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Era irritante como eu conseguia decorar páginas e páginas de roteiro, repetir falas difíceis em um set caótico, sorrir para a câmera e ainda assim ter a mente presa em uma coisa só.

Ou melhor, em uma pessoa.

Ji-hoon.

Desde aquela noite no parque — e principalmente depois da mesa com os amigos — ele vinha agindo estranho. Mais fechado, mais defensivo, como se estivesse o tempo todo tentando apagar os rastros do que sentia.

Mas não conseguia.

E eu... eu estava perdendo a paciência.

— Choi, seu posicionamento, por favor! — a coordenadora chamou.

Assenti com a cabeça e me posicionei. Estava gravando uma campanha publicitária dessas em que eu sorria, falava duas frases prontas e olhava para um copo.

Ao meu lado, a nova manager — cujo nome eu ainda errava às vezes — falava com alguém no ponto eletrônico. Ela era competente, objetiva, mais velha e tão séria que me lembrava da Minji. Só que sem o afeto.

Talvez por isso eu tenha tido a ideia naquele momento.

Peguei o celular, abri a câmera frontal discretamente e me aproximei dela.

— Ei, olha aqui rapidinho — pedi.

Ela virou o rosto, confusa, mas olhou.

Eu tirei a selfie.

Uma foto simples. Eu sorrindo de leve. Ela ao fundo, um pouco sem entender.

Abri a conversa com o Ji-hoon. O último emoji azul dele ainda estava lá. Mas eu ia mudar isso agora.

"Trabalhando duro 😉"
"Ela é séria, né? Mas até que a gente se dá bem."
[FOTO]

Enviei.

Bloqueei o celular e guardei no bolso. Tentei não pensar muito. Mas sabia exatamente o que estava fazendo.

Talvez ele me respondesse com um "legal". Talvez ficasse em silêncio. Talvez me ignorasse por um tempo.

Ou talvez — só talvez — fosse o empurrão que faltava para ele dizer alguma coisa. Qualquer coisa. Desde que fosse de verdade.

Eu estava disposto a provocar tudo que fosse preciso. Porque no fundo, era isso ou continuar fingindo que a gente não estava prestes a explodir por dentro.

— Choi, o que foi aquilo?

Eu mal tinha guardado o celular e já ouvi a voz dela, seca ao meu lado. Kang Na-yeon estava com os braços cruzados, a testa franzida e o olhar de quem não tinha tempo para piadinhas.

— Uma selfie — respondi, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.

— Uma selfie... comigo no fundo?

Dei um sorriso. Um daqueles que funcionavam bem demais em câmera, mas não serviam para muita coisa com ela.

— Você apareceu só um pouquinho. Foi espontâneo.

— Apaga.

— Sério isso?

Ela ergueu uma sobrancelha.

— Você está no meio de um trabalho. Está usando imagem de outra profissional sem autorização. E você sabe o que isso pode causar, certo?

Bufei.

— Tá, tá bom. Já entendi. — Peguei o celular, destravei a tela e abri a conversa com o Ji-hoon. Vi que ele tinha visualizado. Ótimo. Não respondeu, mas viu. — Pronto, apaguei.

— Não é pessoal — ela acrescentou, um pouco menos tensa. — Mas você sabe que não pode agir assim.

Não discuti. Só virei de costas e voltei para onde o diretor me chamava.

Enquanto caminhava até a marcação de luz, senti o celular vibrar no bolso. O som do mundo pareceu silenciar por um segundo.

Mas eu não ia olhar agora.

Afinal, se Ji-hoon tivesse respondido, era melhor ler com calma depois. E se não tivesse, eu já estava suficientemente irritado para mais um balde de água fria.

Na cabeça dela, era só mais um ídolo agindo por impulso.

Mas se ela soubesse o que tinha por trás daquela foto...

Talvez até ela entendesse.

Ou talvez não.

A verdade é que ninguém entendia o que existia entre mim e Ji-hoon. Nem ele mesmo.

E talvez por isso eu tivesse que continuar fazendo esse tipo de coisa. Porque provocar era a única linguagem que ele parecia entender.

Eu tinha acabado de sair da marcação, com a maquiagem começando a derreter no rosto e o figurino apertando mais do que devia. Pedi um copo d'água e encostei no canto do estúdio, respirando fundo, tentando não pensar na bronca da Na-yeon e muito menos em Ji-hoon, que parecia ter evaporado depois da selfie.

O celular vibrou no bolso.

Desbloqueei rápido demais.

Era dele.

Abri a notificação com um leve sorriso no canto da boca, já esperando alguma indireta, ou até um "você é insuportável", do jeito que ele sempre mandava. Mas não.

Era uma foto.

Ji-hoon, com a câmera frontal espelhada, meio tombado de lado, fazendo uma carinha debochada. E do lado dele... um cara. Alguém da equipe, parecia. Alto, cabelo castanho claro, sorrindo.

A legenda vinha logo abaixo:

"Também nos damos bem"

Arregalei os olhos. Soltei um "que?" alto demais, tanto que uma das produtoras olhou pra mim de longe. Sorri e fingi que estava lendo algo engraçado.

Mas por dentro?

Fervendo.

— Tá de brincadeira comigo — murmurei.

Fiquei olhando para a tela uns bons segundos. Dei zoom no cara. Era um dos iluminadores? Figurante? Não fazia ideia. Mas o pior nem era isso.

Era Ji-hoon. O Ji-hoon me provocando. Flertando. Cutucando. Do jeitinho que eu fazia com ele.

E, pior... funcionou.

Guardei o celular no bolso de novo, encostei a cabeça na parede e fechei os olhos.

Tentei me convencer de que era bom. Que pelo menos ele estava reagindo. Mostrando algo. Qualquer coisa.

Mas o calor que subiu pelo meu peito não era de alívio.

Era ciúme mesmo.

E ele ia ver só.

Fora do Script Where stories live. Discover now