O silêncio do apartamento me acordou antes do despertador. E, por um segundo, achei que ainda estava sonhando.
Mas aí olhei em volta.
Sofá estranho, coberta fina, cheiro do amaciante que definitivamente não era meu.
E lembrei.
Ji-hoon.
A noite.
O bar.
A rua.
A cama.
Suspirei.
Levantei devagar, espreguiçando os ombros.
Por sorte, não tinha compromisso cedo naquele dia. E, pelo visto, ele também não — já que Minji não apareceu na sala gritando.
Fui até o corredor.
Abri a porta do quarto devagar.
Ele estava lá.
Dormindo feito pedra.
Deitado todo torto, um braço pendurado pra fora da cama, o rosto meio esmagado no travesseiro.
Espalhado.
Desgrenhado.
E ainda assim...
Lindo pra caralho.
Ri sozinho.
Fechei a porta com cuidado e fui até a cozinha.
Abri os armários. Achei um pacote de alga, ovo, arroz, um pouco de molho de soja. Sopa de ressaca improvisada. Melhor que nada.
Liguei o fogo.
Mexi as coisas na panela, meio perdido na própria cabeça.
Eram poucos os momentos em que a gente podia ter isso.
Silêncio.
Normalidade.
Café da manhã sem ser às pressas ou escondido.
Ouvi a porta do quarto rangendo.
Não virei de imediato.
Passos lentos.
Um chinelo arrastando no chão.
— Que cheiro é esse? — a voz veio rouca, embolada de sono.
Virei.
Ji-hoon estava parado na porta da cozinha, descabelado, com uma camiseta larga que devia ser dele desde a adolescência e olhos meio fechados de preguiça.
— Meu deus...
Ele bocejou.
Me encostei na pia e cruzei os braços.
— Dormiu bem?
Ele me lançou um olhar de canto, depois desviou. Parecia lembrar de tudo que aconteceu ontem. Ele respirou fundo, apertando os olhos como se quisesse desaparecer.
— Eu falei alguma merda ontem?
— Algumas.
— Ótimo.
— Também tentou me convencer a dormir do seu lado — acrescentei, levantando uma sobrancelha.
— Tá. Chega.
— Eu devia ter filmado.
— Hyun-wook...
— Mas eu fui legal. Cuidei de você.
— Você me jogou na cama.
— Cuidei à minha maneira.
Ele se sentou devagar na cadeira da mesa. Ficou em silêncio por alguns segundos, observando a tigela que eu coloquei à frente dele.
— Isso tem gosto de quê?
— De dignidade recuperando o fôlego.
Ele pegou a colher, mexeu devagar, ainda com aquela cara derrotada de quem sabia que tinha entregado demais na noite anterior.
— Você está quieto — comentou, sem me encarar.
— Estou processando.
— O quê?
— Você bêbado. É uma experiência intensa.
Ele bufou, depois deu a primeira colherada da sopa.
— Está com gosto de culpa.
— Então está funcionando.
Ficamos em silêncio por um tempo. Me sentei do outro lado da mesa, observando ele comer devagar, ainda com os olhos pesados.
— Você devia ir embora antes da Minji me encontrar assim — ele falou de repente, a voz baixa.
— Aishh... Me pede para dormir do seu lado e agora quer me expulsar.
Me encostei na cadeira, estalando os dedos.
— A gente vai falar sobre ontem? — perguntei, sem muito rodeio.
Ele não respondeu de imediato. Só mexeu a colher dentro da tigela, sem pegar nada.
— Qual parte? — Finalmente, ele levantou os olhos.
Ainda vermelhos de sono.
Ainda meio caídos de vergonha.
— Eu... — respirou fundo. — Eu não queria brigar com você ontem.
— Não brigamos, não conta, você estava bêbado.
— Por que foi até lá? — perguntou tomando um gole da sopa.
Respirei fundo e desviei o olhar.
— Porque postaram as fotos de vocês...
— Você estava com ciúmes? — ele perguntou de repente, os olhos presos nos meus.
— Não.
— Mentira. — solta um riso nasalado. — Eles são meus amigos. Nossos amigos.
Assenti.
— E eu sou o quê?
A pergunta ficou no ar.
Ele não respondeu.
E nem precisava.
O jeito que ele desviou o olhar, o modo como segurou a colher com mais força, como se ela fosse escapar da mão... dizia tudo.
— Eu só fiquei com medo — ele murmurou. — Quando saiu aquela matéria. Quando eu vi a foto... — Fechou os olhos por um segundo. — Achei que você ia cansar.
Apertei o maxilar, desviando também.
— Cansar não está nos meus planos.
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A luz do set batia direto no meu rosto. A produtora pediu para eu me virar um pouco mais pra câmera. Alguém ajeitou minha franja.
Respondi com um aceno, sem prestar atenção.
Mas no fundo, ainda estava lembrando daquela noite em que fui atrás de Ji-hoon quando eu que estava tomado por ciúmes.
Parecíamos até que estávamos conectados, nós dois com ciúmes.
Ele, com os amigos. Rindo. Sorrindo daquele jeito que só ele tem. E eu surtando internamente por não poder dizer "ele é meu".
Entrei naquele bar como se tivesse sido convidado. Sentei na mesa como se nada tivesse acontecido. Fiquei calado. Nem olhei pra ele.
Mas ele olhou pra mim.
Bêbado, claro.
Mas olhou com aquele mesmo olhar de sempre.
Meio assustado, meio derretido.
Como se dissesse "por que você veio?", mas estivesse feliz que eu fui.
No fim, ele quase caiu na rua.
Me xingou. Riu. Choramingou.
E depois...
Dormiu no meu pescoço. Literalmente.
Sorri sozinho ao lembrar.
A equipe achou que era para a foto.
"Boa, segura esse sorriso!", gritaram.
Se soubessem o motivo...
A verdade é que bêbado, ele fica insuportável.
Mas também fica fofo.
Mais honesto. Mais fácil de ler.
E eu gosto de quando ele me deixa ver isso.
Por mais que tudo seja escondido.
Por mais que a gente não saiba até quando vai dar.
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Fora do Script
FanfictionNos bastidores de uma das séries mais comentadas da Coréia, dois atores com carreiras em ascensão tentam manter os pés no chão enquanto tudo ao redor parece prestes a desmoronar. Ji-hoon e Hyun-wook interpretaram personagens inesquecíveis e a químic...
