Capítulo 12

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Alfonso Herrera

- Espere!

Ela afastou-se tão veloz que nem percebeu a maneira como a secretária por detrás da bancada nos assistia. Olhei para os lados e vi que Lafaiete chegava com a fisionomia nada agradável para alguém com uma das suas melhores noites. Talvez fosse o horário, mas assim que me viu, seus olhos se mostraram surpresos.

Ele fez uma leve busca ao redor, tentando disfarçar a inquietude e ignorando minha visita. Somente após ter cochichado com uma das funcionárias em uma curta conversa obtive sua atenção

- Herrera, que surpresa.

- Nem tanta, precisamos acertar algumas coisas.

- Venha comigo.

Ricardo andou silencioso, sem muitas piadas ou com a atitude empolgante de sempre. O ambiente parecia pesado. Haviam alguns papéis no chão, e coisas desorganizadas sobre a sua mesa. Me recusei em acreditar que ele fosse tão desleixado. Depois de nos acomodar o homem adotou uma expressão mais receptiva e sorriu discreto.

A sua face parecia mais corada em um dos lados, entretanto essa observação foi abandonada.

- Não me diga que eu perdi alguma coisa importante. Você só vem aqui quando algo dá errado - Me abordou organizando a pilha de papéis e pondo-as dentro de uma gaveta acoplada a mesa.

- Os chineses, Lafaiete. Hoje era a reunião final.

- Claro - De certa forma sua voz pareceu decepcionada - Eu estive ocupado aqui meu caro, não lembrei disso.

- Isso, é a sua chance de menores preços. Mesmo assim consegui contornar tudo a tempo. Os últimos acertos serão no fim do mês.

- No Natal?

- Eles não se importam com essas datas comemorativas.

- E você não poderá ir no meu lugar?

- Até poderia, mas é necessário a presença dos dois. Tem que ir comigo.

- Tudo bem. Darei um jeito de resolver sem interferir na ceia com meus familiares. Se bem que até onde eu saiba, você também será forçado a algo semelhante.

- Nem me lembre disso. Minha mãe já deixou claro a obrigação dessa reunião anual.

Foi estranho ouvir a gargalhada forçada dele para parecer confortável com aquilo. Eu gostaria de ser um bom amigo e investigar o motivo do mal humor, mas era discreto demais para me atrever a fazer.

- Vamos lá! É apenas uma vez ao ano.

A porta se abriu no meio da conversa e a mulher de cabelos loiros comportados entrou trazendo um telefone nas mãos. E pediu perdão por nós interromper, mas não recuou em cumprir seu objetivo. Ela entregou o celular ao seu chefe e saiu.

Ricardo me pediu um segundo e se afastou para perto da janela pondo o aparelho próximo do ouvido.

Ele falava baixo, calmo, mas foi possível escutar seu recado supostamente deixado na caixa de mensagem da pessoa no outro da linha. Ele pedia desculpas, várias vezes, como se a conversa toda se baseasse nisso.

Pedir perdão por algo de errado? Aquilo devia ter lhe afetado bastante, levando em conta que desde que nos conhecemos nunca vi alguma situação daquelas acontecer com ele.

Lafaiete simplesmente não se desculpava com ninguém. Pelo menos não facilmente.

Fingindo desconhecer a recaída dele, me encaixei na cadeira e busquei o meu celular. Lembrei da colisão com a pobre mulher perdida pelo corredor a alguns minutos antes. Os olhos dela não saiam da minha mente como uma lembrança profunda, bem no subconsciente.

Eu devia ter visto aquele tom de olhos em algum rosto, mas não conseguia lembrar qual. Era uma cor muito rara de encontrar. Um azul penetrante e suave, contraditórios como a onda e o mar. Ambos eram lindos e hostis. Mesmo com medo de ficar perto de mim, eu podia jurar que ela também teria sido afetada de alguma maneira.

Voltando a me concentrar, olhei a tela e antes de adicionar a senha vi que a culpada do meu celular vibrar teria sido mais uma mensagem de Alice. Mais uma vez ela escreveu algo sobre me ver ainda naquele dia.

Eu tinha aproveitado o nosso encontro e precisava estabelecer direções.

- Ainda por aqui, meu amigo? - A irônica pergunta me arrebatou de volta. Lafaiete já tinha encerrado seu episódio de decadência e queria a minha atenção.

- Vamos terminar de falar sobre os contratos.

- Por favor, preciso de trabalho para ocupar a mente.

Horas depois de ler cláusulas e afins, eu sai do escritório cheio de novas cobranças. Ricardo sempre tinha alguma coisa para modificar em nossos acertos.

Antes de ir, fiquei estacado na porta olhando a secretária frente ao computador digitar com agilidade algo do seu trabalho. Me aproximei dela de forma desinteressada, pondo a mão sobre a mesa. A mulher se abismou e deu um salto na cadeira. Estava nervosa com a minha presença ali, tão próximo.

- Deseja alguma coisa, senhor Herrera? - Seus olhos estavam bem abertos estremecendo com minha intimidação.

Sua respiração parecia desconfortável e inquieta. Tentei ser breve e livra-la do fardo. Não sei porque senti a necessidade de fazer aquela pergunta, um pouco indiscreta, mas estava fora de mim desde que entrei naquele prédio naquela manhã.

- A mulher com quem esbarrei bem aqui. Você a conhece?

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