Capítulo 54

993 81 13
                                    

Anahí

Era uma sensação inimaginável...
Alfonso tinha uma pele mais quente e aquecida, longe do frio amargo do hospital. Ele tinha um rosado nas bochechas, parecendo outra pessoa.

Agora estava mais próximo do natural.

Aquele foi o momento certo para apenas observar seu rosto carregado de cansaço, ao meu lado, sobre os lençóis brancos e macios que recobriam a cama e ele.
Senti vontade de chorar só de imaginar minha vida sem aquele rosto todas as manhãs, sem sua respiração pesada ou seu toque audaz. Nada faria sentido.
Sem notar a minha própria ação, minhas mãos foram de encontro ao meu abdômen, como se acariciasse o que ali guardava.

- Vamos ser tão felizes... - falei esperançosa, regada de lágrimas.

Levantei devagar para não acordá-lo e fui até o banheiro, em seguida para a cozinha. De lá liguei para Dulce e pedi que nos encontrássemos no restaurante ao lado para conversarmos mais à vontade. Na mesma hora ela concordou e me confirmou que em meia hora estaria lá.

Troquei a roupa e dei de cara com a empregada. A mulher limpava o chão com um sorriso descontraído, mas deu um pulo quando pus minha mão no seu ombro. Nós duas nos assustamos de imediato. Ela com a minha ação e eu com a sua reação. Demos uma risada alta pela cena.

- Você poderia avisar Alfonso que eu fui ver uma amiga?

- Claro senhora - concordou ainda intimidada.

- Ele não deve demorar a acordar. Não esqueça de preparar o remédio das seis, por favor.

- Não se preocupe, essa rotina não tem nada de estranha para mim. Há anos cuido do senhor Alfonso.

- Acredito que sim. - concordei ciente - Me desculpe, só estou assustada com tudo isso.

Tinha certo tom de tristeza na minha voz ao dizer aquilo. Era doloroso. Ela me retribuiu com um olhar terno e eu saí.

Decidi descer as escadas por alguns andares afim de ganhar tempo e relaxar um pouco. Precisava caminhar e tirar toda aquela tensão que me consumia. Enquanto descia a escadaria não consegui deixar de lembrar as palavras duras de Ricardo ao se referir a Alfonso. Ele parecia certo de que o nosso tempo era curto, mais do que eu queria acreditar.
Pensar nisso me instigou a refletir que o médico não havia me dito nada além dos horários de remédios e cuidados quanto ao esforço físico de Herrera. Isso foi diretamente para nossa atividade sexual, lógico.
Porque ele não esclareceu as expectativas, as chances de Alfonso dar a volta por cima e tudo o que teríamos pela frente?

Foi tão chocante pensar que não contive a pausa dos passos. Meus pés fixaram no chão, levemente trêmulos, e uma onda de enjoo me levou a pôr a mão sobre a boca. Olhei para os lados em busca de alguma coisa funda e semelhante a um lixeiro, mas só avistei um depósito de guarda-chuva.
Corri e me ajoelhei de frente o objeto de metal jorrando dentro dele tudo o que tinha comido mais cedo.

Meu estômago deu algumas fisgadas fortes, doloridas até. Fiquei por mais um tempo ali, de joelhos, respirando como se fosse a última vez.

- Você está bem?

Aquela voz feminina era tão doce e calmante quanto a de um padre. Com um gesto levantei a mão direita e confirmei que estava bem. Não quis olhar para trás porque tinha certeza de que meu rosto não estaria agradável. Mesmo assim senti as mãos dela pousarem nos meus ombro e aquilo soou como um convite a despejar o resto de comida que ainda guardava no estômago. Vomitei mais um pouco, praguejando pela sensação amarga na garganta travar todo meu paladar.
Ela saiu de perto de mim voltando alguns segundos depois com um pedaço de pano úmido e um copo com água.
O pano foi posto sobre a minha testa enquanto engoli a água. Para receber e agradecer pelo agrado tive que me expor, e por incrível que pareça a mulher realmente estava longe do que esperei encontrar.

Possession Onde as histórias ganham vida. Descobre agora