Capítulo 79

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Anahí

Dulce e todo o resto da família Herrera estavam naquela sala, calados como se já fosse o próprio funeral. Aquilo me aborrecia só de pensar. Como eles podiam ser tão desagradecidos? Alfonso ainda respirava, e enquanto houver vida há esperança. Não era esse o ditado?

Ao mesmo tempo em que se perdiam em seu silêncio, todos me encaravam piedosos. Aquela maldita pena mais uma vez.

Dulce pareceu ter sido convocada pelos olhares, a se levantar e ir para perto de mim.
Nela também existia certo temor.

- Esperávamos por você. Alfonso quer te ver.

A única notícia feliz daquele dia foi que meu marido conseguiu reabrir os olhos mais uma vez.

- Ele precisa descansar agora, não deve se esforçar muito. Depois eu vou.

- Anahí, vá agora, não adie - ao dizer aquilo a mulher apertou os olhos.

- Não estou adiando nada Dulce, só quero o melhor para ele.

- Então o melhor é ele te ver. Faça o que deve ser feito.

O meu medo não a impediu de ser determinada.

~~~

Nunca foi tão difícil entrar por aquela porta.

Eu segurei o ar e o soltei, num movimento relaxante, até sentir-me um pouco mais segura. Destravei a fechadura e entrei.

Ele estava sobre a cama, frio como uma noite de inverno. Solitário tanto quanto.

Meu olhar buscava razões, explicações, o que quer que fosse possível para decifrar aquela dor tão sobrenatural, quase que mortífera, que invadia meu peito a cada minuto que se passava aproximando a nossa despedida.
Parecia uma espécie de sonho inconsciente, onde eu acreditava que ia acordar e tudo passaria. Voltaríamos a nos beijar com a mesma intensidade da primeira vez, e ao pensar nisso minhas recordações machucaram ainda mais.

Lembrei-me da primeira vez que vi aqueles olhos verdes, admirados, no meio de uma plateia irrelevante -Talvez eu já tivesse me apaixonado desde aquele dia sem perceber - porque não havia motivos para um estranho qualquer me deixar tão nervosa num embate de corredor.
Aquela foi à segunda vez, e firmou o que seria a melhor coisa da minha vida.

Alfonso parecia saber os lugares que minha mente percorriam naquele devaneio, quando num reflexo, me mostrou um leve sorriso esforçado na tentativa de esconder o nosso medo.

Mesmo com o fôlego ao fim ele sorriu.

- Não queria que me visse assim, mas preciso de você.

- Eu viria mesmo que não quisesse a minha presença - falei indo na sua direção, sentando-me ao seu lado.

Mordi o lábio e segurei a mão dele.
Alfonso me encarou indignado, até deixar escorrer uma lágrima fraca.

Nem um de nós queria aquilo. Parecíamos inconformados.

- Suas mãos... Elas tremem tanto.

- Não me importa aonde você vai estar, porque eu sempre estarei contigo! Mesmo que as luzes se apaguem...

Balbuciei amargurada, e por um momento as vozes se perderam .

- Você tinha razão sobre o amor. Ele dói bastante - meu ar desapareceu quando o ouvi. A pressão da minha mão aumentou e eu o segurei com mais força ainda. Alfonso respirou fundo. - Mas ele é maior do que o que acontece aqui. O amor vale mais do que a vida e a morte. Ele ultrapassa a nossa razão ou percepção de tudo... Anahí eu podia ouvir você, durante todo esse tempo.

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