e quando chego, vejo Azrael tentando guiar o corcel. E não conseguindo.

— Me obedeça! — Ele ordena, fazendo o cavalo empinar.

— O que quer que ele faça, Azrael? — Pergunto acima do meu cavalo. Sou ignorada. Desço da minha montaria e vou até o corcel que ele está montado. Me aproximo lentamente. O animal está assustado e incomodado. — Não grite com ele. Cavalos são criaturas sensíveis. Eles guardam em sua memória de longa data aqueles que os tratam com hostilidade. — Falo, acariciando seu longo pescoço.

— É só um animal. — Azrael responde, puxando as rédeas e fazendo o pobre corcel dar uma forte cabeçada em mim, me derrubando.

O impacto causou um corte em minha bochecha, fazendo meu rosto todo ficar dolorido e meu olho roxo. Azrael não diz nada, ficando em silêncio e imóvel.

Porém o corcel parece ter tido consciência do que causou e se aproxima de mim no chão. Ele abaixa sua cabeça, encostando seu focinho em mim. Como se pedisse desculpas e perguntasse "está tudo bem?"

Eu sorrio para o animal, ignorando a dor em meu rosto. Me levando, profundamente irritada. Eu poderia arrancar a cabeça de Azrael fora. Mas mesmo assim, tento enterrar essa raiva.

— Para ele andar, de um toque em seu dorso com seu pé. — Azrael faz como sugeri e o corcel anda. — Se quer que ele vá para a direita, puxe a rédia para direita. — Ele guia o cavalo para a direita. — Se quer que ele pare, puxe a rédea e penda as costas para trás. Mas não muito forte ou ele irá empinar. — E assim é feito.

Eu vou até o meu cavalo e o monto.

— Vamos seguir nosso caminho antes que você cause mais mortes. — Digo e toco meu corcel até a estrada, com Azrael ao meu lado.

Lendas de vingança e liberdade - O reino massacradoWhere stories live. Discover now