A Garota que Nunca Existiu

By WitchGianni

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Em um esquecido subúrbio na zona norte do Rio de Janeiro, Alice, uma fã fervorosa da franquia The Legend of Z... More

Capítulo 1 - The Girl with the Machine Gun
Capítulo 2 - Bronzes e Cristais
Capítulo 3 - Respostas
Capítulo 4 - The Wall
Capítulo 5 - Siga o Coelho Branco
Capítulo 6 - Through the Looking Glass
Capítulo 7 - MK Ultra
Capítulo 8 - Controle
Capítulo 9 - She's lost control again
Capítulo 10 - Presa
Capítulo 11 - Predadora
Capítulo 12 - Interrogações
Capítulo 13 - As pessoas mentem o tempo inteiro
Capítulo 14 - Espelhos distantes
Capítulo 15 - Juramento
Capítulo 16 - Conatus
Capítulo 17 - Remoto Controle
Capítulo 18 - Destinos
Capítulo 20 - Na Estrada
Capítulo 21 - Ultimato
Capítulo 22 - Pela luz dos olhos teus
Capítulo 23 - The boy with the thorn in his side (Parte 1)
Capítulo 24 - The boy with the thorn in his side (Parte 2)
Capítulo 25 - Eco
Capítulo 26 - Letargia
Capítulo 27 - Maya
Capítulo 28 - Véu
Capítulo 29 - Kensho
Capítulo 30 - Existenz
Capítulo 31 - Refúgio
Capítulo 32 - Sublimação
Capítulo 33 - Réplica
Capítulo 34 - Inexorável
Capítulo 35 - Retorno
Capítulo 36 - Cruz de estrada
Capítulo 37 - Prioridades
Capítulo 38 - Autofagia
Comunicado - 29/05/2022
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41

Capítulo 19 - Dores do crescimento

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By WitchGianni

– Feche os olhos – sussurra uma voz calma em meu ouvido.

Obedeço, enquanto um áspero pedaço de pano é amarrado em meu rosto. Seguro mãos igualmente ásperas, deixando-me guiar por elas, desajeitada.

Tão cega...

– Um passo de cada vez, Cecília – instrui a voz, pacientemente – Não se preocupe, que estou aqui.

Engulo o orgulho e a necessidade de controle, que descem pela garganta deixando um gosto agridoce na boca, tentando ignorá-los o quanto posso. Isso é importante.

Um passo de cada vez, repito.

Um passo de cada vez, faço.

Não gosto de depender de ninguém, mas não é difícil seguir comandos diante de uma necessidade, menos ainda quando se deposita confiança naquele que comanda. Chega a ser irônico, até – comecei meus treinos nesta casa sempre com medo de confiar, para logo depois descobrir que esta seria a única opção disponível. Ando devagar, temendo a madeira ranger debaixo de meus pés, lembrando-me para onde estou indo, o que verei, e quase desejo recuar, mas não. 

– Pare.

Obedeço novamente. As mãos se soltam das minhas suavemente, como que para não me assustar, desenrolando com agilidade os nós do tecido velho que, ao cair sobre meus pés descalços, quase faz com que eu me sinta nua. Não há mais nada que me separe disso, absolutamente nada a não ser meus olhos. Por reflexo, baixo a cabeça e respiro fundo, preparando-me para o que está bem na minha frente e que me recuso a enxergar.

Um fio de tensão corta o som do silêncio, uma expectativa quase febril da próxima ordem.

– Cecília – a voz faz uma pequena pausa – Abra os olhos.

Levanto lentamente a cabeça, como se, executando os movimentos devagar, fosse capaz de controlar o tempo na mesma medida. Gosto desta falsa sensação de controle e tento amparar-me nela, a despeito do suor frio em minhas mãos dormentes. Quando já não posso prolongar o momento, prendo a respiração e finalmente abro os olhos.

Com o corpo trêmulo, mantenho-me de pé, encarando meu reflexo no espelho como a um desconhecido. Irredutível, o reflexo devolve o olhar.

Nunca a vi em toda a minha vida, este rosto de formas incomuns, alienígenas, anormais, ouso dizer, até antinaturais. Fito a garota à minha frente pela primeira vez e ela aceita o desafio, fitando-me em retorno com tamanha veemência que quase desejo desviar o olhar.

Sou eu?

Ela não é tão bonita, mas dificilmente seria feia. Seus cabelos castanhos, outrora repicados à altura dos ombros, agora descem até metade do peito, embora não o cubra. Sua pele é pálida, não saudável, os braços e o rosto repletos de pequenos hematomas e escoriações, manchas azuis e roxas eternas como tatuagens indesejadas. As unhas estão quase todas roídas, desfiadas. Seus olhos cinzentos fitam-me com uma estranha mistura de cansaço, medo e altivez selvagem, muito mais antigos que o resto do corpo. Seria ela a Teresa daquele poema idiota, cujos olhos nasceram dez anos antes que o resto do corpo, esperando para nascer de vez? Talvez. Seu olhar é de uma intensidade tal que só lembro de ter visto em Link em seus piores dias, mas mesmo ela traz algo além: desvairados, de uma agressividade passiva, sem ter com o que substituir uma antiga inocência perdida da pior forma possível. Pobre alma de corpo tão frágil quanto uma boneca de trapos, de corpo tão forte quanto sua vontade.

Seja lá quem for, posso apenas lamentar seu azar.

Hesitante, abro a boca, fazendo menção de falar, e ela também abre a boca, interrompendo o movimento ao mesmo tempo em que interrompo o meu. Impa está logo atrás de mim e eu a fito do espelho, lançando-lhe um olhar questionador, enquanto ignoro a garota que parece estar tanto à minha frente, quanto atrás.

– Pergunte quem ela é – sussurra calmamente.

Volto meu olhar para o reflexo, tentando ignorar o medo enquanto posso, pronta para falar.

– Quem... é...? – a voz rouca falha, mas ainda consigo falar até o final, acompanhando o movimento dos lábios da jovem, sincronizados com os meus. Ela também quer saber quem sou.

Silêncio, pois não temos pressa. Deixe que as palavras apareçam sozinhas, devagar.

É Impa quem responde.

– Ela é você.

Mordo os lábios, procurando a voz em mim. Não, não pode ser, eu não tenho nada a ver com ela. Como poderia? Como eu poderia?

– Q-quem sou... eu...? – indago junto ao reflexo, e o reflexo indaga junto a mim.

No que a sheikah prontamente responde:

– Você é Cecília e mais ninguém, nem Helena, nem Jane. Apenas Cecília.

– Por... que?

– Porque Cecília nasceu antes de todas as outras. Porque Cecília é a primeira.

Não, não posso ser esta garota destroçada, dividida em mil pedaços e depois remendada. Mas há uma pergunta no âmago da garganta que anseia por uma resposta: o que eu sou, afinal?

Como que ainda vendada pelo pano, caminho a passos lentos em direção ao espelho, confrontando meu próprio terror, flertando com o medo que me corrói, mas não importa. Nada mais importa, e a imagem também caminha ao meu encontro, pressentindo que devemos nos tornar apenas uma, corpo e mente, alma e espírito. Toco a superfície fria do vidro com as pontas dos dedos roídos e recebo o toque de seus dedos como resposta, espalmando as mãos em direção às minhas. Por um momento, tenho medo que o espelho quebre sob meu toque, que leve a garota embora, estilhaçando-a novamente em mil pedaços, em sete anos de azar. Mas minhas mãos apenas sujam o vidro de suor e umidade, embaçando-o, e é quando vejo que as mãos da jovem estão tão suadas quanto as minhas.

Depois de dois longos meses, é a primeira vez que observo a mim mesma em um espelho. Confesso que pensei ter me esquecido do formato do meu rosto, da cor de meus olhos, dos machucados em minha pele, mas não sou tão sortuda. Há marcas das quais é impossível se livrar.

Não sei por quanto tempo encaro o reflexo, talvez por tempo suficiente para que a imagem deixe de ser de outra pessoa para tornar-se minha novamente. É engraçado, penso comigo mesma, que encarar espelhos tenha tido o efeito contrário um dia – quando criança, brincando de jogo do sério com a minha imagem, era fácil demais sair de si mesma e pensar olhar para outra pessoa. Lembro-me de detestar a sensação e de não mais brincar daquela forma conforme crescia. Mas agora, penso com um sorriso tolo, sou simultaneamente a consciência que fita o reflexo e o corpo refletido pelo espelho.

Quem é você?

Quem você é?

E eu respondo pacientemente como sempre fiz, a despeito das marcas das quais nunca poderei me livrar, de estar tão mudada que quase não me reconheci.

Sou Cecília da Costa e mais ninguém.

Uma mão encosta suavemente em meu ombro, conduzindo-me novamente até a realidade, longe de espelhos quebrados e mentes fragmentadas, oferecendo-me um copo de Poção Vermelha. Impa me ajuda a levantar dali e sento em uma das cadeiras da sala de estudos, relutantemente tomando um ou dois goles da bebida.

– Está tudo bem? – pergunta, após um longo silêncio.

O medo se esvai, deixando apenas cansaço em seu lugar. Quando sinto que sou capaz de falar com propriedade, digo:

– Tá – respondo, brincando com os dedos na borda do copo, o corpo pesado como se uma manada de elefantes tivesse passado por cima de mim – Achei que seria pior.

Os olhos da sheikah me encaram de uma forma mais enigmática que a habitual, como se isso ainda fosse possível. Se reconheço muito bem quando o olhar clínico de Impa está prestes a me analisar, quais as suas conclusões são algo que jamais saberei.

– Não foi uma tarefa fácil – admite, e percebo pela primeira vez uma pontada de preocupação em sua voz – Nem mesmo eu sabia o que ocorreria caso as coisas saíssem do controle. Passamos semanas treinando, controlando os efeitos do poder, mas, honestamente, qualquer coisa poderia acontecer, já que você não é daqui. De todos, foi nosso plano mais ousado – Ela se interrompe por um momento – Como se sente?

Solto uma risada irônica que de forma alguma combina com meu humor.

– Como se estivesse possuída – mas, diante da olhadela inquisitiva de Impa, limpo a garganta, encarando minhas mãos – Falando sério, ainda tô um pouco assustada. Não é algo que eu vá esquecer com tanta facilidade, e ainda continuo com medo – confesso, rindo novamente, desta vez sem humor – Talvez bem menos do que antes, mas ele ainda tá lá. Tanto faz, já estive em situações piores.

– Não se faça de durona. É natural que ainda se sinta assim – conclui, esticando os dedos sobre a mesa – Este poder vai lhe acompanhar por toda a vida mas, pelo menos agora, não precisa ter tanto medo.

Ergo uma sobrancelha.

– Acha mesmo? – hesitante, pergunto – E quanto a... Helena?

A mulher é enfática.

– Você não se livrou dela, nem de Jane, Cecília. Como eu disse, este poder, estas sequelas, tudo isso vai lhe acompanhar pelo resto de seus dias. O que fizemos foi amenizar os efeitos, devolver identidade a você, para que seja capaz de controlá-las com mais segurança e autonomia – Impa suspira, o semblante pensativo e resignado – Nunca a enganei quanto a isso.

Subitamente angustiada, engulo em seco e pego-me pensando no futuro, algo que sempre hesito em fazer. Estou destinada a carregar este fardo pelo resto da vida, estas pessoas que gritam em minha cabeça, este descontrole que tanto abomino e, ainda assim, apenas se sobreviver a tudo o que ainda me espera. Pela primeira vez, genuinamente me pergunto se até mesmo Alice ainda será capaz de me oferecer esperança em meus momentos mais sombrios. Diacho, o que me impede de simplesmente desistir de tudo e desaparecer?

A trama jamais será contrariada.

É como se ouvisse a voz de Jane. Surpreendo a mim mesma com a facilidade com a qual a ignoro. Se este último verso é verdade ou não, decido internamente, isso é algo que depende apenas de mim. No fundo, sei que nem todo o pessimismo do mundo me impedirá de encontrar Alice e, se já estou pagando o preço de minhas convicções, o melhor que posso fazer é não desistir a esta altura.

Da pequena janela em frente ao espelho, observo os primeiros raios de sol tomarem conta do horizonte, iluminando o cômodo com um pálido brilho alaranjado, como que pedindo permissão para entrar. O nó na barriga arrefece diante da imagem. Talvez eu possa me permitir um pouco de paz antes que cheguem os dias de cão – se é que eles já não chegaram.

– Falta apenas um dia... – sussurra Impa, pensativa como raramente a vejo, os raios tingindo seus cabelos prateados com um brilho etéreo.

– É – retruco secamente, com uma pontada de sarcasmo – Mal posso esperar.

Como que despertando de seu devaneio particular, a mulher subitamente responde:

– Há duas coisas que quero lhe dar antes que vá – Diante de minha expressão confusa, ela complementa: – Você completou seu treinamento, Cecília. Passou no teste.

Franzo a testa ao ouvir a última frase, instintivamente bebendo o restante da Poção Vermelha em um gole só.

– Espero que não se importe, senhora Impa, mas não quero ter mais nada a ver com qualquer coisa relacionada a "passar no teste".

Ao perceber o que quero dizer com isso, ela responde:

– Está certo. Bem, o que eu dizia é que, uma vez que concluiu os treinamentos sob minha orientação, você receberá algo importante.

– O quê?

Em resposta, Impa afasta-se de mim para buscar seja lá o que tenha para me oferecer. Ela volta rapidamente, com uma pequena caixa, deixando-me ainda mais curiosa.

– Abra – É tudo o que diz.

Desconfiada, faço o que pede, esperando que qualquer coisa esteja ali, mas me deparo com o que menos espero: um inofensivo par de brincos de argolas prateadas. Diante de meu olhar confuso, Impa responde:

– É uma antiga tradição sheikah que, na conclusão de seus treinos, o jovem pupilo perfure suas orelhas e receba um par de argolas de prata como sinal de maturidade. Você já deve ter percebido que Link também as tem.

Assinto, embora sinta que devo lhe apontar um fato óbvio.

– Só tem um detalhe, senhora Impa – Aponto para meus minúsculos brincos folheados em formato circular, um presente de minha mãe que curiosamente não se perdeu por este mundo como meus outros pertences – Já furei minhas orelhas quando era pequena.

A sheikah dá de ombros.

– Não faz diferença. Terá de furá-las novamente para colocar as argolas.

Estremeço um pouco, mais por puro hábito do que por medo da dor. É difícil se assustar com um pouco de sangue depois de tudo o que vi, de modo que também dou de ombros.

– Tudo bem – respondo com uma expressão relativamente neutra embora, no fundo, esteja estranhamente contente com um ritual tão simples – Vamos lá.

Se Impa percebe minhas emoções contidas, simplesmente não demonstra, subindo para buscar os materiais necessários para a perfuração. Contra a minha vontade, pego-me lembrando de diversas tentativas de amigos meus em arranjar um segundo furo ou um piercing. Sorrio melancólica ao lembrar do dia em que Isa fizera um piercing na farmácia perto de sua casa, contrariando os conselhos de Alice para que furasse em um estúdio ou qualquer coisa do gênero, passando a semana inteira com as orelhas inflamadas como consequência. Fatos simples, corriqueiros, que eu daria qualquer coisa para viver novamente.

As lembranças de poucas horas atrás me vêm à mente, como que pondo um ponto final em meus pensamentos. Esqueça disso, Cecília, ralho, não precisa doer mais do que já dói.

– Sente aqui, perto da luz – sinaliza Impa, que está de volta com o material, segurando algo que se assemelha a uma agulha cirúrgica – Isso vai doer um pouco.

– Hm... tudo bem – aproximo meu rosto, fazendo questão de manter os olhos abertos durante todo o processo. Sem desinfetante, sem gaze, sem álcool, sem brinco antialérgico. Suspiro internamente. Tudo bem.

Retirando meus brincos antigos e umedecendo a pele com um pouco de água fria, ela posiciona um pequeno cubo de gelo sobre a parte da pele ainda não perfurada, pressionando-a até que fique dormente. Apesar disso, ainda sinto uma pontada dolorida onde a agulha perfura, suas mãos habilidosas limpando a área com cuidado e colocando a primeira argola em seguida. O processo se repete do outro lado e, novamente, admiro o semblante de Impa que, embora inexpressivo, passa-me um estranho tipo de confiança.

– Pronto – conclui, após ajeitar as argolas e os brincos antigos em seus respectivos furos – Pode olhar agora.

Volto-me novamente para o espelho, curiosa. A pele perfurada ainda está um pouco inflamada, mas não faz mal, pois, por alguma razão, sinto uma curiosa espécie de orgulho por ter recebido aqueles brincos, como se tivesse evoluído de alguma maneira.

– Senhora Impa... não sei se cheguei a dizer, mas... – hesito, um pouco sem jeito com as palavras – Obrigada por tudo. É sério.

Para minha surpresa, a mulher exibe um sorriso contido, encostando suavemente uma das mãos em meu ombro.

– Não me agradeça – Seu semblante é triste e melancólico – Posso apenas lamentar por tudo o que passou e por tudo o que terá de passar no futuro. Mas ainda há esperança, minha jovem, e espero que você se aperceba disto antes que seja tarde demais.

Esforço-me para sorrir-lhe de volta, pensando em suas palavras.

– É, deve haver – digo, por fim – Ainda assim, obrigada.

– Ainda há mais uma coisa que tenho de lhe dar – murmura – Não se assuste com ela.

Tão rápido quanto apareceu, a atmosfera de melancolia se esvai, no momento em que Impa retira um pequeno objeto do bolso e o coloca em minhas mãos, afastando-se silenciosamente para organizar os últimos detalhes de minha viagem e me oferecer um pouco de espaço para refletir sozinha.

Abro as mãos e fito o objeto.

É o medalhão de Alice.  

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