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Eu estava mais calmo do que esperava.

Ou talvez só anestesiado.

A van parou em frente à rádio vinte minutos antes do horário marcado. Minji me desejou boa sorte e avisou que me esperaria lá fora, como sempre. Entrei sozinho. Coração firme, mente zonza.

Já tinha feito esse tipo de programa outras vezes. Inclusive com o Choi.

Mas hoje era diferente. Hoje, eu sabia exatamente o que queria dizer e para quem.

Fazia dois dias que Choi não me respondia. E, pela primeira vez, eu não o culpava.

Eu tinha dito que queria "ter cuidado", que era "mais seguro assim". E mesmo sendo verdade, foi como se eu tivesse dito que ele não valia o risco.

O estúdio era pequeno e aconchegante. A apresentadora, Jang So-ra, sorriu quando me viu entrar e me guiou ao lugar que eu sentaria.

Nos primeiros minutos, seguimos o roteiro habitual: projetos atuais, bastidores, carreira, curiosidades de fãs. Respondi com educação, me permitindo até uma risada ou outra. Mas no fundo, eu só esperava o momento certo.

E ele veio. Do jeito mais simples.

— Ji-hoon, você sempre passa uma imagem muito serena, muito profissional — disse ela, ajeitando os fones. — Mas o que te segura nos dias difíceis? O que te faz continuar quando tudo pesa?

Poderia ter desviado. Poderia ter falado da equipe, dos fãs, da minha família.

Mas não desviei.

Dei um sorriso pequeno, quase imperceptível, e deixei a resposta vir com cuidado.

— Tem alguém que... me lembra por que eu comecei. Alguém que conhece versões de mim que nem eu sabia que existiam.

Ela me olhou com interesse. Não disse nada, só assentiu.

Continuei.

— É difícil explicar... mas, às vezes, no meio do caos, é só o olhar dessa pessoa que faz tudo silenciar. É como se... eu finalmente estivesse no lugar certo. Mesmo que seja só por alguns minutos.

A voz quase falhou. Mas segurei.

— A gente se desencontra muito. A vida não é fácil pra ninguém, ainda mais pra quem vive sob tanta luz. Mas mesmo quando não nos falamos... eu penso nessa pessoa todos os dias. E estou tentando aprender a não fugir mais disso.

Ficou um silêncio leve no ar. A apresentadora respirou fundo antes de dizer:

— Parece importante.

Assenti.

— É sim.

Ela sorriu e mudou de assunto logo em seguida, como se tivesse sentido que era o máximo que eu conseguiria dizer e ela estava certa.

O resto da entrevista passou num borrão. Quando terminou, tirei os fones devagar, agradeci à equipe e saí sem fazer muito barulho.

Minji estava do lado de fora da rádio, encostada na van, com o celular na mão. Quando me viu, ergueu os olhos e sorriu, aquele sorriso dela, meio debochado, meio orgulhoso, que aparecia sempre que eu fazia algo que ela achava importante.

— Mandou bem — disse, abrindo a porta da van para mim.

Subi e me joguei no banco de trás, sentindo o corpo inteiro relaxar. A porta bateu, ela se arrumou no banco e virou para trás apoiando o queixo no encosto.

— Finalmente seguiu meu conselho número um — ela comentou. — Falar pra todo mundo. Não disse nomes, mas é um começo.

Soltei um riso curto, encostando a cabeça na janela.

— Não falei pra todo mundo.

— Falou sim — ela rebateu. — Quem precisa entender... entendeu.

Em casa, joguei a mochila no chão, tirei os tênis e fui direto para a cozinha pegar água. O silêncio do apartamento me deu espaço para respirar. Sentei no sofá, peguei o celular e finalmente abri as redes sociais.

Olhei tudo.

Vídeos da entrevista.
Trechos recortados.
Tweets, comentários, fanarts, edições com trilha sonora de drama.

"É como se... eu finalmente estivesse no lugar certo."
"Mas mesmo quando não nos falamos... eu penso nessa pessoa todos os dias. "

Sorri, sozinho.

Não porque queria atenção. Mas porque, pela primeira vez, eu fui honesto com o que sinto com o mundo e, principalmente, comigo mesmo.

Eu não sabia se Choi tinha ouvido.
Não sabia se ele iria ouvir.
Mas, dessa vez... não era por ele.

Era por mim.

E se eu quisesse mesmo ficar com ele de verdade,
eu iria ter que aprender a demonstrar isso também. Não com promessas, mas com atitude. Com coragem.

O celular vibrou.
Ryeoun.

Atendi.

— Oi. — falei.

— E aí, tudo bem? — ele perguntou direto, sem rodeios. — Desde aquela noite lá na balada, você sumiu.

— Ah, foi mal. Foi uma noite esquisita. — respondi.

— Aquilo que o Choi falou, era verdade?

Fechei os olhos por um instante.

Respirei fundo.

E antes de responder, pensei nele. Na forma como ele olhava quando queria ser visto.

— Sim, era.

O silêncio do outro lado durou alguns segundos.
Pensei que ele fosse encerrar ali, mas a voz do Ryeoun voltou, mais baixa:

— Eu meio que... sempre soube. Era só... sabe quando dá pra sentir?

Meu peito apertou.

— Desde a época da segunda temporada — ele continuou — Que eu eu via vocês juntos nos bastidores, mesmo nas poucas cenas que fizeram juntos, eu sempre soube. Não precisei participar da primeira temporada para ver.

— Por que nunca falou nada? — perguntei, tentando manter a voz neutra, mas curioso de verdade.

— Porque não era da minha conta — ele disse, simples e riu. — E porque, se fosse comigo, eu também ia querer que as pessoas respeitassem meu tempo.

Fiquei em silêncio.

As palavras dele batiam forte, não por machucarem, mas por oferecerem algo raro: compreensão sem pressão.

— Eu sabia que alguma hora vocês iam se atropelar — ele continuou. — Porque Choi sempre foi mais impulsivo... e você, mais contido. Mas mesmo com esse desencontro todo, não achei que iriam se encontrar de verdade.

Respirei fundo e andei até o sofá.

— Mas ele não quer me ver agora.

— Talvez... — Ryeoun disse, com calma — ele só esteja esperando você fazer por ele o que ele fez por você tantas vezes.

Fechei os olhos.
Porque eu sabia.
Sabia que ele estava certo.

— Eu estou tentando — respondi.

— Eu vi. A entrevista... foi corajosa. Do seu jeito. E tenho certeza que ele entendeu.

Demorei alguns segundos antes de responder.
A garganta apertava, mas não de medo. De alívio.

— Obrigado por falar isso — murmurei.

— Você é meu amigo, Ji-hoon. E... sinceramente?
Eu torço por vocês. Mesmo.

Sorri.

A gente se despediu com poucas palavras, mas fiquei ali, parado com o celular ainda na mão, como se aquela conversa tivesse reorganizado alguma coisa dentro de mim.

A coragem não vinha de uma vez.

Mas estava vindo.

Fora do Script Where stories live. Discover now