16 de Outubro - Sala de hospital

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Hoje o dia amanheceu um pouco  mais calmo, os funcionários estavam limpando a bagunça que a chuva havia causado. Eu conseguia escutar o barulho das ambulâncias chegando sem parar, provavelmente os pacientes feridos por conta da tempestade. Uma das macas que passou pela minha sala tinha uma pessoa com uma estaca de ferro no peito, me senti dentro de uma série americana de medicina. Enquanto os médicos corriam com aquele paciência só vinha na minha cabeça os médicos cantando "chasing cars"  enquanto o paciente sangrava que nem um porco.

Pela manhã os enfermeiros trouxeram uma bandeja para cada paciente que estava no quarto, todos começamos a comer a sopa rala de berinjela e ao escutar uma frase o meu coração começou a palpitar fazendo com que o meu corpo se forçasse a puxar a divisória de pano se separava as macas. A frase entrou como um sopro de alívio nos meus ouvidos, assim dizia ela:

-E o Toomas? Será que ele está bem? Os enfermeiros me disseram que ele tinha vindo até aqui, mas será que ele está bem? Será que já foi transferido para o presídio?

Sim, eu não tinha dúvidas, puxei o pano com força e ele caiu no chão. Meus pelos se arrepiaram e meus olhos lacrimejaram, eu tinha certeza que era ele. Quando o pano caiu completamente eu me deparei com o estranho de olhos azuis, os nossos olhos ficaram fixos um no outro e abrimos um largo sorriso. O Stein então  me olhou de cima a baixo e começou a desabar em lágrimas, eu só queria estar sem as algemas para poder abraça-lo e sentir o cheiro daquela pequena margarida dos olhos azuis. O Stein então ainda chorando disse:

- Eu fiquei com tanto medo Toomas, o meu corpo está tão dolorido, eu só me lembro do guarda em cima de mim, depois disso eu não me recordo de muitas coisas. Eu estou vivo Toomas, estou vivo.

O meu corpo se incendiou e eu só consegui esticar o meu braço para pegar na mão do Stein, foi talvez o maior alívio que eu tive depois de dias, ele parecia tão melhor, os hematoma ainda eram aparentes, porém o semblante do rosto dele estava mais doce e suave.

O relógio contava as horas e eu e Stein passamos o dia conversando sobre todo esse período de dor, nós falamos sobre tudo. Naquele momento eu me senti nas nuvens, me recordo do dia em que eu soube que minha mãe tinha sobrevivido à queda do avião, porém ela estava muito debilitada. Quando eu soube meu corpo ficou em êxtase e eu não consegui conter a alegria, minha mãe estava viva e ela conseguia me ouvir. É um sentimento realmente extraordinário.

Por volta das dez horas da noite trouxeram para todos os que estavam na sala novamente aquela sopa de beringela mas dessa vez com uma pêra de acompanhamento. O Stein estava fazendo tanta careta enquanto comia a sopa, parecia um bebê provando algo que não gosta. O semblante dele estava bem melhor, mas os curativos escondiam a dor que ele estava sentindo. Sua cabeça e seu peito estavam completamente enfaixados e eu consegui enxergar tanto as cicatrizes causadas pelos carcereiros quando aquelas causadas pela vida. Quando terminamos  de comer o Stein deitou para descansar e acabou dormindo e eu não fiquei para trás, me deitei virado para ele e capotei.

Diário de um injustiçado Where stories live. Discover now