15 de outubro - A tempestade

4 2 0
                                    

Vento, um vento gigantesco começou a bater na janela do meu quarto, eu só conseguia escutar o barulho da correria dos médicos e enfermeiros pelo corredor. Uma grande quantidade de água começou a entrar no hospital e pelo visto a comporta não suportou o grande volume d'água. O policial que me escoltava puxou minha maca e me levou para um elevador bem grande, eu fiquei perplexo com a capacidade daquele elevador, ele suportava até duas macas, algo surreal.

Chegando no segundo andar eu me deparei com uma sala cheia de pacientes e uma outra com um cartaz feito de folha sulfite e nele estava escrito: "Sala reservada" e foi para lá que o guarda levou minha maca.

A sala tinha três divisórias e em cada uma tinha uma maca, eu não conseguia ver os pacientes pois as divisórias de tecido não me permitiam enxergar, porém foi possível ver que o calcanhar de todos os pacientes estavam presos nos ferros das macas. O policial me empurrou até uma dessas divisórias e tirou do bolso o terço que o idoso havia deixado cair. Eu apenas agradeci a ele e fiquei observando uma pequena imagem de nossa senhora que estava presa na parede. Eu lembro da minha falecida avó rezando pela saúde da nossa família, ela dizia que nossa senhora era a mãezinha dela, que na minha cabeça era a senhora minha bisavó, algo que gerava risadas lá na minha casinha.

Essa eu acredito que seja a segunda enchente que eu presenciei. A minha primeira vez foi quando lá na cabana de férias teve uma grande chuva, o rio começou a subir rapidamente e eu estava sozinho lá na cabana, mas do escuro da noite o meu pai apareceu me pegou no colo e me levou até o barquinho e com muita pressa me colocou sentado nele. A chuva estava muito forte mas conseguimos remar até um solo firme. O meu pai não parava de xingar a chuva e chutava freneticamente aquele pobre barquinho. Um amigo da família morava próximo e nós dormimos lá.

O senhor Peter era caçador e tinha uma espingarda bem grandona, eu ficava doidinho todas as vezes que eu via aquela arma de madeira vermelha. A esposa do senhor Peter fazia um bolinho delicioso e o filho deles era tão tímido. Acredito que eu fosse um pouco mais velho que ele. Se eu não me engano ele se chama Tyler e quase não saia uma palavra da boca dele, mas até que ele era maneiro. O quarto do Tyler era cheio de animais de brinquedo, ele tinha até um chapéu de cowboy, segundo ele o sonho da vida dele era se tornar xerife e cowboy, o cavalo ele já tinha e o nome era foguete.

Nós passamos aquela noite naquela casinha e foi tão incrível, por mais que o Tyler não fosse muito de falar nós até que conseguimos brincar bastante. Pela manhã quando o meu pai foi até a cabana ela estava completamente destruída e não tínhamos onde ficar, até então morávamos a horas daquele lugar, mas o senhor Peter deixou que passaremos as férias lá na casa dele e assim fizemos, foram os dez dias mais surreais da minha vida, eu aprendi a andar de cavalo, cacei passarinho com o senhor Peter e ajudei meu pai a reconstruir a cabana, foi tudo incrível.

O tempo passou tão devagar e a chuva só aumentava, era nítido o desespero dos médicos e pacientes, a cidade pelo visto estava totalmente alagada e segundo o que eu escutei de uma reportagem que passava na televisão da recepção, havia vários focos de afogamento e desabamentos, um verdadeiro caos. Mal consegui dormir vendo toda aquela correria, mas os medicamentos eram muito fortes então acabei capotando, dormi ao som dos gritos e barulho de chuva.

Diário de um injustiçado Where stories live. Discover now