Capítulo XX

151 18 33
                                    

Boa tarde! Mais um... 

**********************************************

A noite caiu. Uma janela escancarada, nos meus aposentos, aguardava pela chegada das fadas de Olisipo como tinha ficado combinado há dois dias atrás.

Eu andava de um lado para o outro, impaciente e amuado. Impaciente, porque hoje teríamos de planear um plano brilhante para vencer a Bruxa e a maldição. Amuado, porque a Rosa rejeitou-me. Simplesmente, por ser um príncipe herdeiro. Por mais que a compreendesse, aquilo mexia com os meus sentimentos mais profundos. Era-me impossível não me sentir desapontado por ela ter abandonado a minha mão, por ter mantido uma distância entre nós e não ter deixado o nosso amor falar mais alto que a nossa suposta diferença de classe social. Não conseguia deixar de remoer neste assunto.

Num outro passado, em que desconhecia a verdadeira identidade de Rosa, eu estava disposto a enfrentar o meu pai por ela, a romper o meu compromisso com a minha princesa prometida e tenha consciência de que iria trazer problemas sérios entre Aragão e Olisipo. Mas era a minha felicidade que estava em jogo! E eu nasci, cresci e fui educado como um príncipe. Ouvi toda a minha vida que as princesas nasceram para os príncipes e o amor de um príncipe deveria ser entregue a uma princesa. Mesmo assim educado desde o meu berço de ouro fui incapaz de negar os meus sentimentos por ela e não dei importância à sua pobreza. Até contei ao meu pai sobre a sua existência! Só me importava o amor que sentia por aquela jovem mulher. Só a desejava ter como minha princesa, independentemente do seu baixo berço de nascimento. Porquê é que a Rosa reagia tão diferente de mim? Porquê, meu Deus? Estive oitenta anos separado dela e amei-a todos dos dias da minha clausura e lutei para voltar para o seu lado e viver o nosso amor. Estou amaldiçoado, por isso!

Encostei-me à moldura da janela aberta e admirei o céu com tristeza. Estava tão perdido nos meus pensamentos que nem senti a minha madrinha entrar no quarto.

- Filipe, o que é que se passa? Pareces triste - senti um roçar tão leve como o de uma pena na minha face. Era a sua minúscula mão a fazer-me uma carícia.

- É a Aurora - respondi, simplesmente e suspirei fundo como um desabafo.

- Aconteceu alguma coisa à Princesa? A Malévola fez-lhe mal? - perguntou a minha madrinha, aflita, voando freneticamente para estar cara a cara comigo.

- Não - respondi, de imediato. - Está tudo bem com a Aurora. A Bruxa ainda não deve suspeitar de nada, provavelmente pensa que o corvo ainda anda a investigar o paradeiro de Aurora.

- Então, o que é que se passa, meu querido, para estares assim tão tristonho?

- Pedi a Aurora...hã... a Rosa em casamento... - calei-me. Até me custava contar.

- Correu mal? - adivinhou a minha madrinha.

Assenti com a cabeça.

- Porquê?

- Porque eu sou um príncipe e ela, supostamente, é uma plebeia.

- Contaste-lhe a verdade sobre ti? - arregalou os olhos de espanto.

- As circunstâncias obrigaram-me, madrinha. Ela ficou assustada ao saber que eu não era apenas um príncipe, mas sim o príncipe herdeiro ao trono de Aragão.

- Oh, meu querido, não fiques assim! Ela tem um título igual ao teu e é tua prometida. Quando ela souber a verdade vai ficar tudo bem.

- Se correr tudo bem, então vai ficar tudo bem, queres tu dizer, madrinha. E se algo correr mal? - levei a mão à cara para a esconder. Tal pensamento até me deixava doente, mas precisava falar dos meus fantasmas. - E se eu vencer a Bruxa, ficar jovem e perder a Aurora?

O AMOR NÃO DORMEOnde as histórias ganham vida. Descobre agora