08 - Do Atrito vem as Chamas

Começar do início
                                    

- Daria um braço meu para ter visto essa cena - disse Arth, dando risada.

Callum era um traidor do sangue. Ele era aliado dos rebeldes bem antes que Arth, Louíse e eu chegássemos em Ermont, e já faziam 67 anos que isso havia acontecido. Foi ele quem alertou Blahz dos interessem de Hazor por escavações e passou as informações sobre o livro que tanto o rei procurava naquela época. Até hoje, ele não foi capaz de abri-lo. Callum era nossos olhos dentro do palácio, ele odiava o próprio pai. Isso devia ser coisa de família.

- O que está acontecendo lá embaixo? - Perguntei, um tanto curioso.

- Meus queridos tios estão no Castelo, e fizeram questão de trazer seus guardas para compor a Legião. Hazor só aceitou porque está desesperado e precisa da ajuda dos irmãos.

- Thangnall e Derorn estão sem proteção? - Questionou Arth.

- As rainhas das Cortes não acompanharam seus maridos nessa breve visita familiar - comentou Callum - Elas estão no comando da guarda, juntamente com os herdeiros.

- Tigur e Vizeu são mesmo muito burros de deixar seus reinos agora. - Falei, pensando em prováveis levantes rebeldes na ausência de suas majestades, logo agora que o povo falava sobre o nome de Griffin em cada esquina através de Keevard.

- Meu pai juntou os irmãos porque acredita que pode enfraquecer e até matar Griffin quando ele aparecer, da mesma forma que fez com meu avô.

- Darius não morreu - lembrei à Callum.

- Mas fugiu e nunca recuperou a magia - concluiu ele.

Se Hazor e os irmãos estavam juntos para destruir Griffin, então eles iriam rastrear a magia de alguma forma. Meus pensamentos alcançaram Lynn de um jeito que tirou a minha paz. Ela seria caçada por eles.

- Callum, você precisa me dizer como... - de repente todo o ar havia saído de meus pulmões. Comecei a tossir de forma descontrolável enquanto tentava resgatar o mínimo da minha respiração. Senti as mãos de Arth em meus ombros enquanto eu sucumbia ao chão e sentia um cheiro forte de fumaça e fogo. A sensação foi embora da mesma forma que veio.

Puxei o ar com toda a força que consegui enquanto os olhos azuis de Callum vieram à minha frente perguntando o que havia acontecido.

Meus pensamentos começaram a se mexer e eu só via uma resposta para o que aconteceu.

Lynn.

Corri até meu cavalo sob os protestos de Callum e Arth para que eu explicasse alguma coisa, mas eu não conseguia falar nem mesmo processar o medo que se instalava em meu peito.

Cavalguei pelas ruas estreitas e inclinadas durante um tempo até chegar nas Vilas. Passei por várias casas e garagens abertas, vi pessoas martelando aço e trabalhando, mesmo sendo madrugada. Quando cheguei no topo de um declive, visualizei a linha fina e negra que subia aos céus.

Medo, puro e frio, foi o que eu senti enquanto avançava para lá.

A rua estava cheia de fumaça e as pessoas se mobilizavam jogando baldes de água em uma casa-bar totalmente em chamas. Desci do meu cavalo e perguntei para os moradores se havia pessoas lá dentro. Eles disseram que o dono do bar morava com a filha, e eles não haviam saído.

A casa estava tomada pelo fogo, não havia passagem nenhuma, senão pelas próprias labaredas.

Ah pela Deusa, me tirem daqui.

Escutei ela em minha cabeça. Estava viva.

Peguei uma manta e afoguei-a num balde de água. Não pensei duas vezes, me cobri com ela e desafiei o fogo. Escutei quando as pessoas se desesperaram quando me viram entrar. Eles diziam que era tarde demais.

Meus olhos ardiam e minha boca ficou seca quase que imediatamente. Eu tinha minutos até a fumaça me matar, então comecei a gritar o nome dela desesperadamente. Pela segunda vez em um dia, eu não conseguia respirar.

- AQUI!! - Ouvi uma voz masculina, mas não conseguia ver nada.

Mas através de todo aquele inferno, uma bolha de ar estava sob meus olhos, diminuindo enquanto o fogo rugia. Lynn estava com os olhos vidrados nas suas mãos, enquanto elas sugavam o quase nada de ar que estava no lugar. Corri até ela e seu pai, enquanto os dois tossiam.

- Lynn, olhe para mim - pedi, com a voz engasgada enquanto entrava na bolha que ela criou - precisa continuar controlando esse resto de ar, vai ser nossa saída - ela mantinha os olhos arregalados e o semblante petrificado - Lynn!!! Me escute, consegue fazer isso?

Ela assentiu e não esperei que pensasse duas vezes, arrastei dos dois até a porta o mais rápido que consegui.

- Solte, Lynn - pedi, enquanto abaixava suas mãos para que a magia se esvaísse - as pessoas não podem ver.

Quando ela enfim conseguiu controlar a magia do ar, cobri-os com o cobertor e empurrei-os para fora do fogo.

Ar puro era algo simples e precioso do qual eu começaria a valorizar mais.

As pessoas nos ajudaram quase que imediatamente após sairmos do bar em chamas. Todos nós tínhamos queimaduras em volta do corpo, meu braço esquerdo estava em carne viva.

Moradores se reuniram para produção de ervas medicinais e cuidados com os ferimentos. Fomos arrastados até a casa de uma garoto chamado Carl, que descobri ser amigo de infância de Lynn.

Depois de algumas horas acalmando as pessoas e dizendo que estava tudo bem, elas enfim começaram a ir embora. Enquanto Carl se ocupava em ajudar o pai de Lynn, fui diretamente à ela, que estava sentada em uma cadeira velha no canto da sala.

- Você está bem? - Perguntei, notando as queimaduras nas pernas dela e suas mãos trêmulas.

- Eu queimei minha casa, Kian. Destruí a vida do meu pai - eu podia sentir a amargura e a dor que emanava dela depois de proferir essas palavras.

- O que aconteceu?

- Sonhei com Griffin, sonhei que ele estava na ligação que você desenhou na areia, eu estava tentando chegar até ele, mas estava presa. Depois acordei com as mão alaranjadas e meu quarto queimando. Fiquei apavorada quando vi o fogo se alastrando em segundos. Meu corpo reagiu de alguma forma. Peguei meu pai e criei uma redoma de ar. Ele achou que estava ficando louco quando me viu fazer aquilo.

- Você ainda não controla a magia, seu sonho provavelmente te atormentou e seu corpo reagiu em expelir as chamas para te proteger - falei.

- A magia quase me matou!

- Eu sei. O fogo é o primeiro elemento que desperta nos portadores e é o mais difícil de ser controlado. Mas depois do controle das chamas...

Carl irrompeu o recinto com uma garota chamada Agnes, ela estava carregando muitas ervas sob o braço.

Deixei Lynn aos cuidados deles enquanto me dirigia a porta, já estava na hora de voltar para a floresta. Enquanto Carl trocava os curativos da perna de Lynn, escutei sua voz correndo para minha mente.

O que vem depois das chamas?

Liberdade - sussurrei de volta.

----------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Depois das Chamas

Todos os direitos reservados | Wattpad.com - 2018 | Camilla Braga

Depois das Chamas - Livro 1Onde as histórias ganham vida. Descobre agora