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Acordei antes do despertador e isso nunca acontecia. Fiquei uns bons minutos deitado, encarando o teto como se ele fosse me dar alguma resposta.

Mais tarde, olhei o celular. Nenhuma nova mensagem. Só a conversa com Ji-hoon parada ali, com meu "Me diz o lugar e eu vou" ainda como a última fala.

Pensei em puxar assunto, perguntar se estava tudo certo. Mas se tem uma coisa que o Ji-hoon sabe fazer, é sumir e aparecer no tempo dele. E por algum motivo, eu respeitava isso.

Levantei, fui direto para o chuveiro, depois coloquei uma playlist aleatória e fiquei olhando para o armário por quase dez minutos, como se estivesse me arrumando para uma reunião que não podia dar errado.

Camisa clara. Casaco escuro. Boné. Óculos. Máscara. O kit invisível.

Ainda peguei um moletom extra, caso precisasse disfarçar mais.

Enquanto calçava o tênis, recebi a mensagem:

Ji-hoon:
Tem um café perto do Seonjae Park, no final da rua principal. Chama Café Hayeon. Quase nunca tem gente lá. Às 15h?

Li e reli.

Aquele era o tipo de lugar que você só conhece se realmente estiver evitando gente.

Digitei rápido.

Choi Hyun-wook:
Vejo você lá.

Saí pela garagem do prédio, abaixando o boné ainda mais. Não avisei ninguém para onde ia. Nem Jeong, nem a equipe.

Peguei um carro com motorista que não me reconheceu — ou fingiu muito bem. No caminho, fiquei mexendo no celular sem nem saber o que procurar. Só precisava ocupar as mãos.

O céu estava nublado. Nem frio, nem quente. Um clima neutro. Imparcial. Talvez fosse melhor assim.

O carro me deixou a uma quadra do lugar.
Andei rápido, cabeça baixa. O Café Hayeon era pequeno, meio escondido atrás de algumas árvores, com uma fachada de vidro fosco e nenhuma placa chamativa. Quase parecia fechado.

Quase perfeito.

Parei do outro lado da rua e respirei fundo. Ainda era 14h57.

Ninguém parecia estar prestando atenção. Nenhum celular levantado. Nenhum sussurro de fã.

Ainda dava para fingir que era só mais uma tarde em Seul.

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A porta de vidro se abriu com um tilintar suave.

Levantei os olhos e vi Ji-hoon entrando. De moletom cinza, capuz abaixado, máscara no rosto. Andava como quem não queria chamar atenção, mas mesmo assim estava chamando.

Nossos olhos se encontraram por um segundo rápido. Ele hesitou perto do balcão, me viu mais ao fundo e então veio até minha mesa.

Sentei no canto mais afastado do café, longe das janelas. Tinha pedido dois americanos, só para não precisar esperar. Um já estava na frente da cadeira vazia.

— Oi — ele disse, baixando a máscara e se sentando. A voz estava mais baixa do que o normal, quase sussurrada.

— Oi — respondi, tentando não parecer tão atento.

Ele pegou o copo com as duas mãos, como se quisesse se ocupar com qualquer coisa que não fosse o silêncio entre nós.

Ficamos alguns segundos só com o som da máquina de café atrás do balcão, a conversa baixa de uma atendente com o dono e um vento leve batendo nas janelas.

— Demorei? — ele perguntou, sem me encarar diretamente.

— Quatro minutos, mas eu perdoo.

Ele riu de leve, sem mostrar os dentes. Um riso de canto de boca.

Tomei um gole do café. Estava forte, quase amargo. Bom para manter a boca ocupada quando não se sabe o que dizer.

— Tem gente que acha que a gente se vê o tempo todo — comentei, sem pensar muito. — Tipo... como se só porque gravamos juntos, viramos grudes.

— Falam isso de todo mundo, não é? — ele respondeu. — É o roteiro que faz parecer. Ou a câmera.

— Ou os cortes de vídeo no TikTok.

Dessa vez ele sorriu de verdade.

— O pessoal é rápido e criativo demais.

Ficamos em silêncio de novo. Mas agora não parecia tão desconfortável.

Olhei pela janela, depois para ele.

— Por que aqui?

Ele ergueu os ombros, como se não fosse nada demais.

— Eu venho aqui às vezes. Quando quero sumir um pouco. Ninguém me reconhece aqui.

Assenti.

— Bom esconderijo.

— E você? — ele perguntou, olhando finalmente nos meus olhos. — Teve que sumir de alguém para vir?

Pensei em Jeong, na equipe, nos fãs que leem nossos olhares com mais precisão que a gente mesmo.

— Não exatamente — respondi. — Mas achei que seria melhor assim. Sem alarde.

Ele assentiu lentamente, levando o copo à boca. Ficou olhando o café por tempo demais para quem só ia tomar um gole.

— Eu não sabia o que você queria quando mandou aquela mensagem — ele disse, enfim. — "Guarda um dia pra mim"... parecia que ia vir bronca.

— Bronca? — arqueei uma sobrancelha. — Por quê?

— Sei lá... Você tem cara de quem briga educadamente.

Soltei um riso curto.

— Isso foi um elogio?

— Acho que foi.

Mais um gole de café e o silêncio voltou, por que parecíamos dois estranhos? Estávamos pressionados demais pelos vídeos e fofocas por aí?

— Esse lugar é bom mesmo — comentei, olhando em volta. — Ninguém com celular na mão, ninguém espiando.

— Ninguém querendo saber se a gente respira do mesmo jeito fora da tela.

— O que é irônico — falei, encarando meu copo — porque acho que nem eu sei como respiro fora da tela ultimamente.

Ji-hoon soltou um "hmm" e ficou mexendo no café com o canudo, mesmo sem açúcar.

Resolvi tentar aliviar o clima.

— Você sempre vem aqui? Ou só me trouxe porque sabia que o café era tão forte que podia me derrubar?

— Eu nunca traria alguém aqui — ele respondeu, seco. — Só achei que seria tranquilo.

— E você tem bom gosto para esconderijos, confesso.

Ele me olhou de canto, mas sem sorrir.

Puxei o celular do bolso e fingi anotar algo.

— "Café Hayeon. Ponto de fuga do Ji-hoon. Entrada secreta pela porta de vidro."

Ele soltou um riso abafado, aquele que ele tenta esconder e não consegue. Finalmente.

— Só não põe no GPS público.

— Capaz. Eu nem sei compartilhar localização direito.

— Não duvido.

Fora do Script Where stories live. Discover now