E, nesses cinco segundos, ele estava lá.

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A folga veio como um erro de sistema.

Um espaço em branco no cronograma semanal que ninguém tentou preencher. Nem eu.

Acordei tarde, ou melhor, acordei no horário normal, mas não saí da cama. Fiquei ali mesmo, com o celular na mão e o ventilador girando no teto como se estivesse com preguiça também.

Quando levantei, fui direto para o sofá. Peguei o controle e deixei a televisão ligada em qualquer coisa que passava. Nem lembro o que era. Um drama antigo reprisando ou um programa culinário com música de fundo irritante.

Não importava.

O importante era estar ali. Descalço, com o moletom velho e o cabelo bagunçado. Sem roteiro, sem câmeras, sem ninguém me pedindo expressão.

Pensei em cozinhar. Mas só pensei.

Peguei o celular e abri o aplicativo de delivery. Três toques depois, já tinha um pedido de frango frito e refrigerante confirmado.

Senti um leve orgulho da minha própria rapidez.

Cinco minutos depois, o celular vibrou.

Minji (manager):
Você pediu FRANGO FRITO às 15h?

Revirei os olhos.

Eu:
Como você sabe disso tão rápido???

Minji:
O aplicativo está sincronizado no meu celular para eu aprovar seus gastos, gênio.
E já cancelei. Vai chegar arroz integral, legumes e tofu. Aproveita a folga pra se cuidar, não para explodir o estômago.

Suspirei.
Pior que ela tinha razão. Mas não queria que tivesse.

Fechei o aplicativo e me joguei de novo no sofá. O programa da TV tinha mudado. Agora era um talk show. Mudei de canal. Três vezes. Nada me prendeu.

A verdade é que... alguma coisa em mim pedia mais do que sofá e comida saudável.

Levantei, fui até o quarto, coloquei o moletom mais neutro que encontrei, óculos escuros e máscara. Puxei o boné até quase cobrir os olhos.

Modo civil ativado.

Desci até a rua, atravessei rápido pelas calçadas, e entrei na loja de conveniência da esquina.

Fui direto para a geladeira, olhei discretamente as opções e peguei uma garrafa de soju com um sabor doce. Nada demais. Mas já era o suficiente para me sentir culpado.

Quando virei para o caixa, ouvi vozes atrás de mim.

— ...não, mas sério, você viu a entrevista nova?

— Vi! Ele estava muito sem graça quando o Choi olhava pra ele.

— Eu disse! Aquilo não é atuação. É tensão real!

— Eles se gostam, vai por mim.

Congelei.

Fiquei de costas. Fingi escolher um pacote de salgadinho aleatório.

— Mas você acha que eles... tipo... estão juntos?

— Acho que não. Mas tem coisa ali. Só não podem mostrar.

Senti a garrafa suando na minha mão.

Abaixei um pouco a cabeça e fui direto pro caixa. O atendente me olhou com pressa, passou os itens e eu paguei sem dizer uma palavra.

Na saída, evitei as meninas. Elas estavam olhando doces, rindo baixo. Nenhuma me reconheceu ou fingiram não reconhecer.

Voltei para o apartamento com a sacola nas mãos, o coração batendo mais rápido do que devia.

Engraçado.

Nem nos meus dias de folga eu conseguia ser só eu.

Sentei de novo no sofá, largando a sacola ao meu lado. A comida saudável havia chegado enquanto eu estava fora. Tofu, legumes, arroz sem sal e sem alma. Minji, como sempre, se superando no zelo excessivo.

Peguei os hashis e comecei a comer devagar, sem fome. A garrafa de soju ficou no canto da mesa, discretamente aberta. Dei um gole pequeno. Gelado, doce. Forte o suficiente para aquecer um pouco o peito.

O apartamento estava em silêncio. Só o som da televisão ainda ligada em algum canal aleatório preenchia o fundo. Peguei o controle e desliguei. Preferia o som da geladeira do que a falsa animação da programação da tarde.

E então, sem pensar demais, peguei o celular.

Abri o Twitter primeiro. Tendências:

"Jihoon e Hyunwook"
"Si-eun e Su-ho REAL"
"Ele mordeu a boca, SIM"

Revirei os olhos. Suspirei. Mas cliquei.

O vídeo já tinha mais de 400 mil visualizações. Era o trecho da entrevista, editado por alguma fã, com zooms dramáticos e "Every Breath You Take"  tocando de fundo.

A legenda dizia:
"Vocês vão me dizer que isso aqui é só amizade? Eu me recuso a acreditar."

No vídeo, dava para ver nitidamente: o momento exato em que Choi olhava pra mim, não pra câmera, nem pro entrevistador, mas pra mim.
E então... ele morde a boca. De leve. Quase imperceptível. Mas suficiente.

No frame seguinte, ele estende a mão e puxa um pedaço da minha jaqueta, como se fosse uma brincadeira. Eu rio, sem graça. Olho para o chão. Tentando fugir da câmera.

Pausei.

Revi.

Dei play de novo.

Eu lembrava daquele momento. Mas não achava que tinha sido tão... visível.

Desci pros comentários.

"o jeito que ele olha pra ele 😭😭😭"
"ninguém vai me convencer que isso é só atuação"
"chamada de casal confirmada, é isso"
"não sei quem tá mais apaixonado ali"

Fechei o aplicativo. Encostei a cabeça no encosto do sofá e respirei fundo.

Um pedaço de mim achava tudo engraçado. Outro... nem tanto.

Dei mais um gole do soju. Peguei mais um pedaço do tofu com cara de castigo e mastiguei sem vontade.

Às vezes, ser famoso era como morar num palco. Mesmo sozinho no sofá, a plateia continuava assistindo.

Fora do Script Where stories live. Discover now